Por Kamila Bandeira
Bióloga com mestrado em Zoologia pelo Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). É doutoranda no mesmo programa, além de pesquisadora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Suas pesquisas estão focadas em Paleontologia de vertebrados
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O Brasil possui um rico registro de fósseis de vertebrados, mas existem alguns grupos que têm menos destaque do que outros nas grandes mídias. Entre eles, estão os procolofonídeos, vertebrados peculiares classificados num grupo chamado de Parareptilia, ou seja, uma linhagem “à parte” dentre os répteis que conhecemos. Uma das características mais notáveis entre os parartépteis é o crânio do tipo anápsido (crânio que não possui aberturas junto às têmporas, as chamadas fenestras temporais).
Os procolofonídeos eram animais pequenos (os maiores eram mais ou menos do tamanho de um gato doméstico!) e viveram entre o final do período Permiano, sobrevivendo até o final do período Triássico (entre 259 milhões e 100 mil anos até cerca de 201 milhões de anos atrás), muito antes dos primeiros dinossauros. Apesar de pequenos, eles atingiram uma distribuição global ao longo de todo o Triássico. Interessantemente, esses pequenos vertebrados apresentavam especializações que indicavam uma predominância de uma dieta insetívora durante o Permiano, mas durante o Triássico esses animais se tornaram majoritariamente herbívoros.
O Brasil não podia ser diferente quanto à presença dos procolofonídeos, com duas espécies descritas. Mas a estrela mais recente desse grupo é o Oryporan insolitus Pinheiro et al., 2021 (imagem no alto da página), publicado recentemente na revista Papers in Palaeontology. Essa nova espécie possui uma parte do crânio preservada e foi encontrada em rochas triássicas do Rio Grande do Sul, na unidade geológica chamada Formação Sanga do Cabral, sendo descrita por um time de paleontólogos da Universidade Federal do Pampa (Unipampa) e da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).
Uma das características mais interessantes desse animal são pequenas modificações nos dentes, indicando uma série de especializações para uma dieta herbívora. É um dos registros de procolofonídeos herbívoros mais antigos. Inclusive, a boa preservação dos dentes contribuiu para batizar esse vertebrado, já que seu nome significa “belo sorriso” na língua guarani. O Oryporan ajuda a entender como a dieta vegetariana foi fundamental na proliferação desses vertebrados durante o Triássico. A alteração na alimentação possivelmente foi um sinal de que precisavam se adaptar rapidamente a um mundo em mudança e ajudou esse grupo de pararrépteis a se diversificarem durante o Triássico Entretanto, ainda não se sabe o que levou à extinção dos procolofonídeos no final desse período. Quem sabe novas descobertas na Formação Sanga do Cabral não tragam respostas para esse enigma.
Para saber mais
– Pinheiro FL, Silva-Neves E, Da-Rosa AA. 2021. An early‐diverging procolophonid from the lowermost Triassic of South America and the origins of herbivory in Procolophonoidea. Papers in Palaeontology. doi:10.1002/spp2.1355.
– Da-Rosa AA. 2009. Vertebrados fósseis de Santa Maria e região, 480 p.
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