Por Luiz Pires
Zootecnista e diretor do Parque Zoológico Municipal de Bauru
Nossa cidade é famosa por muitos feitos, como o de um filho da terra que criou a receita do lanche mundialmente conhecido; daqui o Rei Pelé foi lançado para o mundo do futebol; e também é bauruense o primeiro brasileiro a viajar ao espaço, o astronauta Pontes. Como seria legal se dessa terra só tivéssemos bons exemplos. Porém, nos assusta muito o título que poderemos em breve receber; de uma das regiões onde mais onças-pardas estão sendo atropeladas e mortas, sem contar daquelas que acabam “passeando” por ruas, praças e quintais no meio urbano.
Nos últimos 18 meses, o número chega a ser assustador. Foram sete atropelamentos com óbito em três rodovias diferentes e dois resgates em área urbana. Tudo isso ocorrendo num raio de 20 km de nossa cidade. Há mais de 30 anos no Zoológico Municipal de Bauru, nunca tínhamos sido solicitados para auxilio em situações como essas em nossa região, até a primeira ocorrência em dezembro de 2013.
Aí vem a pergunta: o que mudou para isso estar ocorrendo com uma frequência assustadora? Como resposta já obtivemos muitas hipóteses que carecem de estudo mais aprofundado para buscar soluções de mitigação. Seriam elas: as populações de onças-pardas estariam aumentando após a proibição da queima da cana no Estado de São Paulo; o distanciamento entre fragmentos florestais estaria obrigando o deslocamento mais constante dos felinos na procura de campo de alimento ou mesmo parceira(o) para reprodução; a implantação de loteamentos fechados mais distantes dos centros urbanos estaria afetando drasticamente a paisagem natural e provocando a mudança de área dos animais; a monocultura do eucalipto, intensificada na ultima década, teria criado ambiente favorável à espécie; animais exóticos como o lebrão-europeu e o javali, seriam uma nova e farta fonte de alimento; as redes sociais estriam possibilitando uma maior disseminação de informação sobre atropelamentos ocorridos; as estradas agora duplicadas oferecem um maior risco de atropelamento…
Não temos dúvidas de que muitas dessas hipóteses se complementam, mas inegavelmente os animais que se hoje são mais, ou menos, estão sim sendo trucidados em nossas estradas, principalmente em uma região onde quatro delas já estão duplicadas e uma está sendo neste momento. Esses casos não podem mais serem chamados de acidente, mas sim negligencia por parte de quem tem a responsabilidade de cuidar, de fiscalizar e de licenciar esses empreendimentos. Se sabem que as onças-pardas estão morrendo atropeladas, e com certeza sabem, pois fazemos sempre questão de divulgar e muito esses lamentáveis fatos, o que esses órgãos estão fazendo? Onde estão os estudos e o monitoramento do deslocamento de fauna no entorno desses empreendimentos?
Somente preencher fichas e alimentar dados estatísticos não basta, pois assistirmos a morte de tantos indivíduos de uma espécie topo de cadeia alimentar e não enxergarmos, por parte das autoridades competentes, nenhum esforço que busque entender e mitigar tais fatos nos leva a desacreditar na política e na gestão de fauna proposta pelos atuais mandatários. Ou nós, que trabalhamos com a fauna, seja em seu ambiente de ocorrência natural ou sob cuidados humanos, nos unamos para dar voz a esses espécimes, mostrar a todos a saga que estão vivendo, cobrar de quem tem que ser cobrado, ou então esses números absurdos de minha região, que hoje levo a conhecimento de vocês, continuarão sendo somente estatísticas a serem estudas algum dia.