Por Kamila Bandeira
Bióloga com mestrado em Zoologia pelo Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). É doutoranda no mesmo programa, além de pesquisadora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Suas pesquisas estão focadas em Paleontologia de vertebrados
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Os dinossauros terópodes são todos os que pertencem ao clado (agrupamento que inclui um ancestral comum e todos os descendentes) Theropoda, geralmente carnívoros ou onívoros e quase sempre bípedes. É sempre importante lembrar que as aves fazem parte desse grupo – e sim, as aves são dinossauros vivos! Talvez por isso, os terópodes sempre chamam a atenção da mídia quando são divulgados.
Imagine, então, um dinossauro terópode que foi moldado no fogo? Parece estranho? Mas esse é o caso do Aratasaurus museonacionali Sayão et al., 2020, um dinossauro brasileiro descrito e publicado no ano passado em uma revista do grupo Nature. O Aratasaurus é um terópode celurossauro basal, ou seja, ele pertence a um grupo específico de terópodes que contém todos os dinossauros terópodes mais intimamente relacionados com as aves do que com os demais terópodes. Outro ponto importante é que os indivíduos mais antigos desse grupo são muito raros e eram restritos, até agora, à América do Norte e à China. Já a espécie brasileira é o mais primitivo celurossauro achado na América do Sul. A descoberta sugere que essas primeiras formas teriam uma distribuição muito mais ampla do que se supunha até agora.
O Aratasaurus foi coletado em rochas da formação Romualdo (uma unidade dentro da bacia do Araripe, um importante grupamento geológico localizado no Nordeste do Brasil), em um local muito rico em fósseis e que se estende pelos estados de Ceará, Pernambuco e Piauí. O fóssil foi encontrado em 2008, em uma mina de gesso chamada Mina Pedra Branca, entre as cidades Nova Olinda e Santana do Cariri, no Ceará.
Essa espécie viveu durante o Albiano (cerca de 115-110 milhões de anos atrás), no início do Cretáceo Inferior. O Aratasaurus apresenta preservado elementos do membro posterior direito como a porção distal do fêmur, metade proximal da tíbia e regiões distais médias dos metatarsais I-IV, falanges I-1, II-1-2, III-1-3 e IV-1-4; unguals I, II e III – todos encontrados articulados. Curiosamente, esse novo dinossauro não é aparentado com outras espécies encontradas na bacia do Araripe, como o Santanaraptor. A espécie mais parecida é a de um outro celurossauro encontrado na China chamado Zuolong sallei.
O fóssil, quando descoberto, foi levado ao Museu de Paleontologia Plácido Cidade Nuvens, localizado em Santana do Cariri (Ceará) para ser devidamente identificado, preparado e descrito. Além disso, ao longo dos anos também foram feitas análises microscópicas usando pequenas amostras dos ossos. Já nos anos 2016, ele foi encaminhado ao Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro para que fosse feito uma réplica e também se refinarem os estudos das amostras microscópicas.
Em 2 de setembro de 2018 houve um incêndio no museu, que assolou boa parte dos materiais da instituição. Por sorte a área onde o Aratasaurus estava armazenado não foi afetada pelas chamas e o fóssil ficou intacto – mas o nome da espécie faz alusão a essa tragédia. O nome do Aratasaurus tem origem na união dos termos da língua tupi ara (nascido) e atá (fogo), além do sufixo da língua grega saurus, que apesar de significar “lagarto” é um termo comumente usado para nomear dinossauros. Já o descritor específico museunacionali faz referência ao Museu Nacional do Rio de Janeiro. Por fim, o Aratasaurus foi estimado em cerca de três metros de comprimento e 34 quilos, mas a análise microscópica de seus ossos, no entanto, revelou que esse exemplar era de um jovem, ou seja, não de um animal totalmente adulto.
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