A ineficiência das leis brasileiras na proteção dos animais silvestres

A sensação de impunidade define bem o cenário da proteção jurídica dos animais silvestres no Brasil. Embora existam leis federais destinadas à proteção da fauna, como a Lei Federal de Proteção à Fauna (nº 5.197/1967) e a Lei de Crimes Ambientais (nº 9.605/1998), na prática, observam-se penas brandas e uma fiscalização insuficiente para conter crimes ambientais e contra a fauna.

Um dos principais problemas reside na punição prevista na legislação atual. O artigo 29 da Lei de Crimes Ambientais estabelece que matar, perseguir, caçar, apanhar ou utilizar espécimes da fauna silvestre, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida, é crime punível com detenção de seis meses a um ano e multa. Em contraste, a Lei nº 14.064/2020 alterou o artigo 32 da mesma lei para aumentar as penas cominadas ao crime de maus-tratos aos animais quando se tratar de cão ou gato, estabelecendo reclusão de dois a cinco anos, multa e proibição da guarda.

Essa discrepância nas penas revela uma distorção na forma como a lei enxerga a fauna silvestre, que deveria receber proteção equivalente ou até mais rigorosa, dada sua importância ecológica e o risco de extinção de várias espécies.

Além disso, a aplicação das punições existentes raramente é eficaz. Em muitos casos, indivíduos que cometem crimes contra a fauna silvestre enfrentam apenas multas, sem consequências penais significativas. Essa impunidade acaba funcionando como um incentivo para a continuidade de práticas ilegais, como a caça.

Caça, tráfico de fauna e destruição de hábitat

Essa fragilidade não se limita aos casos de caça. O tráfico de animais silvestres, por exemplo, movimenta bilhões de reais por ano e representa uma das maiores ameaças à biodiversidade brasileira, sendo considerada uma das três maiores atividades criminosas do mundo, segundo a Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres.

Ainda assim, o crime de tráfico de animais não é tipificado na legislação brasileira, o que fragiliza o seu combate e punição. Em razão da previsão legal, não é cabível a prisão em flagrante e, por se tratar de crime de pequeno potencial ofensivo, na maioria dos casos, será realizada uma transação penal e a punição será o pagamento de cestas básicas ou prestação de serviços. Para entender com mais profundidade essa fragilidade, recomendamos a leitura do artigo “Sobre o tráfico de animais”, no portal Fauna News, que traz uma caracterização desse crime.

Além disso, a destruição de hábitats por desmatamento e queimadas criminosas também deveria ser tratada com maior rigor. Quando uma floresta é incendiada para dar lugar a pastagens ou plantações, não são apenas árvores que são perdidas: milhares de animais morrem queimados, sem chance de fuga. No entanto, aqueles que promovem essas ações ilegais quase nunca são responsabilizados de maneira significativa.

O Brasil é um dos países mais biodiversos do mundo e essa riqueza natural está sendo destruída enquanto o sistema jurídico falha em agir de forma eficaz. É urgente que nossas leis sejam reformadas para garantir punições mais severas e, principalmente, que elas sejam aplicadas de forma exemplar. De nada adianta ter uma legislação que, na prática, não protege os animais.

Por outro lado, felizmente essa é uma questão que é estudada em profundidade por profissionais e pesquisadores do Direito Animal em parceria com segmentos do governo federal. Um exemplo disso é a recente publicação do Marco Legal da Fauna Silvestre do Brasil (2024), que detalha o estado da arte normativa no Brasil e aponta justamente para a necessidade da construção de novos conceitos e entendimentos mais adequados à proteção e aos direitos animais.

Enquanto a proteção da fauna não for tratada com a seriedade que merece, continuaremos vendo animais sendo mortos, hábitats sendo destruídos e criminosos agindo sem medo das consequências. E isso não pode ser normalizado.

É hora de pressionar por mudanças! A proteção da fauna precisa ser levada a sério.

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