Um fóssil encontrado pela metade e sua importância para a história dos anuros

O Brasil é, atualmente, um país com uma das maiores diversidades de anfíbios do planeta e uma parte disso é por causa da sua história paleoclimática: o país tem clima tropical há muitos milhões de anos. Vamos lembrar que esse tipo de clima favorece a alta diversidade de organismos e, no caso dos anfíbios (como os anuros), é fundamental para a sua existência. Esses animais precisam de lugares úmidos para que sua pele possa estar saudável e realizar respiração cutânea e para que eles se reproduzam.

Vamos lembrar, também, que os fósseis de anfíbios no país são numerosos, ainda que não sejam tanto quanto de outros grupos de vertebrados. Eles são majoritariamente representados por anuros (sapos, rãs e pererecas), estendem-se por um longo tempo, do Cretáceo Inferior (115 milhões de anos) até os dias atuais, e são diversos, apesar de muitos fósseis não terem sido descritos.

Um deles foi descrito esse ano e é sobre ele que vou tratar aqui.

Esse fóssil foi encontrado na bacia de Aiuruoca, em Minas Gerais, em rochas que datam de, aproximadamente, 34 milhões de anos, marcando o limite entre as épocas Eoceno e Oligoceno. Essa bacia possui duas unidades geológicas, chamadas Fm. Pinheirinho, a mais inferior, e a Fm. Entre-Córregos, que está acima e é a que contém muitos fósseis de plantas e animais, sendo os anfíbios bem comuns. E é nessa Fm. que o fóssil de hoje foi encontrado.

Um animal pela metade

Sobre o animal em si, bem… Lamentavelmente só a metade de trás do corpo dele foi recuperado e descrito, incluindo metade da coluna, cintura pélvica, pernas e pés; curiosamente, uma parte da mão esquerda também se preservou sobre a cintura pélvica do animal. Como a metade anterior do corpo – e o crânio – não foi preservada, muitas das características que ajudariam a nomeá-lo como uma espécie nova se perderam. No entanto, as partes preservadas continham informações suficientes para classificar o fóssil como um anfíbio anuro – a região da cintura pélvica desse fóssil possui as vértebras caudais fundidas e retraídas para dentro do corpo, formando uma haste chamada uróstilo – que é uma característica da ordem Anura.

A ordem é comumente dividida em “Archaeobatrachia” (o nome está entre aspas porque representa um grupo não natural, sem um ancestral comum exclusivo a todos os seus membros) e Neobatrachia, ambas com espécies viventes. Esse sapo foi classificado como Neobatrachia por possuir duas características comumente atribuídas ao grupo; porém, a falta de feições específicas e outras partes preservadas do corpo impediram de fazer uma classificação mais precisa sobre ele dentro do grupo dos neobatráquios.

Como outros fósseis de anfíbios já tinham sido encontrados no mesmo local, esse anfíbio foi comparado com eles para saber se poderia ser da mesma espécie ou da mesma classificação. Acontece que não era: todos os outros fósseis já encontrados (e mencionados na literatura) eram de anuros da família Pipidae, um grupo de sapos com corpos bastante achatados e que pertence à linhagem dosarqueobatráquios.

Apesar de incompleto, esse novo fóssil sugere que existia uma maior diversidade de anfíbios durante essa época e nesse local e, diante da escassez de caracterização dos muitos fósseis de anfíbios do Brasil e da América do Sul, é um registro de grande importância para se entender a evolução dos anuros, particularmente dos neobatráquios.

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