Por Elisângela de Albuquerque Sobreira
Pós-doutoranda em Epidemiologia Experimental Aplicada às Zoonoses na Universidade de São Paulo (USP). Mestra em Ecologia e Evolução e doutora em Animais Selvagens pela Universidade Estadual Paulista. Coordenadora de Fauna da Prefeitura de Anápolis (GO). presidente da Comissão de Animais Selvagens e Meio Ambiente do Conselho Regional de Medicina Veterinária de Goiás e docente na UniGoyazes.
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A importância das infecções fúngicas em humanos e animais aumentou nas últimas décadas. Os fungos mucor são extremamente comuns, sendo encontrados na terra ou em alimentos estragados. Em indivíduos com a imunologia debilitada, porém, causam mucormicose, resultando em cirurgias mutiladoras ou até em morte.
A mucormicose ou zigomicose é uma infecção oportunista causada por fungos na ordem Mucorales. Foram veiculadas na imprensa pacientes de Covid-19, na Índia, diagnosticados com a mucormicose. Muitas vezes são casos fatais, pois se propaga pelo corpo, destruindo pele, músculos, ossos e órgãos.
Os fungos atacam sobretudo as superfícies corporais, não só a pele externa, mas também as internas que entrem em contato com o ar. Aspirados, seus esporos se instalam nos sinos nasais, indo daí para as vias pulmonares mais profundas ou, se atravessam as mucosas, até os ossos.
É importante tratar uma mucormicose o mais cedo possível, caso contrário ela só será detida mediante intervenção cirúrgica. Os primeiros sintomas são pouco específicos, como olhos e nariz avermelhados. Com o progresso da infecção, podem aparecer muco negro ou sangrento, febre e dificuldade respiratória. A partir daí, o “fungo preto” dissemina pelos ossos adentro, seguindo a anatomia, até às órbitas oculares, os músculos e os nervos. Nos piores casos, os cirurgiões têm que extrair todo o olho e parte do rosto a fim de eliminar os tecidos atingidos e salvar a vida do paciente.
Em pacientes com Covid-19, os esteróides acabam reduzindo a imunidade e aumentando os níveis de açúcar no sangue. Os médicos indianos acreditam que essa queda na imunidade possa estar desencadeando esses casos de mucormicose.
Os pacientes humanos geralmente apresentam sintomas de nariz entupido e sangramento; inchaço e dor nos olhos; pálpebras caídas; visão turva e, finalmente, perda de visão. Pode haver manchas pretas na pele ao redor do nariz.
Os fungos são causadores relativamente incomuns de doenças em humanos e animais saudáveis e imunocompetentes, embora os hospedeiros estejam constantemente expostos a propágulos infecciosos. No entanto, um número crescente de doenças fúngicas recalcitrantes (resistentes) em animais e humanos tem ocorrido nas últimas duas décadas, originadas de fungos oportunistas e patogênicos.
O habitat natural para os Mucorales é o solo e eles são normalmente isolados de matéria orgânica em decomposição. Os fungos também são freqüentemente encontrados no ar interno e externo, em alimentos e na poeira. Mucormicose em animais (domesticados e selvagens, e em mamíferos e não mamíferos) e humanos são semelhantes no que diz respeito à epidemiologia, porta de entrada , localização e formação de lesões.
Os membros patogênicos oportunistas dos Mucorales são onipresentes no ambiente domesticado de animais e em habitat internos, mas a infecção quase invariavelmente é estabelecida apenas quando o equilíbrio normal entre o animal e o agente é perturbado. Em linha com outras infecções fúngicas oportunistas em animais, como candidíase e aspergilose, fatores predisponentes não estão relacionados à espécie animal, mas ao animal infectado por si só. Fatores predisponentes gerais que favorecem a mucormicose em pessoas também se aplicam a animais não humanos, ou seja, infecções são vistas em hospedeiros imunocomprometidos ou de outra forma debilitado devido a distúrbios metabólicos. No entanto, a exposição excessiva a fungos mucoraleanos ou distúrbio da microbiota bacteriana no estômago anterior pode causar infecção em animais saudáveis.
Existem poucos relatos sobre a ocorrência de mucormicose em diferentes tipos de espécies de aves. Especialmente os órgãos respiratórios e o trato gastrointestinal estão frequentemente envolvidos. Casos em animais selvagens vivos foram descritos, por exemplo, em golfinhos, bisões e focas.
Estudos realizados por Barnett e colaboradores (2011) em uma foca macho de quatro anos em cativeiro (Cystophora cristata), previamente diagnosticada como hipotireoidiana, mostrou que o animal morreu após um período de três semanas de letargia e inapetência, apesar do tratamento que incluía administração intramuscular de antibióticos e multivitaminas. Acredita-se que este seja o primeiro relato de mucormicose sistêmica em um pinípede, provavelmente originado de uma reação no local da injeção.
A confirmação do diagnóstico normalmente é feita por meio de cultura e pela observação do agente em exames histopatológicos, no material oriundo da lesão. Exames de imagem, como a tomografia computadorizada e, em especial, a ressonância magnética, são de grande utilidade no diagnóstico da mucormicose rinocerebral pulmonar e disseminada.
Para obtenção de sucesso no tratamento da mucormicose, se faz necessária a associação de diferentes terapias, sendo que o diagnóstico precoce, o imediato início do uso de antifúngicos, a correção do distúrbio metabólico ou a reversão da neutropenia são de extrema importância para o sucesso do tratamento.
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