Por Ingridi Camboim Franceschi
Graduada em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), onde é mestranda, sendo integrante do Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias (NERF)
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Esta semana, eu quero contar um pouco sobre como eu cheguei aqui, como entrei na área de Ecologia de Estradas e porque eu sigo estudando isso.
Tudo começou ainda na graduação, quando eu consegui uma bolsa em um projeto de iniciação científica para monitorar mamíferos atropelados em três rodovias no estado do Rio Grande do Sul. Essas três estradas cruzam ou passam muito perto de uma Área de Proteção Ambiental, a APA do Banhado Grande, e, também próximo de uma unidade de conservação de proteção integral, o Refúgio de Vida Silvestre Banhado dos Pachecos.
Eu recém estava no quarto semestre da graduação e, para mim, era tudo novo. Não sabia que existia Ecologia de Estradas e muito menos que era possível monitorar as colisões de veículos com animais silvestres. E foi a partir desse monitoramento, que durou um ano com campanhas mensais, que comecei a me interessar pelo assunto e entender a importância do impacto das fatalidades nas rodovias nas populações e comunidades de mamíferos do entorno. Principalmente porque essas rodovias cruzam unidades de conservação que, supostamente, deveriam estar protegendo a fauna.
É estranho a existência de rodovias cruzando unidades de conservação. E não são poucos casos! Outro exemplo, além desses primeiros em que eu estive envolvida, é a estrada Rota do Sol (ERS 486), também no estado do Rio Grande do Sul, que corta duas unidades de conservação (a APA Rota do Sol e a Reserva Biológica Mata Paludosa), além de passar próximo da Estação Ecológica Estadual de Aratinga. Como pode uma área destinada a proteger a fauna silvestre e conservar o ambiente natural sofrer impactos diretos e indiretos causados pelas estradas sem medidas de mitigação já planejadas? Pior, como foi permitido a construção dessa rodovia cortando unidades de conservação? Será que não havia outra rota; será que realmente precisava dessa estrada?
Tudo me intrigava muito e eu ficava sem entender como isso pode acontecer: uma rodovia dentro de uma área de conservação. Enfim, esse projeto posteriormente se tornou meu trabalho de conclusão de curso, no qual exploramos quantos mamíferos estavam sendo atropelados e quais eram os trechos nas rodovias que os animais mais morriam.
Atualmente, eu curso mestrado e faço parte do Núcleo de Estudos em Rodovias e Ferrovias (NERF) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Por mais que o meu trabalho atual não envolva rodovias, eu continuei envolvida ao longo dos últimos dois anos com projetos de monitoramento de fatalidades de fauna silvestre em estradas. Dentre as áreas da Biologia, a Ecologia de Estradas é a que mais chama minha atenção, principalmente porque estuda os impactos diretos. Mas ainda assim, a maioria das pessoas seguem não entendendo a importância de monitorar e evitar as fatalidades envolvendo a fauna silvestre e esse é um dos meus desafios e das minhas motivações dentro da área.
Admito que antes de entrar nesse mundo da Ecologia de Estradas, não prestava atenção nas carcaças ao longo das rodovias ou achava que o problema era algo esporádico e não recorrente. Mas depois, ao monitorar as primeiras estradas na graduação, eu percebi o quão grande é o impacto – ainda que a nossa detecção seja imperfeita. Quando estudamos e buscamos entender quais e como os impactos afetam uma espécie ou uma comunidade, conseguimos planejar estratégias de conservação para o grupo alvo e amenizar os problemas. Sabemos que as rodovias seguem em expansão no Brasil e no mundo todo, sendo uma grande ameaça à biodiversidade, mas ainda assim as grandes agências e instituições de financiamento de projetos científicos não dão destaque a trabalhos com esse enfoque.
Para mim, estudos que procuram entender como as espécies respondem a diferentes impactos e como a gente pode propor formas de reduzir ou manejar esses fatores são inerentes. A minha motivação para seguir na Ecologia de Estradas é justamente entender como as espécies estão sendo impactadas, como elas interagem com o ambiente alterado por nós, humanos, e como podemos reduzir nosso próprio impacto, de forma que cause menos ou nenhum dano a outras formas de vida. É importante divulgar a pesquisa científica e sensibilizar outras pessoas sobre como podemos ser menos egoístas e de que também fazemos parte do ecossistema e do meio ambiente. E que esses impactos podem retornar de forma indireta, ou até direta, para nós mesmos.
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