
Por Marcelo Calazans
Técnico em agropecuária, administrador de empresas e fotógrafo. Foi professor da disciplina Fotografia de Natureza pelo Senac-MS
photoanimal@faunanews.com.br
Olá, amigos!
Dando sequência ao artigo anterior, neste novo material irei abordar um pouco sobre como, quando, onde e o porquê observarmos corujas.
O termo coruja é usado para designar aves Estrigiformes, das famílias dos Titonídeos e Estrigídeos. Na região do Amazonas, algumas espécies também são chamadas de murutucu. Tais aves possuem hábitos noturnos, e vôo silencioso devido à estrutura das penas, alimentando-se de pequenos mamíferos (principalmente de roedores e morcegos), insetos e aranhas. Engolem as refeições inteiras, para depois vomitarem pelotas com pelos e fragmentos de ossos. Os filhotes de corujas podem ser vítimas de outros predadores, como os gaviões.
As corujas podem girar a cabeça e o pescoço em até 270 graus, em qualquer direção e, apesar do tamanho dos seus olhos, elas não conseguem mexer seus globos oculares. O símbolo da deusa grega da sabedoria, Athena, é uma coruja do gênero Athene: o mocho-galego (Athene noctua), primo da nossa coruja-buraqueira (Athene cunicularia). A coruja também é considerada o símbolo da filosofia.
E dando continuidade ao assunto, replico um artigo excelente e completo sobre observação de corujas. Escrito por um grande amigo, Willian Menq, que gentilmente cedeu seu trabalho para essa coluna.
Menq é ornitólogo, mestre em Zoologia pela Universidade Estadual de Londrina, especialista em ecologia e conservação de aves de rapina neotropicais. Ele atua na área de ornitologia, trabalhando principalmente em monitoramentos e avaliações de impactos ambientais sobre a avifauna. Criador do maior e mais completo site sobre rapinantes do Brasil, O Aves de Rapina Brasil. www.avesderapinabrasil.com.
Gratidão, Menq!
“As corujas são aves carismáticas, despertam o fascínio e a curiosidade do homem desde tempos remotos. Observá-las na natureza não é nada fácil, devemos estar preparados para sair ao anoitecer ou durante a noite, quando nossos ouvidos serão mais importantes que nossos olhos. Neste artigo, segue algumas dicas importantes para observadores de aves, fotógrafos e ornitólogos interessados em registrar ou fotografar corujas na natureza.
Como encontrar as corujas?
Para observar corujas é necessário equipamentos e métodos específicos. A principal técnica para conhecer as espécies de corujas florestais de um determinado local é do “playback”.
O playback consiste na reprodução da vocalização de uma determinada espécie (usando aparelho de som), esperando que a mesma responda os chamados. Geralmente as aves responde achando que é um parceiro (a) ou um intruso invadindo seu território.
É inegável que o playback aumenta as chances de detecção de corujas, com ele é possível observar espécies que raramente seriam vistas ao acaso. Em um estudo que realizei comparando o número de espécies registradas com e sem playback, constatei que o playback aumentou de 30 a 80% o sucesso na detecção de corujas. Porém, é importante ressaltar que o uso incorreto do playback pode espantar ao invés de atrair as corujas e ainda estressá-las.
Para a realização do playback é necessário o uso de um aparelho de som e lanternas de qualidade, incluindo baterias reserva. Caixinhas de som ligadas a IPod ou smartphones são eficientes para a realização da técnica. A vocalização das espécies pode ser baixada em formato mp3 em alguns sites da internet, como no Xeno Canto (xeno-canto.org) ou Wikiaves.
O primeiro passo é a escolha do local para o playback. Se o objetivo é observar corujas florestais, é interessante escolher locais propícios à ocorrência delas, como matas preservadas, áreas com dossel alto, abundância de árvores grandes e esconderijos, troncos em pé, e locais com poucas perturbações.
Ao chegar no local escolhido, antes mesmo de iniciar o playback, permaneça em silêncio por alguns minutos para verificar se não há nenhuma espécie vocalizando de forma espontânea. Caso contrário inicie a reprodução do canto da(s) espécie(s)-foco. O tempo de reprodução de cada gravação deve ser no máximo dois minutos, sendo necessário pelo menos três minutos de espera, já que algumas corujas demoram um pouco para responder. Se perceber a resposta da espécie antes disso, não há necessidade de contiunuar tocando. Ela provavelmente se aproximará da fonte, muitas vezes pousando muito próximo do observador e garantindo alguns minutos de observação. Tempo geralmente curto, mas suficiente para fazer algumas fotografias e contemplar a espécie.
O som deve ser reproduzido em volume similar ou mais baixo do que o canto das corujas. Não abuse do volume, não altere o canto nem o intervalo entre os mesmo. Volume elevado e intervalos reduzidos podem distorcer o som ou dar a impressão de que o invasor (sua gravação) é muito mais forte/tem energia, o que ocasionaria o afugentamento ao invés de atração das corujas do local.
No caso de tocar o som de várias espécies no mesmo ponto, comece reproduzindo sempre das espécies menores para as espécies maiores. Ou seja, iniciando pelo som das corujinhas do gênero Glaucidium (caburés), Megascops (corujinhas-do-mato), encerrando nas Strix e Pulsatrix. Dessa forma, o observador evita que as pequenas sejam inibidas pela falsa presença das maiores. Nem sempre é necessário tocar o som de todas as espécies, muitas vezes tocando o som de uma única representantes de cada gênero é suficiente.
