Nascido em São Paulo (SP), formado em Ciências Biológicas pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) e fotógrafo de vida selvagem desde 2017. Ministrou durante dois anos o curso de Fotografia de Vida Selvagem para Iniciantes através de um projeto de extensão do Ministério da Educação. Tem experiência com pesquisas na área de ornitologia, ecologia e comportamento animal, além de divulgação científica.
Em um dos meus primeiros artigos para a Photo Animal, trouxe uma discussão sobre como a fotografia pode ajudar na educação ambiental. Hoje, gostaria de expandir um pouco mais esse assunto abordando um novo braço dessa área, o qual venho descobrindo e explorando cada vez mais nos últimos anos: a fotografia de conservação.
Mas, antes de começar a falar do assunto, vamos relembrar rapidinho a importância da educação ambiental e sua relação com a conservação. E para isso, creio que não há quase ninguém melhor do que Sir David Attenborough para resumi-la em uma simples, porém reflexiva fala:
Se as crianças crescerem sem conhecer e apreciar a natureza, elas não vão entendê-la. E se elas não a entenderem, elas não irão protegê-la. E se elas não a protegerem, quem irá?”.
A fotografia de conservação tem como principal objetivo transmitir mensagens impactantes e provocadoras sobre um determinado animal ou ambiente através da imagem, com a finalidade de atrair a atenção do público e convertê-la em ações benéficas à conservação da(s) espécie(s) e/ou bioma(s) alvo.
Sucintamente, a fotografia de conservação se destaca da “simples” fotografia de vida selvagem por mostrar algo a mais do que apenas uma linda foto de um animal (sem tirar o mérito e o valor desse tipo de registro). Ela inclui elementos e narrativas que contextualizam e problematizam a situação que o fotógrafo deseja evidenciar.
Para executar isso com sucesso, a fotografia de conservação se apoia fortemente no conceito de storytelling. De forma curta, ele consiste na sua própria tradução do inglês: contar histórias que cativam o público de uma forma criativa, ao mesmo tempo em que elas apresentam uma ideia que deve ser pensada e discutida pelo leitor (ou, nesse caso, pelo espectador). Existem diversas técnicas de storytelling e boa parte delas pode ser explorada para valorizar os registros de animais.
A fotografia de conservação sempre existiu de certa forma, mas um tanto por debaixo dos panos. Nos anos 1860, por exemplo, as fotos de paisagens do americano Carleton Watkins influenciaram o governo dos EUA a estabelecer o Parque Nacional de Yosemite, região que passou a ter uma proteção maior através da nova regulamentação. Foi somente em 2005, com a criação da Liga Internacional de Fotógrafos de Conservação (iLCP, na sigla em inglês), que a fotógrafa mexicana Cristina Mittermeier “batizou” e oficializou essa vertente da fotografia de natureza para expor e combater urgências ambientais.
Uma das principais estratégias dos fotógrafos conservacionistas é trabalhar com a exposição direta dos fatos. Afinal, é difícil explicar algo melhor do que uma imagem clara, objetiva e bem pensada é capaz. Porém, como estamos vivendo em uma realidade em que a desinformação e o negacionismo reinam, até isso pode se mostrar desafiador em alguns casos. Essa exibição dos fatos pode ser feita de diversas maneiras, mas as mais comuns são através de cenas explícitas e autoexplicativas (muitas vezes tristes e até violentas) e de formas mais sutis e subjetivas, nas quais é preciso ter alguma quantidade de conhecimento prévio sobre o assunto da fotografia ou ao menos uma contextualização sobre a espécie e/ou o problema em evidência.
Entretanto, a fotografia de conservação não se resume apenas em mostrar o lado ruim do que acontece no meio ambiente. Ela também é um dos principais canais utilizados para divulgar impactos positivos e provar que ainda há esperança para a vida selvagem. Documentar o trabalho de projetos de conservação (e das pessoas envolvidas) é uma ótima forma de contar ao público o que deveríamos estar fazendo para proteger a natureza, além de deixar registrados os resultados como forma de valorização desse tipo de esforço.
