
Por Andréa Almeida
Bióloga, mestra em Ecologia e Recursos Naturais e pós-graduada em Direito e Gestão Ambiental. Está concluindo MBA em Gestão da Qualidade, Saúde, Meio Ambiente e Segurança. É analista portuária-bióloga na Portos do Paraná e integrante da REET Brasil
transportes@faunanews.com.br
O transporte aquaviário de granéis líquidos corresponde a movimentação de diversos produtos líquidos, dentre os quais estão produtos perigosos tais como os combustíveis já refinados e o petróleo bruto vindo das plataformas de exploração e produção. O processo de carregamento e descarregamento desses produtos dos navios é feito por dutos subterrâneos ou aéreos entre o terminal de armazenamento e o cais, sendo que muitas vezes esses dutos estão instalados próximos a áreas ecologicamente sensíveis, como manguezais e restingas. Além disso, a movimentação de produtos perigosos líquidos pode ocorrer em operações ship-to-ship (passagem de um carregamento de um navio para outro) e do abastecimento dos tanques de combustíveis dos próprios navios. Assim, o gerenciamento de riscos dessas atividades é de suma importância para garantir operações seguras, tanto no carregamento/descarregamento quanto na navegação a fim de evitar acidentes que originem vazamentos.
Mas, o que fazer quando ocorre vazamento de óleo nessas operações? E se a fauna aquática/terrestre local for atingida, quem atende os animais oleados?
No Brasil existe a Lei nº 9.966/2000 que dispõe sobre a prevenção, o controle e a fiscalização da poluição causada por lançamento de óleo e outras substâncias nocivas ou perigosas em águas sob jurisdição nacional e dá outras providências, conhecida como Lei do Óleo. Quando estão ausentes os pressupostos para aplicação da Convenção Internacional para a Prevenção da Poluição Causada por Navios (Marpol 73/78), essa lei é aplicável a embarcações nacionais, portos organizados, instalações portuárias, dutos, plataformas e suas instalações de apoio (em caráter complementar à Marpol 73/78); a embarcações, plataformas e instalações de apoio estrangeiras cuja bandeira arvorada seja ou não de país contratante da Marpol 73/78, quando em águas sob jurisdição nacional; a instalações portuárias especializadas em outras cargas que não óleo e substâncias nocivas ou perigosas e a estaleiros, marinas, clubes náuticos e outros locais e instalações similares; e a instalações portuárias especializadas em outras cargas que não óleo e substâncias nocivas ou perigosas.
Nessa lei é prevista a necessidade de elaboração de plano de emergências individuais para combate à poluição por óleo ou substâncias nocivas para portos organizados, instalações portuárias, plataformas e instalações de apoio, de forma que esses empreendimentos possam avaliar os possíveis cenários de incidentes envolvendo esses produtos e se preparar para uma resposta rápida e efetiva. É previsto, ainda, que esses planos sejam aprovados pelo órgão ambiental competente, que geralmente é o licenciador do empreendimento. Os empreendimentos que não possuírem tal plano estão sujeitos à aplicação de multa, conforme o Decreto nº 4.136/2002, que regulamenta a Lei do Óleo.
E qual deve ser o conteúdo desse plano e sua relação com a fauna?
De forma a estabelecer diretrizes para o conteúdo dos planos de emergências individuais dos empreendimentos, foi publicada a Resolução Conama nº 398/2008. Essa resolução estabelece, entre outros, a necessidade dos empreendimentos de dimensionarem a capacidade de resposta, de identificarem os cenários acidentais, de incluírem uma descrição de impacto à fauna, de analisarem as vulnerabilidades e de descreverem os procedimentos para proteção da fauna, incluindo fauna migratória, devendo serem detalhadas as medidas adotadas para socorro e proteção dos indivíduos atingidos. Assim, os empreendimentos potencialmente poluidores devem possuir estrutura de resposta para atendimento à fauna em casos de acidentes com vazamento de óleo, de forma a garantir o seu atendimento veterinário, tratamento, reabilitação e soltura, caso seja possível.

Nesse sentido, para garantir que haja estrutura de resposta à fauna adequada em eventos de vazamento de óleo no país, o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) elaborou o Plano Nacional de Ação de Emergência para Fauna Impactada por Óleo (PAE-FAUNA). O PAE-FAUNA é composto pelo Manual de Boas Práticas do Ibama, aplicável de forma obrigatória para empreendimentos licenciados pelo órgão e facultativo para empreendimentos licenciados por outros órgãos ambientais, pelo Mapeamento Ambiental para Resposta e Emergência do Mar (MAREM) e pelo Plano de Fauna Oleada do Ibama (destinado aos servidores do órgão).
Visando o adequado atendimento à fauna oleada, há também o Plano Nacional de Contingência para Incidentes de Poluição por Óleo em Águas sob Jurisdição Nacional (PNC), instituído pelo Decreto nº 8.127/2013, na qual prevê que o poluidor ou os responsáveis pelos planos de emergência realizem “o resgate da fauna por pessoal treinado e seu transporte para centros de recuperação especializados”.
A coordenação do PNC pode, ainda, acionar os planos de área, que devem ser elaborados em regiões de concentração de portos organizados, instalações portuárias ou plataformas e suas respectivas instalações de apoio (Decreto nº 4.871/2003). Esse plano visa integrar os planos de emergência individuais dos empreendimentos instalados na região de sua abrangência, ampliando a capacidade de resposta.
Apesar da atuação da esfera governamental, a responsabilidade de resposta à emergência é do poluidor e mesmo quando o vazamento é de origem desconhecida, como o que atingiu o litoral do Nordeste em 2019, podem ser acionados os planos de área em regiões cobertas por esses, para que seja realizado o atendimento.
Dessa forma, o atendimento adequado à fauna oleada depende, em primeira instância, da existência de bons planos de emergências individuais dos empreendimentos potencialmente causadores de emergências por óleo, sendo que esses planos devem conter a adequada previsão de uma estrutura de resposta à fauna atingida no local.
Nesse âmbito, é essencial que os órgãos licenciadores realizem uma cuidadosa avaliação para aprovação desses planos e conheçam os recursos disponíveis para fiscalizar e coordenar atendimentos a emergências, visando, em primeiro lugar, a proteção da fauna (evitar que o vazamento atinja esses animais e, se necessário, o correto resgate e assistência).
– Leia outros artigos da coluna FAUNA E TRANSPORTES
Observação: as opiniões, informações e dados divulgados
no artigo são de responsabilidade exclusiva de seu(s) autor(es)