Caso toque a gravação em mais de um local, estabeleça uma distância mínima de pelo menos 300m (ideal 500m) entre os pontos estabelecidos. Fazendo isso o observador evita atrair ou perturbar os mesmos indivíduos.
Quando observar?
Período da noite:
As corujas, de forma geral, possuem maior atividade nas três primeiras horas após o escurecer e pouco antes do amanhecer, sendo estes os melhores horários para observá-las. Nestes horários geralmente estão forrageando atrás de alimento ou cantando.
Período do ano:
O melhor período do ano para encontrar as corujas é na época reprodutiva, que varia de acordo com a espécie e região do Brasil. Nesse período, por serem territoriais, defendem a área do ninho e filhotes contra intrusos, sendo mais ativas, o que facilita a detecção. Na região sul, sudeste e nos estados brasileiros com estações mais definidas, o período reprodutivo normalmente inicia no começo da primavera. Nas regiões mais quentes do país (norte e nordeste) elas podem se reproduzir em qualquer época, principalmente no final da estação seca.
Em outras épocas do ano as corujas também podem ser encontradas, uma vez que nenhuma é migratória.
Clima:
As corujas são mais fáceis de serem encontradas em noites claras e sem vento. A temperatura não é tão importante. Já noites com muitos ventos ou chuva são inúteis para a observação de corujas. O vento afeta a plumagem macia dessas aves e o ruído do vento atrapalha sua orientação acústica. Algumas corujas são sensíveis a baixa pressão atmosférica, tornando-se silenciosas se a pressão atmosférica cair durante uma noite calma e clara, dando lugar a uma manhã chuvosa. Por outro lado, as corujas podem estar bastante ativas durante noites com uma ligeira chuva ou garoa se houver um aumento na pressão atmosférica, anunciando uma manhã clara.
Onde observar corujas?
Matas e florestas são os melhores locais para encontrar corujas. Das 22 espécies existentes no Brasil, pelo menos 17 estão associadas aos ambientes florestais. Pontos no interior ou na borda da mata com vegetação mais densa, árvores altas, com presenças de troncos em pé e cavidades é o habitat preferencial das espécies maiores, de dossel, como a murucututu (Pulsatrix perscipillata) e coruja-preta (Strix huhula), sendo ótimos locais para a realização de playbacks.
Bosques e campos com árvores esparsas, é o habitat preferido do mocho-orelhudo (Asio clamator). Corujinhas do gênero Megascops costumam ocorrer em todo o tipo de mata, inclusive as mais fragmentadas. Já o mocho-dos-banhados (Asio flammeus) é restrito a campos e banhados.
É importante conhecer a área de ocorrência das espécies-alvo. Há corujas que ocorrem em todo o país, como a suindara (Tyto furcata) e corujinha-do-mato (Megascops choliba). Outras são restritas a uma determinada região/bioma, como a caburé-miudinho (Glaucidium minutissimum) e corujinha-do-sul (Megascops sanctaecatarinae).
Vestimenta e equipamentos
– Roupas escuras (verde, marrom ou preto) e leves. Quando o observador está bem camuflado, as corujas costumam se aproximar mais (às vezes sobre nossas cabeças), garantindo bons minutos de observação e fotografias.
– Lanterna, acessório indispensável para caminhar durante a noite e para encontrar corujas. Lanternas de leds são mais adequadas, são econômicas e possuem boa iluminação.
– Câmera fotográfica e/ou gravador de áudio.
– Aparelho de som portátil e aparelho para reprodução de vocalização de corujas previamente carregadas (realização de playback).
– Mochila para levar repelente, água, comida, pilhas e equipamentos.
Dicas e segurança
– Conheça a área que irá visitar durante o dia, e estabeleça os pontos mais adequados para ocorrência das espécies que deseja observar.
– Leve baterias/pilhas reserva para a lanterna.
– Avise alguém onde você está indo e quando irá retornar.
– De preferência esteja acompanhado de alguém e fique atento ao caminho, pois à noite é sempre mais difícil memorizar trilhas sem sinalização.
– Leve celular com bateria carregada.
– Leve um casaco ou uma blusa, pois mesmo no verão as noites na floresta costumam ser mais frias.
– Durma, descanse antes de ir a campo observar corujas.
– Não dirija cansado.
– Quando visitar áreas privadas, peça autorização aos proprietários.
– Para evitar surpresas, consulte a previsão do tempo.
– Usar repelente é fundamental, ele auxilia na proteção contra mosquitos que podem transmitir doenças como a dengue, malária e leishmaniose.
– Usar perneiras ou calçado de cano alto é também muito importante.”
E assim, encerro os artigos sobre como, quando, onde e por que observar aves de rapina. Nos vemos daqui alguns dias! Abraço e até lá!
Para mais dicas técnicas de fotografia e configurações de câmera (para registro de aves, paisagens e outros animais), releia um artigo publicado aqui no Fauna News.
Saiba mais sobre as espécies de corujas que ocorrem em nosso país visitando o site Aves de Rapina Brasil.
Artigo reproduzido de Willian Menq.