
A Amiga da SAVE Brasil Natália Allenspach é bióloga,
mestre em Ecologia e Recursos Naturais, especialista em Gestão
Ambiental e responsável por um blog bem legal: o A Passarinhóloga.
Por Natália Allenspach
observacaodeaves@faunanews.com.br
Chegou o final do ano, momento de nos despedirmos de um conturbado 2021 e, por que não recapitular tudo de bom que aconteceu desde janeiro? Só me dei conta de como o ano foi longo quando comecei a escrever esta retrospectiva. Já me desculpo por várias coisas que devem estar faltando nesta lista, pois certamente esqueci muitas iniciativas bacanas!
Novas espécies
No final de julho, o Comitê Brasileiro de Registros Ornitológicos (CBRO) lançou uma nova lista das aves do Brasil. A lista anterior (de 2015) apresentava 1.919 espécies. Com a descrição de novas espécies, desmembramentos taxonômicos (splits) e novos registros, a lista mais recente reconhece 1.971 espécies de aves que ocorrem no nosso país. Dessas, 293 espécies são endêmicas, ou seja, somente são encontradas no Brasil e em nenhum outro lugar.
Entre as novas espécies descritas, temos duas corujas do gênero Megascops (a corujinha-do-Alagoas e a corujinha-do-Xingu), um beija-flor (o asa-de-sabre-da-mata-seca), o surucuá-de-Murici e o caboclinho-do-Pantanal. Além da adição de muitas espécies, vários nomes científicos e nomes vernáculos em português sofreram alterações. O WikiAves, a maior fonte de consulta dos observadores de aves brasileiros, já realizou a migração para a nova lista do CBRO.

Descobertas recentes, como a descrição de uma nova ave da Amazônia (batizada bico-chato-críptico), possivelmente serão adicionadas na próxima lista das aves do Brasil.
Apps e recursos
Este ano, nosso já velho conhecido eBird passou por algumas atualizações e ganhou mais recursos. Adorei os novos Relatórios de Viagens, que permitem agregar várias listas de aves em um lugar só. Dá para criar um panorama completo de uma viagem mais longa ou mesmo de um dia mais intenso de passarinhadas, como costuma ser o Big Day.
Já o Merlin Bird ID, aquele app incrível que ajuda a identificar passarinhos a partir de fotos (utilizando inteligência artificial), agora também permite identificar aves pelo canto. O aplicativo BirdNet, lançado recentemente, segue a mesma linha. Em ambos, o recurso de identificação de sons ainda deixa bastante a desejar pois não cobre todas as espécies que ocorrem no Brasil, mas certamente é questão de tempo para que se tornem ferramentas fantásticas.
Livros e documentários
Dois importantes guias de campo foram lançados em 2021. O ano mal havia começado quando Fernando Jacobs e Paulo Fenalti surpreenderam todos com o completíssimo Guia de Identificação: Aves do Rio Grande do Sul, reunindo fotos e informações sobre as 711 espécies que fazem parte da avifauna gaúcha. Agora em dezembro foi a vez do Fredy Pallinger e do Willian Menq lançarem o aguardado Aves de Rapina do Brasil, que contém ilustrações digitais hiper-realistas e dados sobre as 70 espécies de aves de rapina diurnas que ocorrem em nosso país.
Entre as publicações digitais e gratuitas, destaco o lançamento do primeiro volume da série Aves do Brasil, de autoria do biólogo Mario Arthur Favretto. É um livro denso, fruto de um grande trabalho de levantamento bibliográfico. Também chegaram alguns guias de campo mais locais ou regionais, como o Aves do Campus “Luiz de Queiroz” e o lindo Manual para Observar Aves em Noronha. O Código de Ética do Observador de Aves, produzido pelo Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Aves Silvestres (Cemave) e o ICMBio, é leitura indispensável!
A websérie Cantos da Amazônia, cuja primeira temporada foi lançada em fevereiro, é simplesmente imperdível. Em cinco episódios, o ornitólogo Mario Cohn-Haft e o fotógrafo de natureza Marcos Amend nos apresentam as mais belas e curiosas aves que vivem na majestosa floresta amazônica e também algumas espécies mais urbanas, que convivem com os demais moradores de Manaus (AM). Quem ainda não assistiu não pode deixar de ver!
Jovens observadores
Muitas iniciativas buscam apresentar o universo das aves para crianças e jovens. Este ano, o pessoal da Wader Quest Brasil, Projeto Aves Limícolas e Instituto Relfe fez um trabalho muito legal em Peruíbe (SP). Olha que lindo ficou o guia Aves da Vila Erminda que eles criaram a partir de desenhos feitos pelas próprias crianças!

