O relato de uma observadora de aves brasileira na Austrália

Desde sempre amei a biologia. Plantas e animais me fascinaram a vida inteira. Mas minha paixão pelas aves começou em 2008 em “contatos imediatos” com o Avistar, esse encontro incrível de pessoas que trocam tudo o que sabem entre sorrisos, histórias de vida, causos e muito conhecimento transformado em Ciência.

Sou uma observadora de aves privilegiada por estar sempre cercada de pessoas que conhecem as espécies da região explorada e, generosamente, “me ajudam a ver” um lifer, a identificar e a diferenciar espécies semelhantes. Um conforto, quase um comodismo.

Esse privilégio ficou mais do que evidente durante minha tão sonhada viagem para a Austrália, um país que tem animais incríveis e espécies de aves completamente desconhecidas por mim, recém-chegada, sem um Wiki Aves local e sem companhia para passarinhar.

Cacatuas, cucaburras e magpies, eu conhecia. Mas, sair da zona de conforto foi importante para descobrir que existem 14 espécies de cacatuas, duas de cucaburras e muitas aves próximas às magpies que nos confundem.

Guias e apps para observar aves

Meu primeiro movimento foi comprar um bom guia de aves, o The Australian Bird Guide, com 566 páginas. Portanto, continuei sem um guia de campo, mas passei a ter um compêndio muito didático construído de forma colaborativa que organizou aproximadas 850 espécies em 139 grupos de aves e suas respectivas distribuições geográficas.

Meu segundo movimento foi registrar tudo em fotos, gravações e desenhos, apelando para um caderno de estudos, coisa que não usava há anos, confesso. Usei o Merlin, sempre confirmando com o Bird Net – que se mostrou bem mais correto do que o Merlin.

Tracei comparações entre os ambientes por onde passarinhei, a diversidade vegetal dessas regiões e das espécies de aves presentes em cada uma. Voltei a pensar como observadora-bióloga sem “estar no automático”, relacionando biomas e espécies como faço quando estou no Brasil.

Foram 35 diferentes localidades em seis diferentes cidades base. Locais com diferentes ambientes, todos aparentemente menos diversos que os brasileiros pelo número de espécies. Mas com uma infinidade admirável de indivíduos da mesma espécie. Por exemplo, uma passarinhada rápida em um parque urbano de São Paulo permite a observação de entre 30 e 40 espécies, geralmente com poucos indivíduos de cada uma. Num parque urbano em Sydney, observei entre seis e oito espécies, com muitos indivíduos de cada uma.

Consegui identificar 86 espécies com a utilização de todos os recursos mencionados, deixando de fora outras 17 que, pela minha avaliação, seriam diferentes do que eu já havia observado.

Em Bruny Island, na Tasmânia, tive mais do que companhia para passarinhar. Além de uma amiga não passarinheira (agora “convertida”), tive a companhia de Marcio Conrado (Birdcheckbrasil), que atualmente mora naquele paraíso e habilmente nos guiou por diversas trilhas e pontos específicos de avistamento de algumas espécies endêmicas da ilha. Fiquei muito longe das 13 existentes, mas fascinada com o que vi e vivi.

Mais do que números de espécies avistadas, a experiência vivida em Bruny Island tornou evidente a importância de um/uma guia com conhecimento das espécies e dos pontos de observação, dos locais de alimentação e com dicas de deslocamento.

Recursos como Merlin ou BirdNet ajudaram, mas não garantiram nem de longe a identificação de espécies. O mapeamento preliminar dos locais de observação que existe o Wiki Aves foi um luxo do qual senti falta, bem como um guia de bolso.

Por último, mas não menos importante, vale registrar que não encontrei nenhuma mulher com binóculos ou máquina fotográfica em punho registrando a natureza ou aves especificamente. Apenas homens.

Tenho certeza de que acabei não registrando muitas espécies, o que garante a necessidade e o desejo de voltar. E isso é sempre muito bom. Mas, da próxima vez, com guias para acompanhar as passarinhadas.

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