Fotografando o muriqui-do-sul

Espécie de primata é considerada a maior das Américas. Veja as dicas para conseguir fotografar esses animais.

Fábio Fernandes Teixeira

Nascido em São Paulo (SP), formando em Ciências Biológicas pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) e fotógrafo de vida selvagem desde 2017. Ministrou durante dois anos o curso de Fotografia de Vida Selvagem para Iniciantes através de um projeto de extensão do Ministério da Educação. Tem experiência com pesquisas na área de ornitologia, ecologia e comportamento animal e também divulgação científica.
Atualmente realiza iniciação científica no campus da Unesp de Rio Claro, em que utiliza a fotografia para ajudar a identificar indivíduos de duas espécies de sabiás e monitorar os padrões de migração de uma delas.

17 de janeiro de 2025

FAUNA NEWS Fotografando o muriqui-do-sul

Olá, espero que você tenha tido um ótimo começo de ano! Neste artigo, vou abordar um pouco sobre uma espécie que tive o prazer de conhecer e fotografar na semana passada: o muriqui-do-sul (Brachyteles arachnoides)!

Também conhecido como mono-carvoeiro (por conta da coloração preta de suas mãos, pés e face), o muriqui-do-sul pode atingir até 1,60 metro de comprimento e pesar 15 quilos, ocupando o posto de maior primata (não humano) das Américas. Sua pelagem é inteira bege/amarelada, sendo gradualmente escurecida com o passar da vida.

Seus membros são finos e bem compridos e, juntamente com sua cauda extremamente forte e preênsil, permitem que ele se locomova com agilidade através das copas das árvores. Por incrível que pareça, esse animal perdeu o polegar ao longo de sua história evolutiva (seu “primo”, o muriqui-do-norte, ainda apresenta um polegar vestigial e não funcional), algo bem incomum para os primatas no geral.

Sua alimentação consiste principalmente em uma grande variedade de frutos, folhas e flores de espécies nativas da Mata Atlântica. Esses macacos são importantes dispersores de sementes e restauradores dessa floresta.

O mono-carvoeiro está classificado como “criticamente ameaçado” na Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês). Suas populações estão muito fragmentadas e previstas para continuarem diminuindo nos próximos anos (dados avaliados em 2019). Infelizmente, é uma das espécies brasileiras mais ameaçadas de extinção por conta da destruição de seu hábitat e da caça ilegal.

Localização

O muriqui-do-sul é endêmico da Mata Atlântica (ou seja, só pode ser encontrado nesse bioma), onde passa basicamente todas as horas da sua vida transitando entre árvores altas da floresta. Atualmente, pode ocorrer somente em três Estados da região sudeste (São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais) e no Paraná.

Por ser uma espécie criticamente ameaçada, encontrar um desses primatas por acaso na natureza é praticamente impossível. Portanto, a melhor escolha é procurar por locais conhecidos por abrigar populações e grupos de muriquis.

O Parque Estadual Carlos Botelho (PECB), em São Miguel Arcanjo (SP), por exemplo, é uma das melhores opções. Além de contar com um número considerável de indivíduos residentes, o parque oferece um roteiro de observação guiada que basicamente garante o avistamento dos animais. Fiz e recomendo bastante! Todas as fotos deste artigo foram tiradas ao longo de cinco horas acompanhando os bichos no PECB. Outra alternativa é o Parque Estadual do Desengano (no norte do Rio de Janeiro), que também tem registrada uma pequena população de muriquis-do-sul.

Equipamentos

Por conta da altura em que os muriquis se encontram nas árvores, a distância será um fator determinante na escolha do equipamento. Para resolver esse problema, a boa e velha lente teleobjetiva será indispensável para fotografá-los.

Caso tenha interesse em realizar o acompanhamento de um grupo no PECB, esteja preparado para enfrentar a verdadeira Mata Atlântica. Durante o tempo de observação, você seguirá os primatas mata adentro, então não espere um “tapete vermelho” de trilhas abertas pelo caminho. Botas, perneiras, camisas de mangas compridas, bandanas/lenços são itens essenciais para proteger você da vegetação e de animais que possam oferecer algum perigo (mosquitos, carrapatos, serpentes, etc.). Levar uma bateria extra pode ser útil também para acompanhamentos mais longos.