As emblemáticas fotos de soltura de animais ilustram bem isso, por exemplo. Além disso, registros que mostram uma espécie ameaçada vivendo de forma saudável em seu hábitat natural são perfeitos para nos lembrar de como a vida dela deveria ser no cotidiano, incentivando a tomada de atitudes para que isso se torne uma realidade.
Também é possível atingir um meio-termo entre o negativo e o positivo, criando uma certa dualidade na narrativa. Tivemos diversos exemplos recentes disso durante as enormes queimadas dos últimos anos, em diferentes biomas do país. Em meio às cenas arrasadoras de morte e destruição da natureza, vários fotógrafos tentaram transmitir um pouco de otimismo, dando protagonismo aos inúmeros profissionais que arriscaram suas vidas para conter o fogo e resgatar animais (além dos próprios bichos sobreviventes). Escrevendo isso, lembrei da exposição Água Pantanal Fogo, que usou esse tipo de contraste como estrutura, mostrando a riqueza de um Pantanal conservado (com as fotos do Luciano Candisani) e como ela estava sendo devastada pelos incêndios (com as fotos do Lalo de Almeida).
A produção dos fotógrafos de conservação também costuma se utilizar de duas estratégias principais. A primeira é capturar uma única foto (geralmente pré-visualizada), que carregue um significado relevante e que seja capaz de transmitir uma mensagem clara e poderosa por si só ao espectador. Já a segunda consiste na exibição de uma série de imagens, permitindo a abordagem de vários temas que enriqueçam a narrativa que o artista quer contar (a biologia e o comportamento da espécie, os problemas que ela enfrenta, sua relação com as pessoas, os esforços de conservação, etc.).
Agora que já estamos familiarizados com o conceito, vamos conhecer um pouco dos personagens que se dedicam à essa empreitada. Entretanto, definir quem é ou não um fotógrafo de conservação pode ser um pouco subjetivo. Por isso, vou citar somente alguns que façam parte da iLCP.
Começando pelos brasileiros, temos três grandes representantes na Liga. O primeiro a fazer parte dela foi o próprio Luciano Candisani, que hoje já é considerado um Senior Fellow (parceiro sênior) da organização. Em 2022, João Marcos Rosa também foi escolhido para compor o time de fotógrafos e cinegrafistas. Ainda no mesmo ano, Fernando Faciole se tornou o terceiro e mais jovem brasileiro a compor a iLCP. Ele me concedeu uma entrevista interessantíssima sobre sua carreira e uma de suas fotos premiadas aqui na coluna – vale a pena dar uma conferida.
Além da fundadora Cristina Mittermeier, o grupo conta com mais de 150 grandes nomes da fotografia internacional no seu elenco, entre eles:
Comecei o texto com uma frase do Sir David e gostaria de terminá-lo da mesma forma:
Salvar o planeta é, agora, um desafio de comunicação. Já sabemos o que deve ser feito, só precisamos ter vontade”.
E é verdade. Anualmente, cientistas do mundo todo realizam novas descobertas e nos alertam sobre o que deve ser revisto, mas infelizmente é muito difícil fazer com que a mensagem chegue com clareza para 100% das pessoas. Porém, é aí que a fotografia pode mostrar seu valor, sendo uma das alternativas mais acessíveis, envolventes e eficazes para comunicar informações de forma rápida e objetiva.
Considerando a direção que o nosso planeta está seguindo em relação às questões ambientais, nos resta torcer, apoiar e se esforçar para que a conservação da biodiversidade seja um tema cada vez mais recorrente e valorizado na sociedade. Muito obrigado pela companhia e até a próxima!
Observação: as opiniões, informações e dados divulgados
no artigo são de responsabilidade exclusiva de seu(s) autor(es).
Nascido em São Paulo (SP), formado em Ciências Biológicas pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) e fotógrafo de vida selvagem desde 2017. Ministrou durante dois anos o curso de Fotografia de Vida Selvagem para Iniciantes através de um projeto de extensão do Ministério da Educação. Tem experiência com pesquisas na área de ornitologia, ecologia e comportamento […]
