Por Frederico Blanco
Designer de produto por formação e observador de aves por paixão. Cofundador do Clube de Observadores de Aves do Brasil (COA Brasil), da Revista Uru, do Podcast Uru e, atualmente, é um dos responsáveis pelo projeto Ave-Guairá, dedicado à conservação da avifauna campestre do sul de Minas Gerais
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A observação de aves se deu muito cedo na minha vida, por volta dos 10 anos de idade. Guardo até hoje o primeiro livro sobre aves que ganhei de um tio muito querido (e atento). O desenho, contudo, especialmente de animais, se deu mais cedo ainda, desde o momento em que consegui equilibrar bem o lápis entre os dedos. Desenhava tudo que era bicho, inspirado pelas enciclopédias ricamente ilustradas do início dos anos 1990 e tinha uma paixão incontida pelos dinossauros que, no fundo, eram as “aves” do passado.
Só fui me reconhecer como um observador de aves já adulto, quando tomei conhecimento do termo e da prática. Mas ainda criança, eu prestava muita atenção nos sanhaçus e pipiras que “atacavam” um jambeiro que ficava no quintal da casa de uma prima. Depois do livro que ganhei, passei a querer ver todas as aves ilustradas em tudo que era lugar que ia. Nesse período, minha família passava os finais de semana no interior do Pará, em Bragança, o que me ajudava na possibilidade de encontrá-las, por conta da proximidade com áreas mais selvagens.
A ilustração de aves, especificamente, se deu bem mais tarde no meu caminho, como um hobby mesmo. Ainda que sempre tivesse facilidade com o traço e certa fixação pelas aves, elas nunca tinham se tornado o objeto dos meus desenhos e pinturas. Certa insegurança talvez, por comparação com as ilustrações lindas dos livros que fui comprando ao longo do tempo. Aqui vai uma dica: não se compare! Ou, se se comparar, não deixe que isso trave você. Hoje, ilustro utilizando técnicas mistas como nanquim, aquarela, guache, etc. Mas aquarela e guache são meus materiais preferidos pela expressividade que podem dar à pintura.
Uma outra dica preciosa sobre ilustrar natureza é que nada se compara a você poder observar ao vivo o objeto da sua ilustração. É claro que livros, vídeos e fotos ajudam muito, mas, acredite, ver ao vivo algo que se está pretendendo ilustrar melhora muito a precisão do traço, da cor, da luz, de tudo. Dito isso, para aqueles que pretendem começar a ilustrar natureza, uma boa escola de técnicas é a própria natureza. Conheço muitos pintores de vida selvagem, alguns são os melhores no que fazem e têm a natureza como estúdio. É comum vê-los equilibrando seus apetrechos de pintura e suas lunetas enquanto observam gansos, garças, grous, águias, etc. E as ilustrações, de tão realistas que parecem fotos.
Em meados de 2017, lancei, junto com dois amigos, a Revista Uru, um periódico digital sobre ornitologia e observação de aves, acredito que motivado por um desejo íntimo de unir conteúdo sobre as aves e o desenho, talvez uma forma de sempre ter “motivo” para ilustrar. Ainda que não precise haver motivo algum para isso, pois o próprio lazer e o relaxamento já são razões suficientes. No início da revista, estabelecemos uma única regra: não utilizar fotos, apenas ilustrações para compor visualmente os artigos que escreveríamos.
Nosso propósito parece ter funcionado. Sentimos que os leitores acabam gostando desse tipo de mídia. Penso que a foto, por melhor que seja, acaba sendo algo já muito comum e o conteúdo pode passar batido, como sendo só “mais do mesmo”. Além disso, com a ilustração, temos a vantagem de criar a cena que quisermos, destacar os detalhes que acharmos mais importantes, etc. Essa flexibilidade torna a ilustração estratégica para a Ciência, pois existem determinados contextos, cenas e detalhes que seriam muito difíceis de serem capturados via foto ou vídeo, mas que são detalhados facilmente via ilustrações científicas.
Hoje, boa parte das ilustrações que faço ainda são para compor materiais para a Revista Uru e, ainda mais especificamente, para compor os episódios do Uru Podcast, que lançamos em meio à pandemia de Covid-19. Outra parte são encomendas que recebo e pinturas de aves que sinto vontade de fazer quando tenho tempo livre.
Muito se fala sobre os benefícios da observação de aves para a nossa saúde mental e, mesmo sem estudos aprofundados, é fácil perceber o quanto essa afirmação é real. No mundo hiper conectado em que estamos vivendo, onde as distrações são constantes e os rostos ficam virados para as telas de celulares, caminhar por entre campos e matas, atentos ao momento presente, em busca de aves (ao invés de novas notificações no Instagram) já é, por si só, uma terapia, uma meditação ou, como diria uma amiga, uma ioga. Que sorte a nossa poder passarinhar!
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Este artigo foi escrito por Frederico Blanco, designer de produto por formação e observador de aves por paixão. Ele faz parte dos Amigos da SAVE Brasil, uma rede de pessoas conectadas e engajadas pela conservação das aves na natureza. Você também pode fazer parte contribuindo anualmente com uma doação. Para isso, basta acessar savebrasil.colabore.org.br.
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