Graduada Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Mestra e doutoranda no Programa de Pós Graduação em Ecologia da mesma universidade, onde atua no Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias (NERF). É integrante da Rede Brasileira de Especialistas em Ecologia de Transportes (REET Brasil)
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Maio Amarelo é um movimento internacional para a redução da mortalidade no trânsito e seu objetivo é colocar em pauta a segurança viária, dado aos altos índices de óbitos em acidentes. Nas rodovias, esse movimento é bem conhecido e todos os anos, desde 2010, diversas campanhas de conscientização são realizadas pelos departamentos de trânsito e concessionárias para destacar o problema de segurança. Eu o conheci recentemente e me surpreendi por ele também existir para as ferrovias, embora aparentemente seja menos comum – encontrei apenas em duas concessionárias (MRS e VLI).
Em geral, o foco desse programa são os humanos, não incluindo os animais, mesmo eles também sendo usuários das vias (segundo o próprio Código de Trânsito Brasileiro), visto que a rede viária está amplamente distribuída e acaba atravessando ambientes por eles habitados.
Nas ferrovias, por exemplo, as ações do movimento visam alertar sobre os cuidados necessários para as pessoas cruzarem a via, seja a pé ou de carro. Além disso, as empresas adotam algumas medidas de segurança, como o uso de placas de sinalização das passagens de níveis e mecanismos de sinais sonoros para avisar a aproximação do trem, também pensadas para os humanos. Concordo que a segurança humana é muito importante e que essas medidas são de extrema importância para evitar acidentes, mas os demais usuários também deveriam ser considerados.
Um trabalho de 2018 mostrou que os atropelamentos de animais acontecem quase três vezes mais que os atropelamentos de pessoas nas ferrovias. Nesse estudo foram apenas considerados apenas animais com impacto, que segundo o autor são os domésticos de grande porte que podem resultar em algum prejuízo à linha. Esses animais, em geral, são bovinos e equinos que estão em fazendas próximas às linhas férreas. A conscientização dos fazendeiros para manterem suas cercas e seus animais longe da via pode reduzir esses atropelamentos. Além de resultar em algum prejuízo, tanto para o proprietário do animal quanto para o trem, a ocorrência de fatalidades com esses bichos pode ser a porta de entrada para a fauna silvestre, aumentando a atração de carniceiros para consumo dos animais mortos e, assim, aumentando a possibilidade de colisão entre os trens e os silvestres.
A fauna silvestre pode não representar riscos de grandes prejuízos aos trens, mas ela pode ocasionar acidentes com os veículos de serviços, resultando, em alguns casos, no descarrilamento dos vagões.
Pensando no contexto do movimento Maio Amarelo, a fauna silvestre – que não representa risco de segurança ou prejuízo aos trens – provavelmente não está incluída nas campanhas ferroviárias. Porém, é importante que elas mencionem o impacto do atropelamento de animais silvestres nas ferrovias para que as pessoas tenham conhecimento do problema. A partir dessas ações, nasce a preocupação com o impacto para todos os animais – incluindo os silvestres de médio e pequeno porte, que representam menos prejuízo ainda às ferrovias, mas são tão importantes quanto os animais maiores para a conservação da biodiversidade.
A malha ferroviária é menos visível que a rodoviária, o que possivelmente resulta em menor conhecimento sobre o problema das fatalidades de fauna, o que não significa que o impacto das ferrovias nos animais é menor. Dessa forma, a conscientização do público é extremamente necessária e pode resultar em maior cobrança às concessionárias de ferrovias para a adoção de medidas que reduzam o atropelamento dos animais silvestres. Diferente de nós, a fauna silvestre não consegue saber pelas placas de sinalização quando e onde cruzar os trilhos e precisa da nossa ajuda para se manter segura.
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