Técnicas

Apesar de ser um animal esperto e ágil, o muriqui-do-sul é surpreendentemente tranquilo durante a maioria do tempo. Ele passa o dia forrageando de forma lenta e parando ocasionalmente para tomar sol e descansar. Além disso, não mostra qualquer sinal de agressividade a humanos e outros membros do grupo (nem mesmo entre os machos). Toda essa pacificidade o concedeu um apelido engraçado: “macaco hippie”. Por conta desse tipo de comportamento, não é necessário utilizar velocidades muito altas do obturador. Uma boa notícia, já que, na mata fechada, a entrada de luz na câmera é uma prioridade.

Animais habituados a permanecer nas copas das árvores costumam oferecer um problema para os fotógrafos de vida selvagem: o ângulo da foto. Imagens de espéciemes tiradas muito de baixo para cima não costumam ser tão harmoniosas, principalmente em relação àquelas tiradas ao nível dos olhos do bicho. Para tentar um melhor nivelamento entre você e os muriquis, se afaste um pouco das árvores em que eles estejam e procure ao redor por relevos um pouco mais altos que você consiga subir.

Dicas extras

Os monos-carvoeiros normalmente acordam com o nascer do sol e passam o dia se alimentando em árvores frutíferas nativas da Mata Atlântica (vale a pena dar uma olhada nessas espécies da flora para saber onde procurar e/ou esperar). Por volta do meio-dia, os grupos costumam descansar um pouco para evitar o calor e se preparar para o forrageamento da tarde. Ao cair da noite, eles se retiram em alguma árvore alta e lá permanecem dormindo até a manhã seguinte.

O inverno pode ser uma estação interessante de fotografá-los. Apesar de acordarem um pouco mais tarde, os muriquis apresentam um comportamento mais letárgico (“preguiçoso”), se locomovendo bem menos e comendo mais folhas do que frutos. Além disso, durante esse período a vegetação da floresta se encontra menos volumosa, facilitando um pouco a linha de visão entre a câmera e o animal.

Durante suas vidas, esses primatas quase nunca deixam a segurança das alturas e descem ao chão. Toda a água que o organismo deles necessita é adquirida através da dieta rica em frutos. Curiosamente, já foram observados muriquis descendo das árvores para comer um pouco de terra, com a finalidade de repor sais minerais. Portanto, o contraluz é algo que deve ser enfrentado e controlado para agregar, e não degradar, suas imagens.

Ao mesmo tempo que a situação atual do muriqui-do-sul é bem triste (considerando seu estado de conservação), ter iniciado o ano passando algumas horas com esse animal e o fotografando em seu hábitat natural foi uma excelente experiência, que manteve acesa uma chaminha bem fraca de esperança para essa espécie.

Antes de encerrar o texto, gostaria de deixar um agradecimento especial ao Michel Rodrigues, guia do PECB que trabalha diariamente com muriquis há muitos anos e que me levou até os bichos com o melhor humor possível. Muitas das informações lidas aqui – aquelas que você não vai encontrar em nenhum livro ou artigo científico – foram ensinadas por ele.

Muito obrigado pela leitura e que tenhamos um ótimo 2025, recheado de fotografias incríveis de vida selvagem!

Observação: as opiniões, informações e dados divulgados
no artigo são de responsabilidade exclusiva de seu(s) autor(es).

Sobre o autor / Fábio Fernandes Teixeira

Nascido em São Paulo (SP), formando em Ciências Biológicas pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) e fotógrafo de vida selvagem desde 2017. Ministrou durante dois anos o curso de Fotografia de Vida Selvagem para Iniciantes através de um projeto de extensão do Ministério da Educação. Tem experiência com pesquisas na área de ornitologia, ecologia e comportamento […]