Por Marcelo Calazans
Técnico em agropecuária, administrador de empresas e fotógrafo. Foi professor da disciplina Fotografia de Natureza pelo Senac (MS)
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Olá! Espero que esteja tudo bem com você.
No último artigo publicado aqui na coluna, comentei sobre a fotografia de jacarés na cidade, com curiosidades sobre a espécie e dicas técnicas de captura de imagens. No material de hoje, continuarei com a temática de fotografia de vida selvagem dentro da cidade, especificamente sobre macacos-prego.
Os macacos-prego pertencem ao grupo de primatas do Novo Mundo, ocorrendo geograficamente em quase toda a América do Sul. No Brasil, pode ser encontrado em diversas regiões, mas sua maior incidência é na floresta Amazônica e Mata Atlântica. Entretanto, pode ser encontrado no Pantanal, na Caatinga e no Cerrado. Essa ampliação das regiões de ocorrência deve-se provavelmente à perda e a fragmentação de seu habitat natural. A sua maior tolerância em buscar novos habitat tem permitido a população sobreviver, apesar do número de indivíduos ter diminuído. Além disso, sofrem comumente com o tráfico de animais, atropelamentos e caça. A classificação científica no Brasil conta com 97 espécies conhecidas, sendo a Sapajus apella (Linnaeus, 1758) a mais popular.
Os macacos-prego são animais onívoros (se alimentam de insetos, frutas e ovos) de hábitos diurnos, podendo ser vistos comendo pequenos invertebrados como caranguejos, e até lagartos e mamíferos – característica comportamental exclusiva dos macacos no Novo Mundo. Além disso, possuem uma adaptação na alimentação para ingestão de substâncias rígidas como nozes e demais sementes. Seu grupo social consiste entre cinco a 20 indivíduos, havendo registros de grupos de até 40, geralmente com um macho dominante e até cinco fêmeas em fase reprodutiva. Seus predadores mais comuns são aves de rapina como as harpias, grandes cobras e felinos. Quando notam a presença de predadores, podem se associar a outros grupos de animais e trabalham cooperativamente para evitar e/ou afugentar o predador.
O gênero Sapajus compreende os indivíduos reconhecidos por sua inteligência e habilidade em criar ferramentas para atingir seus objetivos, como abrir alimentos mais rígidos. Devido à perspicácia, são comumente utilizados em pesquisas laboratoriais, o que é uma pena. O deslocamento desses animais consiste em utilizar as quatro patas, mas podem ser vistos andando sustentados apenas pelas patas traseiras. São animais arborícolas que utilizam a cauda semi-preênsil para se deslocar entre os galhos. Descem ao solo apenas em épocas de alimento escasso.
O comportamento sexual possui um repertório entre a corte e o acasalamento, com a fêmea atraindo o macho pela vocalização e por movimentos faciais. O cio da fêmea dura cinco/seis dias e a gestação cerca de 155 dias (uns cinco meses). As fêmeas seguem o macho para o acasalamento por até quatro dias e dão preferência aos machos com maior hierarquia no grupo. Quando há escassez de alimentos, pode haver espaçamentos maiores entre um cio e outro, mas o ciclo estral (período entre cios) é de 18 dias. O nome macaco-prego refere-se ao formato do pênis do animal, que quando ereto apresenta formato similar a um prego. Outros autores fazem associação à pelagem no topo da cabeça, que nos machos é mais concentrado e escuro que nas fêmeas, lembrando o formato de um prego.
Uma outra característica desses primatas é a curiosidade, o que favorece os fotógrafos de natureza pela aproximação maior e mais facilidade de obtenção de registros incríveis desses camaradinhas. E é graças a essa particularidade que consegui os registros que comento a seguir. Essas fotos são muito especiais pelas risadas que arrancaram de mim e pelo fato de me fazerem pensar se realmente somos a única espécie inteligente nesse planeta. Todas elas foram feitas em uma área de mata dentro da cidade de Campo Grande (MS) com abundância de alimentos para a espécie.
Nessa primeira captura, quis destacar o quanto essa espécie se “camufla” em seu habitat. Perceba o contraste dos pelos desse macho-alfa e a coloração do tronco da árvore. São idênticas! Se não fosse pelo fato de ele estar se fazendo notar, estaria invisível a olhares destreinados. Configuração básica foi utilizada para esse registro, sendo f/5.6, 1/400 s, ISO 100 e distância focal de 300 mm. Esse aqui comia alguns maracujás-do-mato no momento da foto. O silêncio ao se mover é preponderante para a aproximação ideal, pois mesmo sendo curiosos, se pegos de surpresa, se dispersam com rapidez. Deixe-se ser notado pelos animais, que se acostumam com sua presença. Assim eles sentirão confiança e agirão naturalmente, garantindo muitos registros bacanas.
Vamos à análise da segunda imagem.
Aqui temos o registro de um filhote, demonstrando claramente a curiosidade que a espécie tem à aproximação de humanos – no caso um bem-intencionado sempre. Esse cidadão estava tranquilamente pulando de galho em galho, acompanhando seu bando. E eu parado a curta distância, só cuidando seus movimentos. Quando percebeu minha presença, parou e ficou me encarando. A dificuldade aqui se deu pelo fato de o camaradinha aí estar na contraluz, fazendo com que a configuração de equipamentos fosse certeira para garantir o registro sem perda de definição ou surgimento de aberrações cromáticas e outros “defeitos” na imagem.
A receitinha usada para a captura foi a seguinte: f/5.6 para garantir claridade (é o que a lente me permite), ISO 1000, 1/200 s de exposição e distância focal de 200 mm (estava bem perto mesmo). E eternizei meu amiguinho!
Agora a terceira e última imagem. Vamos lá!
Essa foto me fez refletir se realmente a espécie humana é a única inteligente no planeta. Eu parei de frente para esse cidadão, que tranquilamente estava observando o meio à sua volta. Quando me viu, preparei a câmera e apontei em sua direção. Fiz o clique, mas a troca de olhares continuou, por longos momentos. Como se uma conexão tivesse sido estabelecida entre “parentes” próximos. Fiquei imaginando o que se passava em sua cabeça nesse instante, no que pensava e sentia. E creio que ele se fez um monte de perguntas parecidas a meu respeito. Foi uma sensação incrível que senti nesse momento e jamais o esquecerei. Algo que tocou minha alma.
Quanto aos detalhes técnicos da captura, foram os seguintes: abertura de f/6.3, exposição de 1/200 s, ISO 640 e distância focal de 500 mm. Realmente, os macacos-prego são uma espécie incrível de se observar e registrar e o aprendizado que tenho com eles não tem preço!
Espero que tenha gostado do artigo e nos vemos mês que vem.
Um abraço e até lá!
Referências
– Alves, S. L.; Buss, G.; Ravetta, A. L.; Messias, M. R.; Carvalho, A. S. 2015. Avaliação do Risco de Extinção de Sapajus apella (Linnaeus, 1758) no Brasil. Processo de avaliação do risco de extinção da fauna brasileira. ICMBio.
– Freese, C.H.; Oppenheimer, J.R. (1981). «The Capuchin Monkeys, Genus Cebus». In: Coimbra-Filho, A.F.; Mittermeier, R.A. Ecology and Behavior of Neotropical Primates – Volume 1. Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Ciências. pp. 331–391.
– Kasecker, T.P. 2006. Efeito da estrutura do hábitat sobre a riqueza e composição de comunidades de primatas da RDS Piagaçu-Purus, Amazônia Central, Brasil. Dissertação (Mestrado em Biologia Tropical e Recursos Naturais). Universidade Federal do Amazonas. 94p.
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