Análise de Dimas Marques
Editor-chefe
dimasmarques@faunanews.com.br
“A equipe gestora da Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Rio Negro – unidade de conservação estadual gerenciada pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Sema) – realizou o resgate de um filhote de ariranha, na comunidade Santo Antônio, na tarde de terça-feira (5 de outubro). Segundo moradores, o animal seria utilizado para atividades turísticas.
Técnicos da Sema estavam em atividade na RDS quando ouviram o som da ariranha. De acordo com informações coletadas no local, o animal foi adquirido por um grupo de comunitários por cerca de R$ 200, para ser usado como atração turística, de forma ilegal.
O animal foi identificado com a ajuda da pesquisadora do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), Dayse Ferreira, bióloga e mestre em Biodiversidade Tropical, que estava com a equipe de gestão da UC na ocasião.
Sob orientação da doutora Vera Maria Ferreira, coordenadora do Projeto de Mamíferos Aquáticos da Amazônia, do Inpa, o filhote foi encaminhado para o instituto, onde foi alimentado e recebeu os cuidados necessários.
“O animal ficará nas dependências do Inpa e passará por cuidados. Fomos informados que esta espécie de animal, por viver em bandos de forma bem sociável, pode não se adaptar sozinho. Dessa forma fica difícil a sua reintegração ao meio ambiente”, afirmou Francisca Pimentel, técnica de conservação ambiental da Sema.” – trecho do texto da matéria “Filhote de ariranha é resgatado de turismo ilegal na RDS Rio Negro”, publicada pela Agência Amazonas, do governo do Estado, em 6 de outubro de 2021
De acordo com Vera, que também escreve sobre mamíferos de água doce para a coluna Aquáticos do Fauna News, a ariranha apreendida é um macho com, no máximo, três meses de vida. Ele ainda toma leite, já come pequenos pedaços de peixe e está acostumado com humanos. “Segundo relato do pessoal do resgate, o animal já estava cerca de duas semanas em cativeiro”, relatou a pesquisadora do Inpa. Assim que chegou ao Instituto, em Manaus, o filhote recebeu o nome de Ipixuna, que na língua tukuna significa “água preta”, já que ele vem do rio Negro.
Vera destacou que as ariranhas, por serem extremamente territoriais e viverem em grupos familiares, são difíceis de serem reintroduzidas na natureza e não existem estudos que comprovem o sucesso desse tipo de ação.
O Inpa abriga também outras duas ariranhas: a Newee, uma fêmea de quase 20 anos que chegou no Instituto ainda filhote, e o Cuieiras, um macho de 16 meses. “Os dois foram colocados juntos depois de um processo gradual de aproximação e estão se dando super bem. A Newee, que já está velha e apresentando problemas de saúde, rejuvenesceu e ficou muito mais ativa com a companhia do Cuieiras”, relata Vera.
Vale destacar que esse tipo de problema – a captura de animais silvestres para serem explorados em atividades turísticas – é comum na Amazônia e em outras partes do país. O Fauna News já publicou diversos artigos sobre o problema (“Manaus (AM): quando o turismo erra e explora a fauna”, de 5 de agosto de 2016, aborda exatamente o estado do Amazonas). Por dinheiro, esses exploradores aproveitam da ignorância e do entusiasmo do turista, que paga para ter o contato mais próximo possível da natureza, e colocam bichos-preguiça, primatas, cobras, jacarés e iguanas, por exemplo, grande parte ainda filhote, no colo dos visitantes para fotografias.
Os turistas, muitos estrangeiros e a maioria desavisada dos problemas que estão incentivando, ficam maravilhados.
As consequências são animais sofrendo e sendo retirados da natureza, onde têm funções ecológicas para cumprir. Os que são resgatados, como a ariranha, podem nunca mais retornar à vida livre. O prejuízo ambiental é certo.
O Ministério Público do Amazonas, órgãos do governo do Estado e profissionais do setor do turismo já discutiram e até realizaram ações fiscalizatórias para coibir a atividade. Mas, se não houver uma rotina de operações e, sobretudo, um trabalho perene de conscientização das comunidades, das agências que promovem passeios e dos próprios turistas, o problema continuará existindo.