Bióloga, mestra e doutora em Ecologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). É consultora do Center for Large Landscape Conservation como especialista em ecologia de infraestruturas lineares. Também atua como docente colaboradora do Programa de Pós-Graduação em Ecologia e pesquisadora do Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias (NERF), ambos da UFRGS.
No artigo da semana passada (“O uso de diferentes abordagens para identificar locais para mitigar atropelamentos de fauna”), a pesquisadora Bibiana Terra Dasoler apresentou como diferentes abordagens – dados de armadilhas fotográficas, ciência cidadã e análise de circuitos – podem se complementar para subsidiar as indicações de onde implementar medidas de mitigação para os atropelamentos de animais em estradas.
No artigo desta semana, quero trazer um outro exemplo – na verdade, dois exemplos – de planos de mitigação construídos a partir da combinação de diferentes fontes de dados. São os relatórios para as rodovias US-191/MT-64 e US-89, que ficam no entorno do Parque Nacional de Yellowstone, nos Estados Unidos.
Essas duas rodovias têm vivenciado um crescimento acentuado do número de usuários e estão localizadas em dois vales que levam ao Parque Nacional de Yellowstone, o parque nacional mais antigo do mundo e que recebe milhões de visitantes todos os anos. Muitos animais silvestres vivem nessa região e o número de colisões de veículos com a fauna é muito alto, variando de 24% a 50% de todos os acidentes nas duas rodovias (em comparação a uma média de 5% no restante dos Estados Unidos!).
Estes dois relatórios combinam diferentes fontes de dados como base para selecionar trechos prioritários para mitigação, utilizando como grupo-alvo as espécies de mamíferos de médio e grande porte. Foram compilados e sobrepostos registros de acidentes com animais, registros de animais atropelados de diferentes fontes, como ciência cidadã e monitoramentos sistemáticos, dados de avistamentos de animais vivos próximos às rodovias, dados de uso de hábitat por diferentes espécies, dados de telemetria, movimento animal e mapas de conectividade.
Entre as informações consideradas, foram também realizados levantamentos de conhecimento ecológico local e tradicional. A partir de oficinas de mapeamento com as comunidades, foram obtidas informações importantes sobre movimento e presença de animais na região.
As áreas identificadas a partir das análises espaciais utilizando essas múltiplas fontes de dados foram posteriormente vistoriadas para definir o tipo de recomendação para cada trecho das rodovias. Nessa avaliação final também foi considerada a vulnerabilidade do entorno a mudanças no uso do solo.
Foram recomendadas medidas de mitigação como passagens de fauna sob e sobre a via e sistemas de detecção animal – todos combinados com cercamento para evitar o acesso dos animais à via. As recomendações também consideram a possibilidade de adequação das estruturas já existentes, como dutos de água e pontes. Esses relatórios foram produzidos a partir de colaborações entre instituições e indivíduos: os dois foram produzidos pelo Center for Large Landscape Conservation e pelo Western Transportation Institute. No caso específico da US-89, essas instituições participaram sob o guarda-chuva da Yellowstone Safe Passages Partnership, uma iniciativa que envolve múltiplas instituições públicas e privadas, além de indivíduos das comunidades que vivem no entorno da rodovia.
Primeiro, não existe apenas uma fonte de dados ideal ou correta para se definir a localização e o tipo de medidas de mitigação em rodovias. As alternativas de dados a serem utilizados e combinados para gerar recomendações de ações e subsidiar a tomada de decisão são múltiplas. Para várias regiões do Brasil, existem múltiplas bases de dados de biodiversidade que podem ser analisados e combinados para gerar avaliações em escala mais regional ou local. Devemos explorar essas possibilidades e aproveitar informações já existentes para planejar ações de conservação e mitigação.
Em segundo lugar, iniciativas multi-institucionais e com o apoio da comunidade têm o potencial de incluir uma maior diversidade de visões e dar suporte às tomadas de decisões mais robustas. Acredito que podemos aprender com esses exemplos e desenvolver avaliações e planos de mitigação no Brasil envolvendo múltiplos setores e fazendo bom uso de diferentes tipos de dados já existentes.
Observação: as opiniões, informações e dados divulgados
no artigo são de responsabilidade exclusiva de seu(s) autor(es).
Bióloga, mestra e doutora em Ecologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). É consultora do Center for Large Landscape Conservation como especialista em ecologia de infraestruturas lineares. Também atua como docente colaboradora do Programa de Pós-Graduação em Ecologia e pesquisadora do Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias (NERF), ambos da UFRGS.
