Por Dimas Marques
Editor-chefe
dimasmarques@faunanews.com.br
Dois homens condenados a mais de 25 anos de prisão estavam
soltos e novamente foram surpreendidos pela polícia com animais ilegais.
O tráfico de fauna é um crime marcado pela impunidade no Brasil. A grande maioria dos infratores flagrados por policiais ou agentes de fiscalização ambiental com animais silvestres ilegais sequer fica presa, respondendo em liberdade pelo crime. Raras também são as condenações. Por isso a sentença de 11 anos de prisão, inicialmente em regime fechado, para o russo Kirill Sergeevich Kravchenko, que foi flagrado duas vezes este ano tentando sair do Brasil com espécimes da fauna nativa do país, chamou tanto a atenção.
Apesar de não serem a regra, condenações como a de Kirill têm acontecido também com cidadãos brasileiros. É o caso de 14 presos das operações Urutau e Sapajus, realizadas em 2018 e 2019 pela Polícia Federal, que foram condenados à prisão em maio deste ano por crimes ligados ao tráfico de macacos-prego (Sapajus apella), ararajubas (Guaruba guarouba), araras-canindé (Ara araruna), araras-vermelhas (Ara chloroptera), tucanos-toco (Ramphastos toco) e papagaios-verdadeiros (Amazona aestiva), além de pássaros e saguis.
O grupo foi considerado pela juíza federal Maria Isabel do Prado, da 5ª Vara Criminal de São Paulo, uma quadrilha atuante na captura e transporte de animais silvestres, na falsificação de notas fiscais e anilhas de identificação de aves e na venda ilegal, inclusive via internet e redes sociais, de espécimes da fauna brasileira. O grupo seria responsável por transportar, principalmente para a Região Metropolitana de São Paulo, cerca de 600 aves e cinco macacos por semana.
Entretanto, a condenação não significa punição imediata. Em alguns casos, a sentença da Justiça sequer consegue inibir o condenado de continuar se envolvendo em situações em que há o cometimento de crimes contra a fauna. José Arnaldo Ferreira de Souza, de 57 anos, e Laudson Nunes Galvão da Cunha, vulgo Alemão, de 37, por exemplo, dois dos 14 presos das operações Urutau e Sapajus que foram condenados a penas de 27 e 26 anos respectivamente, a serem cumpridos inicialmente em regime fechado de prisão, estavam soltos e recentemente foram novamente flagrados pela polícia com animais silvestres ilegais.
José Arnaldo e Laudosn estão condenados por crimes ligados ao tráfico de animais como associação criminosa, receptação qualificada, falsificação de documento particular, falsificação de selo ou sinal público, falsidade ideológica, crime de perigo a vida ou saúde de outra pessoa, maus-tratos a animais e por vender, expor à venda, exportar ou adquirir, guardar, ter em cativeiro ou depósito, utilizar ou transportar animais silvestres sem autorização do poder público.
José Arnaldo foi solto em outubro de 2019, um ano e sete meses antes do julgamento que o condenou, por meio de habeas corpus concedido pela Justiça. Já Laudson conseguiu liberdade em junho de 2020, onze meses antes de ser sentenciado à prisão, também por meio de um habeas corpus. Por conta disso e pelo fato de ter havido recurso para a Justiça revisar o caso envolvendo os 14 acusados, ambos permaneceram em liberdade.
Minas Gerais
Em 22 de outubro, o Fauna News comentou uma ação policial em Januária, no norte de Minas Gerais, que resultou na apreensão de 201 aves que estavam em viveiros e gaiolas no sítio de José Arnaldo. Uma equipe da PM Ambiental de Minas Gerais foi até a propriedade verificar uma denúncia sobre um possível carregamento de animais que estaria para ser enviado para Sete Lagoas (MG). Em viveiros e gaiolas, os policiais encontraram 150 papagaios-verdadeiros, 45 araras-canindé, cinco trinca-ferros e um sofrê.
Ao ser surpreendido com as aves, José Arnaldo alegou ter alugado a propriedade para uma mulher chamada Jéssica Mira Corrêa. Ele afirmou aos policiais militares que ela seria a pessoa responsável pelas aves e teria pedido para ele alimentá-las enquanto fazia uma viagem a São Paulo para venda dos animais. José Arnaldo e sua filha, menor de idade, foram levados para a delegacia da cidade, onde o caso foi registrado.
José Arnaldo foi autuado em flagrante por maus-tratos a animais, por manter animais silvestres em cativeiro sem autorização e por corrupção de menor. Quatro dias depois, após o pagamento de R$ 50 mil de fiança, ele foi solto. A filha do investigado, de 17 anos, iria responder em liberdade pelo ato infracional.
Além da condenação pela Justiça federal, José Arnaldo já foi autuado sete vezes com animais silvestres ilegais pelo Ibama desde 2006. Ele permanece solto.
Interior paulista
Em 7 de setembro, a PM Ambiental paulista prendeu, na altura do km 273 da rodovia SP-310 (Washington Luís), em Araraquara (SP), um casal transportando 118 aves e um quati. O carro em que estava, um Gol, teve sua placa reconhecida pelo sistema de monitoramento por radares como sendo de um veículo já utilizado em crimes ambientais.
No carro estavam o condenado Laudson e Jéssica, a mesma mulher apontada por José Arnaldo com a responsável pelas aves que estavam em sua propriedade. Eles transportavam de Goiás para a capital paulista 73 canários-da-terra, 18 araras-canindé, oito corrupiões, sete pássaros-pretos, seis tucanos-toco, cinco maracanãs, um papagaio-verdadeiro e um quati. Ambos foram autuados em flagrante na Delegacia Seccional de Araraquara. A Justiça decretou a prisão preventiva de Laudson, que está preso. Jéssica foi solta e responderá pelo crime em liberdade.
Laudson, além da condenação de 26 anos, já havia sido detido em 2019, pela Polícia Rodoviária Federal, ao ser surpreendido em Uruaçu (GO) transportando araras, papagaios e pássaros que estavam sendo levados do Pará para São Paulo.
O Fauna News tentou contato com José Arnaldo, Laudson e Jéssica, mas não obteve sucesso. O veículo tem interesse em publicar as versões dos envolvidos.