Por Bibiana Terra
Graduada Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Mestra e doutoranda no Programa de Pós Graduação em Ecologia da mesma universidade, onde atua no Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias (NERF)
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Pouco tempo atrás, uma foto de uma notícia de jornal chamou minha atenção. Junto à imagem de um grave acidente de trânsito, envolvendo vários veículos, estava a seguinte frase: “Olha o que o tamanduá fez”. Procurando a notícia na internet, entendi melhor o motivo da reportagem.
Ao tentar ultrapassar uma carreta-tanque, uma caminhonete atropelou um tamanduá que tentava cruzar a estrada e acabou batendo na carreta, fazendo com que ambas invadissem a pista contrária. Um veículo, que estava no sentido oposto, também atingiu a carreta e incendiou. Uma outra caminhonete tentou desviar do acidente, mas acabou também sendo atingida pelo fogo. “Os quatro condutores e um passageiro ficaram feridos…” dizia a notícia. O tamanduá, protagonista da chamada, não apareceu mais na reportagem, mas provavelmente não resistiu à colisão.
Notícias como essa, colocando a culpa dos acidentes de trânsito nos animais atropelados, não são raras. Fiquei me questionando: a culpa é dos bichos que estão cruzando as rodovias? Nós, humanos, construímos estradas no meio do habitat dos animais e eles levam a culpa dos acidentes.
Há milhões de anos, os animais ocupam diferentes ambientes do planeta, se movimentando livremente, seja para se alimentar, reproduzir ou demais necessidades de sobrevivência. Entretanto, com o aumento da ocupação humana, esses ambientes também passaram a ser utilizados por nós. Ao longo do tempo, a presença de infraestruturas de transporte aumentou consideravelmente e, se olharmos a malha rodoviária do Brasil, iremos perceber diversas áreas com altíssima concentração de rodovias. Provavelmente, há uma elevada fragmentação do habitat nas regiões com maiores densidades de estradas, fazendo com que o ambiente usado pelos animais fique dividido em vários pedaços.
É inevitável que os animais tentem (e precisem) cruzar as estradas para que consigam sobreviver. Entretanto, será que devemos culpá-los por fazer isso e acabarem envolvidos em acidentes de trânsito? Afinal de contas, nós estamos usando o ambiente deles para satisfazer nossas necessidades e, no mínimo, deveríamos nos preocuparmos em reduzir ao máximo o impacto que causamos a eles.
Pensando no comportamento do animais, algumas medidas de mitigação podem ser utilizadas para evitar colisões nas estradas. O uso de cercas, por exemplo, evita que os eles acessem a via e, dessa forma, evita colisões. Porém, sozinhas, elas podem causar outro impacto – o efeito barreira – e por isso é necessário pensar em associá-las a estruturas que permitam o cruzamento seguro dos animais entre os dois lados da estrada.
Quanto ao nosso comportamento, é importante informar e sensibilizar a população quanto aos impactos das estradas nos animais e conscientizar os condutores sobre a presença de animais nas rodovias. Pensando nisso, será que não poderíamos deixar de culpar os animais pelas colisões e produzir notícias mais informativas e com soluções para esse problema?
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