Por Juliana Summa
Bióloga, diretora da Divisão de Fauna Silvestre da Secretaria do Verde e do Meio Ambiente da Prefeitura de São Paulo, responsável pela gestão do Centro de Manejo e Conservação de Animais Silvestres (Cemacas).
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Entre os anos de 2017 e 2018, o município de São Paulo passou por um surto de febre amarela — evento que não ocorria há décadas na cidade e que causou o extermínio de centenas de bugios-ruivos (Alouatta guariba), principalmente na região que abriga a serra e o Parque Estadual da Cantareira. O Centro de Manejo e Conservação de Animais Silvestres (Cemacas) recebeu durante esses dois anos muitos dos primatas positivos para febre amarela, com 100% de morte nos casos dos bugios infectados.
A Divisão da Fauna Silvestre tem um histórico de 26 anos de soltura de bugios no município, com casos de indivíduos que permaneceram nas áreas onde foram soltos e se reproduziram por anos. Animais da espécie foram os que sempre exigiram particular dedicação das equipes.
Durante o período da febre amarela, as solturas realizadas pela Divisão foram totalmente suspensas, pois alguns dos grupos soltos na zona sul do município também foram vítimas da doença.
Por conta desse risco, para garantir que as áreas vazias de bugios fossem repovoadas e que os grupos não fossem novamente dizimados pela doença, em 2022 teve início o projeto de pesquisa “Avaliação da resposta humoral da vacina para febre amarela em bugios-ruivos (Alouatta guariba) mantidos no Centro de Manejo e Conservação de Animais Silvestres – Divisão de Fauna Silvestre, da Prefeitura do Município de São Paulo”. A Divisão foi instituição colaboradora, em conjunto com o Instituto de Medicina Tropical da Universidade de São Paulo (USP) e a Superintendência de Controle de Endemias (Sucen) da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo.
Dos bugios-ruivos mantidos no Cemacas, 38 foram examinados e vacinados entre julho e agosto de 2022. Alguns, como mãe com filhotes recém-nascidos, foram excluídos, pelo risco de desenvolverem a doença, até terem condições de serem imunizados. A vacina utilizada é a mesma fornecida aos humanos: vacina de vírus atenuado, cedida pela Secretaria de Estado da Saúde, com autorização da Fiocruz e do Programa Nacional de Imunização do Ministério. Os animais foram manejados para coleta de sangue antes e após a vacinação (30, 60 e 180 dias após). Nesses manejos, além do exame clínico, foi realizada coleta de material para complementar a verificação da saúde dos indivíduos.
Como se vê, a função de um centro de triagem e reabilitação de animais silvestres (Cetras) vai muito além de somente receber animais silvestres e destiná-los. Além de buscar soluções para garantir o bem-estar e aumentar as chances de sucesso dos animais no retorno à vida livre, é possível aproveitar a permanência deles para fornecer dados à pesquisa científica e à vigilância de doenças.
Os bugios agora estão imunizados, motivo de comemoração e alívio na manutenção em cativeiro. Sem o risco de morte pela doença, nasce a esperança de que será possível, um dia, recolocá-los novamente nas áreas verdes da cidade.
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