Por Ingridi Camboim Franceschi
Graduada em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), onde é mestranda, sendo integrante do Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias (NERF)
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As rodovias impactam diversas populações de diferentes maneiras. A maioria das populações humanas é beneficiada com construções e pavimentações de rodovias, especialmente a conexão das áreas rurais com os centros urbanos, pois facilita o deslocamento e o acesso. Contudo, as populações indígenas não são beneficiadas da mesma forma. Pelo contrário, sabe-se que a construção de estradas dentro ou próximas de áreas indígenas causam impactos negativos para as comunidades, como ocupações e atividades irregulares no entorno. Assim como nós, seres humanos, as populações de fauna silvestre também podem ser impactadas tanto positivamente como negativamente pelas estradas.
Estudos demonstram que algumas populações de espécies de pequenos mamíferos são positivamente impactadas pela presença das rodovias e isso deve-se ao fato desses animais utilizarem a vegetação presente nas margens das estradas. Além disso, algumas populações de aves podem se favorecer dos grãos que caem dos caminhões durante o transporte. E, também, o clássico caso dos que se alimentam de animais mortos (conhecidos como carniceiros) nas colisões com veículos. Alguns invertebrados, como os polinizadores, também encontram pontos positivos nas estradas, como foi abordado em outro artigo. Esses são alguns exemplos de animais que têm suas populações beneficiadas pela presença das rodovias, ao contrário de muitos outros que não encontram vantagens.
A maioria dos animais sofrem impactos negativos diretos com a presença das rodovias, seja por colisões com os veículos, caça, perda de habitat e/ou fragmentação do mesmo. Como exemplos de impacto indiretos temos os efeitos barreiras, sendo que estudos apontam que eles podem causar redução no fluxo gênico das espécies, ou seja, menor migração de genes entre a população; os efeitos dos ruídos, que podem prejudicar a comunicação entre os indivíduos e afetar a época reprodutiva, especialmente em aves e anfíbios; e a intoxicação indireta por resíduos descartados incorretamente nas estradas, antioxidantes nas borrachas dos pneus e herbicida para controlar a vegetação na beira das rodovias. Ressaltando que, apesar de os impactos das estradas estarem mais associados a fauna de vertebrados, muitos invertebrados também são prejudicados, como já relatamos em outros artigos, como no caso do caranguejo maria-farinha e das borboletas.
A questão final é que não existe um impacto positivo sem um impacto negativo. Populações de fauna silvestre que vivem próximas das rodovias, como citadas anteriormente, também sofrem de impactos negativos, pois há o risco de os indivíduos morrerem atropelados a qualquer instante. Da mesma forma, esse balanço se aplica para nós, já que apesar das estradas possibilitarem a conexão entre as pessoas é também nelas que muitas vidas são perdidas em acidentes com veículos.
É importante termos responsabilidade sobre nossas ações. A construção e pavimentação de rodovias tem seus benefícios, mas não podemos esquecer e negligenciar os malefícios causados em tantas populações, sejam para as comunidades indígenas sejam às populações de fauna silvestre ou outras não citadas. As estradas precisam ser mais seguras para o deslocamento da fauna e para nós também. Para isso, é fundamental que projetos dessas dimensões sejam objeto de diálogos com as comunidades do entorno, tenham alternativas levando em consideração um maior distanciamento do empreendimento dessas áreas e realizem estudos adequados para avaliar as melhores medidas mitigadoras para a fauna (artigos de junho de 2016, dezembro de 2018 e maio de 2019).
A presença de estradas pode ser boa ou ruim, depende do nosso ponto de vista. Porém, não podemos esquecer do ponto de vista do outro. Vivemos em sociedade e fazemos parte do meio ambiente.
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