
Por Vanessa Vidal
Bióloga, mestra em Zoologia pela Universidade Federal do Pará (UFPA) e pelo Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG). Integrante do Grupo de Estudos de Artrópodes da Amazônia – GEAA (Instagram e Facebook)
invertebrados@faunanews.com.br
Quem vê esse animalzinho até pode se assustar e pensar que um escorpião perdeu o rabo. Mas não é bem assim, pois se trata de um outro aracnídeo, da ordem Pseudoescorpiones (junção do prefixo pseudo que significa falso ou parecido, com a palavra escorpião, já que à primeira vista eles têm a morfologia parecida).

Os pseudoescorpiões são animais bem pequenos, de um a dois centímetros (as fotos que temos aqui tem zoom, hein). Assim como os escorpiões, apresentam seu corpo com o cefalotórax e o abdômen unidos e pedipalpos em forma de pinça. Mas as similaridades acabam aí, pois eles não têm a “cauda” do escorpião, ou seja, ocorre a ausência de télson modificado com a presença de glândula de veneno.
Esses animais apresentam mais de 3.700 espécies distribuídas em quase todas as regiões do mundo. Para nosso país, existem registros de 174 espécies distribuídas em todos os biomas, sendo a Amazônia o que possui o maior número de espécies registradas – 57 espécies!. Habitam geralmente locais de serrapilheira (camada na superfície do solo formada pelo acúmulo e decomposição de material orgânico, como folhas e animais mortos), sob cascas de árvores e pedras, cavernas e no limo. Mesmo sendo comuns, são raramente observados graças ao seu habitat e tamanho, só não passando desapercebidos dos olhos mais atentos e curiosos, como os seus, a partir de agora, leitor.
Mas o que será que esses serezinhos comem? Acredite se quiser, eles são predadores! Nos seus pedipalpos possuem glândulas de veneno, que utilizam para predar animais também bem pequenos, como colêmbolos (ordem de pequenos artrópodes), ácaros e larvas. Mas fique tranquilo, mesmo com algumas espécies tendo veneno, lembre-se que são animais muito pequeninos e não representam perigo para os humanos.
Outro hábito desses seres é o de “pegar carona” em outros animais, conhecido como foresia. Pseudoescorpiões já foram flagrados “dando aquela voltinha” em artrópodes como besouros e moscas, sendo uma forma de colonizar novos locais.

As espécies apresentam diversos hábitos de vida, sendo a maioria solitária, mas algumas apresentam períodos de agregamento com alguma finalidade e até mesmo cooperação. Quando em colônias, há divisão de trabalho e vários indivíduos se juntam para atividades como a caça cooperativa, cuidado dos filhotes, defesa do ninho e construção coletiva.
A sua reprodução ocorre com ajuda de uma estrutura que contém espermatozoides, formada pelo macho, chamada de espermatóforo. O espermatóforo é deixado pelo macho no solo, sendo que em algumas espécies após um ritual de movimentos com a fêmea (chamado de corte), enquanto em outras ele só é deixado no chão e a parceira o recolhe e é fecundada.

Após a fecundação e antes da postura de ovos, a fêmea constrói um ninho com seda que ela mesma produz nas suas quelíceras (outra diferença entre estes animais e os escorpiões). Além do ninho, a mãe produz um saco membranoso no seu ventre onde deposita de dois a 50 embriões. Após o nascimento, os filhotes ainda permanecem no ninho por um tempo. Quando o alimentado é caçado, os primeiros a se alimentar são os filhotes e, caso não haja alimento, um comportamento curioso foi descoberto na espécie Paratemnoides nidificator: a mãe se sacrifica e é comida viva pela prole, a chamada matrifagia. Haja, cuidado!
Indicamos novamente o aplicativo de ciência cidadã iNaturalist para quem quiser conhecer mais e ver várias fotos maravilhosas dos pseudoescorpiões e sua diversidade. Além disso, o Grupo de Estudos de Artrópodes na Amazônia (GEAA) realizou um evento on-line chamado Arthropoda Happy Hour (AHH), em que vários pesquisadores de diversos artrópodes foram convidados para palestrar e a edição em que os pseudoescorpiões foram tema está imperdível.
Referências
– Bevilaqua, M.; Soares, M.M.M.; García F. First record of phoretic association between Cordylochernes scorpioides (Linnaeus) (Pseudoscorpiones: Chernetidae) and Hylettus coenobita (Erichson) (Coleoptera: Cerambycidae) in central Amazon. Revista Chilena de Entomología, 46(3), p. 387-392, 2020
– Brusca, R.C.; Brusca, G.J. Invertebrados. 2ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2007
– Del-Claro, K.; Tizo-Pedroso, E. Ecological and evolutionary pathways of social behavior in Pseudoscorpions. Acta Ethologica, 12(1), p. 13-22. 2009
– Ruppert, E.; Barnes, R.D. Zoologia dos Invertebrados. 6ª ed. São Paulo: Roca Ed., 1996
– Tizo-Pedroso, E.; Del-Claro, K. Is There Division of Labor in Cooperative Pseudoscorpions? In Analysis of the Behavioral Repertoire of a Tropical Species. Ethology, 117, p. 498-507, 2011
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