Por Estevão Santos
Nascido em 2005 em Goiânia (GO), é um ávido observador de aves desde 2013. Suas fotos já são base de trabalhos científicos. Palestrante do Avistar, mantém o Projeto Avifauna de Goiás no Instagram
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Um vale encoberto num lençol debruçado de brumas geladas… Uma folhinha seca se desprendendo e voando com o vento… O melancólico azul do céu antes do sol nascer… A floresta trocando de roupa à cada estação. E, por que não, os passarinhos por simplesmente alçarem voo?
Como tenho corriqueiramente postulado em meus precedentes artigos, acredito com segurança que o grande dom dos observadores do ambiente natural não se manifesta no âmbito material e sim através de seu instinto subjetivo de observação e descrição das coisas como elas são. Portanto, a maior riqueza do observador não é exprimida por objeto algum, mas sim pelos olhos e ouvidos, de que já está naturalmente aparelhado. É certo, portanto, que o célebre verso de nosso poeta Manoel de Barros “eu fui aparelhado para gostar de passarinhos” se aplique a todos nós: todos fomos aparelhados com nossos sentidos para gostar e observar a natureza.
É suficiente que imaginemos algumas situações gratificantes que aqui anoto – o brilho reluzente da água minando, ao longe; o viço dum ipê sozinho na vegetação; uma fila de colinas e montanhas azulando à distância e o silêncio que de lá vem; nuvens portentosas da chuva de janeiro que pra perto se dirigem, engolindo o horizonte; a turbulência de um rio que desce as gargantas de uma serra; o voo perdido de uma borboleta próxima a um riacho; o coro insistente das cigarras; a monotonia das campinas dourando um chapadão; o rugido do vento chocando-se nas pedras; um grupo de andorinhões circulando no ar depois da chuva; o sabiá tecendo notas de beleza para um ouvido novo; a alegria do gorjeio do trinca-ferro vindo da mata; uma embaúba erguendo-se como se quisesse tocar o céu; o tapete verde das matas que vegeta numa encosta; a última flor de uma orquídea…
Em suma, por meio deste texto simples e desta coluna, venho a fazer, novamente, um humilde e sereno convite – prestemos atenção à poesia de nossas paisagens naturais. Tenho um credo forte de que são elas as únicas capazes de preencher o vazio de viver sem sede de natureza, de suplementar nosso ordinário instinto de descoberta, de indagação, de dúvida; é a poesia da natureza a única capaz de atravancar nosso caminho para desacelerar a pressa de viver, de fazer-nos caminhar mais devagar. Pois é só devagar que temos o privilégio de contemplá-la…
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