Por Luciana Ribeiro
Jornalista e tecnóloga em Gestão Ambiental
olhaobicho@faunanews.com.br
Nome popular: jararaca-ilhoa
Nome científico: Bothrops insularis
Estado de conservação: “criticamente em perigo” na lista vermelha da IUCN e na Lista Nacional Oficial de Espécies da Fauna Ameaçadas de Extinção
A ilha da Queimada Grande fica no litoral sul de São Paulo, a 35 quilômetros da costa. Ela é coberta por mata atlântica e tem 430 mil m². Presença humana constante, só durante certo período no início do século passado, quando o farol da Marinha ainda não era automatizado. Lá não há mamíferos nem água potável, mas há anfíbios, aves marinhas de espécies migratórias e também de residentes. E cobras, muitas cobras. Milhares delas. De uma espécie que só é encontrada nessa ilha: a jararaca-ilhoa.
Acredita-se que originalmente ela e a jararaca encontrada no continente (Bothropoides jararaca) eram a mesma espécie. Porém, quando terminou a última glaciação da Terra, entre 10 mil e 12 mil anos atrás, a porção de terra que hoje é a ilha da Queimada Grande se separou do continente e essa população de serpentes ficou isolada, sendo obrigada a se adaptar às características restritas do novo habitat.
Sem mamíferos para caçar, restou a essas cobras se alimentar de aves. E para isso, a espécie passou a viver em cima das árvores. Enquanto a jararaca continental é basicamente terrestre, a ilhoa aprendeu a se prender como um laço em volta dos galhos e a se sustentar pendurada. Apenas quando jovem ela fica o tempo todo no chão, se alimentando de lacraias, lesmas e sapos. Se a continental tem hábitos noturnos, a ilhoa teve que aprender a ter atividade diurna, seguindo o ritmo das aves.
O veneno da jararaca-ilhoa também se tornou muito mais potente que o da espécie do continente. Nas aves, seu efeito é cinco vezes mais forte. Embora as peçonhas (veneno) dela e da espécie do continente sejam parecidos em termos bioquímicos, tanto que o soro antiofídico é o mesmo, acredita-se que algumas das poucas substâncias diferentes da jararaca-ilhoa possam resultar em novos medicamentos. Vale lembrar que a peçonha da jararaca comum deu origem a medicamentos anti-hipertensivos.
Esse potencial de uso para a formulação de medicamento faz com que essas serpentes sejam cobiçadas no tráfico ilegal de animais. A jararaca-ilhoa é um importante alvo da biopirataria.
A existência concentrada em uma área tão pequena é outra ameaça à espécie, já que a baixa variabilidade genética a deixa mais suscetível a doenças e a alterações ambientais. Pesquisadores afirmam que, além de se encontrar menos cobras hoje na ilha, os indivíduos existentes são menores do que os vistos há cerca de 30 anos. As próprias queimadas naturais, que são típicas da ilha – daí seu nome -, também ameaçam as serpentes.
A enorme quantidade de cobras sempre atraiu pesquisadores à Ilha da Queimada Grande. A sobrevivência da jararaca-ilhoa, esta serpente que tão bem soube se adaptar, depende de trabalhos de proteção e conservação da ilha e de ações como a criação em cativeiro para futura reintrodução na natureza.
– Texto publicado originalmente em 20 de janeiro de 2016
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