Em Bom Jesus dos Perdões (SP), o professor Sérgio Tück e a professora Natália Andrade incentivaram os alunos da EMEF Hélio Damante a descobrir as aves que vivem na cidade. No site do projeto Aves BJP dá para acompanhar todas as atividades dos alunos, que fotografaram, pintaram e se divertiram com um jogo de cartas chamado Ases, criado especialmente pelos professores.
Já a musicista e bióloga Raquel Aranha, diretora cultural do CAEB – Centro Ambiental Edoardo Bonetti, orquestrou uma linda cartilha para despertar o interesse das crianças por aves e música, num projeto chamado Choro Alado. O grande diferencial da cartilha é que cada ave aparece acompanhada por uma música, em arranjos especialmente interpretados pelo Quarteto Aguará de São José dos Campos e disponibilizados no YouTube.
Eventos
Em 8 de maio, tivemos o já tradicional Global Big Day, quando observadores de aves de todos os cantos do mundo se esforçaram para registrar o maior número de espécies possível em 24 horas. O evento é organizado desde 2015 pelo Laboratório de Ornitologia da Universidade de Cornell (EUA) e tem alcançado números recordes a cada edição. Este ano, mais de 51 mil observadores de 192 países participaram, o que resultou em 7.234 espécies de aves registradas (cerca de 70% das espécies existentes). O Brasil ficou em quarto lugar em número de espécies registradas (994), enquanto os EUA lideraram, como sempre, o ranking relativo ao número de listas submetidas (79.087).
Também em maio, tivemos a segunda edição do Avistar Conecta, versão online do maior evento de observação de aves do Brasil (que em 2022 deve voltar a acontecer presencialmente na capital paulista. Ilustres convidados falaram sobre como era a observação de aves antes do surgimento do WikiAves, sobre a origem do primeiro Clube de Observadores de Aves do Brasil (o COA-RS, atualmente denominado COA-POA) e outros temas, além de uma deliciosa sessão de Janelives mostrando comedouros em tempo real, espalhados por todo o país. O Avistar Conecta também manteve uma ampla programação de lives ao longo de todo o ano, que estão disponíveis no YouTube.
Em 9 de outubro, ocorreu a segunda edição do Big Day, chamada October Big Day. Ela ocorre em um momento mais propício para observar aves aqui no hemisfério sul: a primavera! Observadores de aves no Brasil registraram 1.096 espécies nessa data, alcançando a décima posição em número de listas submetidas (com 1.527).

Quem gosta de desenhar sabe que outubro é um mês muito especial. É quando acontece o desafio #Inktober e todo mundo é convidado a compartilhar suas ilustrações, diariamente, nas redes sociais. Pois este ano, a SAVE Brasil bolou um calendário com uma sugestão de ave para cada dia do mês, o que motivou muita gente a tirar a caixa de lápis de cor da gaveta e mostrar seu lado mais artístico. Mais de 60 pessoas participaram e você pode conferir o resultado na hashtag #inktobersave no Instagram.
Uma pequena amostra do #inktobersave 2021
Nesse mesmo mês também foi realizado o workshop on-line Colisões de Aves em Vidros: é possível evitar, organizado pelo COA-POA e pela SAVE Brasil. O evento reuniu pesquisadores, observadores, arquitetos e administradores em busca de soluções para esta que é a segunda maior causa de mortes de aves em todo o mundo.
O XXVII Congresso Brasileiro de Ornitologia, em sua primeiríssima versão on-line, aconteceu em agosto. Embora seja um evento mais voltado para acadêmicos, alguns cursos e palestras mostraram a crescente importância da participação de observadores de aves nas pesquisas. Dados coletados em plataformas colaborativas como o eBird e o WikiAves são hoje uma excelente fonte de informação, essencial para a realização de diversos estudos. Viva a ciência cidadã!
Agora no final do ano começamos, timidamente, a ver a volta dos eventos presenciais. O Ilhabela Bird Week e o 1º Festival de Aves Costeiras Litoral Paulista, em outubro, foram híbridos (presencial e on-line). Em novembro, aconteceu o 5º Festival da Araponga, em Santa Rosa de Lima (SC) e o 1º Avistando Sasaguá, que uniu três cidades paulistas (Santa Branca, Salesópolis e Guararema) para tratar de observação de aves e, claro, da ave mais famosa da região: o ameaçado bicudinho-do-brejo-paulista. Em dezembro, o II Festival das Aves Migratórias – Banco dos Cajuais agitou a pequena Icapuí (CE).

Enquanto isso, o movimento #VemPassarinhar já está retornando em muitas cidades Brasil afora. O #VemPassarinharSP, por exemplo, voltou com tudo agora no finalzinho do ano. Organizado pela SAVE Brasil em parceria com a Divisão de Fauna Silvestre da prefeitura de São Paulo, o evento reuniu mais de 40 observadores de aves lá no Parque Ibirapuera. Sabiás-laranjeiras, mergulhões-caçadores, papagaios-verdadeiros e até mesmo uma araponga fizeram a alegria dos participantes. Nada como fechar o ano com uma boa passarinhada, né?
Desejo a todos um ótimo 2022, com muitos passarinhos!
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Natália Allenspach faz parte dos Amigos da SAVE Brasil, uma rede de pessoas conectadas e engajadas pela conservação das aves na natureza. Você também pode fazer parte contribuindo anualmente com uma doação. Para isso, basta acessar savebrasil.colabore.org.
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