O caminho dos animais silvestres após a apreensão

Hoje trago um assunto que considero um dos mais importantes no trato do combate aos crimes ambientais contra a fauna: a cadeia de custódia. Ou seja, todo o caminho que o animal percorre desde quando acontece sua apreensão até sua destinação final, que, em minha opinião, é ponto mais importante do trabalho por ser o momento em que o futuro da vida e o bem-estar do espécime é decidido.

As situações das apreensões que podem ser simples, como no caso de pequenos pássaros que são flagrados imediatamente após sua retirada da natureza e podem, naquele mesmo instante, retornarem para a vida livre. Entretanto, há diligências mais complexas, que envolvem um maior número de animais, com uma ou mais espécies, de porte médio ou grande, e que exigem enorme complexidade de transporte ou até mesmo sua impossibilidade, como no caso das 15 girafas trazidas da África para o Rio de Janeiro que, infelizmente, ainda se encontram no mesmo local do flagrante policial.

Os diversos procedimentos dentro do processo ainda são falhos, desde a logística de movimentação, passando pela capacitação dos servidores (principalmente dos policiais) e chegando ao momento da destinação inicial dos animais no primeiro estabelecimento recebedor, que vai fazer os primeiros cuidados nos animais resgatados.

Flagrantes com animais silvestres são os procedimentos mais trabalhosos que existem na polícia, pois não se restringem a simplesmente cuidar do preso e de um material apreendido sem vida, como cargas de drogas. Nesses casos, existe a necessidade primordial de cuidar ali de uma ou mais vidas, não sendo incomuns as apreensões de centenas de animais, o que obriga o envolvimento não só o órgão policial, mas também do órgão ambiental parceiro.

Considerando tudo isso, desejo chegar nos dois seguintes pontos: o primeiro é que o principal bem jurídico tutelado é a própria vida do animal e o segundo é que isso deve ser mais bem acompanhado até a conclusão de todo o processo criminal.

Não existe diferença do ponto de vista do animal se ele está em um cativeiro legal ou ilegal. Os atores envolvidos no processo devem ter essa sensibilidade, pois sem ela, vão continuar acontecendo os absurdos que tenho visto ao longo dos anos, como animais sendo destinados para prisões, sem laudos individualizados e com justificativas subjetivas – a da moda agora é o imprinting, que seria o animal que já estaria completamente “domesticado”, o que, supostamente, inviabilizaria sua reabilitação e reintrodução na natureza.

Essa justificativa tem como consequência o encaminhamento dos espécimes para criadouros comerciais amigos, que para mim, são verdadeiros campos de concentrações de animais. Eles são linhas de produção industrial em que a última coisa que é levada em consideração é a vida e o bem-estar do animal.

Minha experiência prática de visita e fiscalização de criadouros baliza minha opinião. Recentemente, tive uma conversa muito recentemente com a dona de um criadouro, em que ela mesma faz uma autocrítica e me disse que não pretende mais vender animais e que sua vivência a fez abrir os olhos e ver como, mesmo trabalhando de maneira legalizada, está apenas escravizando os animais. Nos emocionamos juntos por telefone, pois, em oportunidade passada, eu já havia dito isso para ela. Evoluímos juntos.

Finalizando, venho aqui tentar plantar essa semente e abrir a oportunidade para debater com todos os entes públicos para que façamos o esforço conjunto (órgãos policiais e ambientais, os Ministérios Públicos e os integrantes do Poder Judiciário) de exigir formalmente dentro dos processos informações sobre o destino final dos animais e os motivos objetivos da destinação.

Só assim vamos realmente levar bem-estar verdadeiro para os animais traficados, evitando a influência indevida dos donos de criadouros nos estabelecimentos de destinação de fauna.

Até a próxima.

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