A floresta nos protege de doenças zoonóticas

Após a pandemia de Covid-19, muita atenção tem sido dada à questão de onde e quando virá o próximo patógeno emergente zoonótico de potencial pandêmico. Os olhos da mídia se voltam às florestas, à biodiversidade e ao provável e tão temido vírus que irá pular da floresta para a humanidade.

Porém, algumas variáveis desvinculadas à floresta são necessárias para esses pulos e adaptações virais. Dentre elas está o desmatamento, a retirada da floresta.  Algumas doenças parasitárias, como a leishmaniose, deixa bem claro a relação desmatamento-doença.

O desmatamento de uma área tem um subsequente aumento das ocorrências de leishmaniose na população circunvizinha pelo “desalojamento” dos flebótomos (insetos vetores que transmitem o protozoário causador da enfermidade) da sua casa, fazendo com que eles tenham uma proximidade maior com as pessoas.

Na Amazônia ocidental, tem muitas áreas de mata contínua, apesar de grande pressão antrópica em algumas localidades. Quando nosso olhar se volta ao Sudeste do Brasil especialmente, é gritante a diferença na cobertura vegetal. O processo de fragmentação florestal na região foi imenso devido às questões históricas e econômicas.

Problemas causados pela fragmentação florestal

Em áreas protegidas em São Paulo, já foi constatado o desaparecimento local de espécies da fauna. É o caso dos queixadas (Tayassu pecari), conhecidos como porcos-do-mato, no Parque Estadual Morro do Diabo. Outras florestas de grande extensão ao nosso olhar humano são pequenas para espécies como a onça-pintada (Panthera onca)  conseguirem sobreviver. A fragmentação florestal leva as espécies à endogamia (acasalamento entre indivíduos aparentados, que são geneticamente semelhantes), à falta de alimento e os aproxima da população humana em interações altamente negativas, como a caça e o tráfico de animais silvestres.

A fragmentação florestal também propicia a presença de algumas doenças zoonóticas, que em um ambiente com alta biodiversidade e florestas contínuas tem baixa ocorrência. Esse é o caso de duas doenças: a hantavirose e a febre maculosa.

A hantavirose é uma doença transmitida através da urina de roedores e ocorre em todas as regiões do Brasil. Porém, na Amazônia ocidental, menos desmatada, a ocorrência é muito baixa. As regiões Sul e Sudeste apresentam o maior número de casos, sendo a fragmentação florestal e a perda de biodiversidade algumas das causas, pois força os roedores silvestres a usarem elementos da paisagem que os aproxima das pessoas, diminuindo os predadores naturais dessas espécies.

Os casos de febre maculosa no Brasil têm a distribuição desigual. De 2013 a 2023. o Sudeste apresentou 1.292 casos com 623 mortes, enquanto na região Norte, foram registrados 15 casos e nenhuma morte. A capivara, animal considerado o reservatório mais competente para o agente infeccioso, está presente em ambas as regiões, porém no Sudeste a biodiversidade é diminuída, não oferecendo uma diluição do patógeno, uma vez que as resilientes capivaras predominam na paisagem alterada. Também em muitos locais da região não existe mais os grandes felinos, que predam as capivaras, pois suas florestas foram dizimadas. E quando algum individuo surge, a simples presença do felino é insuportável para alguns produtores rurais, que matam os animais.

A floresta íntegra, conservada, com seus ciclos naturais, nos protege dessas emergências zoonóticas. São as nossas ações negativas, como desmatamento, caça e tráfico de fauna, que favorecem o surgimento de doenças zoonóticas emergentes e reemergentes.

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