Fauna e aviação: a implementação do Portal Único de Notificações

A transferência do banco de dados e do sistema de reportes de ocorrências com animais no setor aéreo é um assunto recente, que vem levantando muitas inquietações, para as quais ainda há poucas respostas. Desde 1° de agosto de 2023, está em vigor o Portal Único de Notificações, administrado pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). E qual a relação disso com o gerenciamento de risco de fauna em aeroportos?

O que alimenta qualquer atividade relacionada à prevenção de acidentes, e que precede as ações a serem implementadas, é a análise de dados. Sem ela, as ações adotadas podem ser ineficazes ou podem se desviar do objetivo do trabalho. No caso da fauna em aeroportos, as informações básicas de um banco de dados são obtidas tanto pelo censo/monitoramento no local (que vai identificar os perigos, espécies presentes, seus atrativos e comportamentos) quanto pelos reportes oficiais de eventos com fauna: colisão, quase colisão e avistamento – cujas definições são estabelecidas no MCA 3-8.

É a partir desses dados que se faz a análise do risco, para saber o que priorizar e para onde direcionar os esforços e os recursos disponíveis. Em um artigo anterior, inclusive, o autor Edicarlos Pralon também comentou como esses dados são tratados pela mídia e como a abordagem enviesada pode atrapalhar todo o trabalho preventivo – leitura que vale a pena.

Pois bem. Os reportes de eventos com fauna no Brasil são realizados por meio da famosa Ficha Cenipa-15, hospedada no Sistema de Gerenciamento de Risco Aviário (Sigra) desde 2011. Uma grande conquista do setor, que tornou os reportes de colisão obrigatórios e que disponibiliza o acesso ao banco de dados de forma aberta e gratuita.

Por meio desses dados, é possível saber quais as espécies mais reportadas nos aeródromos, em quais horários e épocas do ano as colisões são mais frequentes, se houve colisões com dano, se houve colisões múltiplas, dentre uma série de outras análises. Tudo isso consolidou a ferramenta como indispensável às equipes dos aeródromos para terem um ponto de partida para o gerenciamento de risco de fauna.

A partir da Portaria Conjunta Anac e Comaer n° 01/2019, foi implantado o Sistema de Coleta e Processamento de Dados de Segurança Operacional, do qual faz parte o Portal Único de Notificações. Trata-se de uma iniciativa conjunta entre a Anac, o DECEA e o Cenipa e que vem sendo implementado em fases, cuja previsão de conclusão é junho de 2024. Seu principal objetivo é disponibilizar, de forma contínua e oficial, os dados e informações de segurança operacional para apoiar as atividades de gerenciamento no país.

Vantagens do Portal Único de Notificações

Mas ele também traz consigo a missão de facilitar o acesso dos usuários a um único ambiente, centralizando as diferentes opções de reportes de ocorrências aeronáuticas. E é importante ter em mente que a iniciativa, embora traga impacto ao gerenciamento de risco de fauna, foi concebida considerando toda a série de elementos afetos à segurança operacional, como drones, balões, raio laser, dificuldades em serviço, falhas, artigos perigosos, dentre outros.

Outra vantagem, além do armazenamento unificado, e que evitará duplicidades, é a padronização dos dados, em conformidade com a taxonomia internacional. A ideia é simplificar o fluxo de informações e aprimorar os processos.

Contudo, como toda transição, demanda esforço dos envolvidos para a adaptação, até que seja um sistema consolidado e com o qual usuários se acostumem. E essa adaptação envolve muitas preocupações do setor, como: os dados brutos estarão disponíveis para download? A base de dados do Sigra será migrada para o novo sistema? O que vai acontecer com o Sigra?

O que se sabe até o momento é que os dados serão triados para evitar duplicidade e serão disponibilizados aos usuários. Também haverá recebimento de sugestões de ajustes na ferramenta. Embora o sistema seja administrado pela Anac, seu propósito é servir a toda a comunidade aeronáutica e, portanto, as contribuições são bem-vindas e fundamentais – sempre visando à melhoria contínua.

O novo sempre vem. E com ele, o primeiro passo é treinar insistentemente os operadores aéreos e de aeródromos, reforçando a importância da cultura de reportes. Aliás, algo essencial para garanti-la é justamente simplificar as ferramentas e formulários – e, quanto a isso, uma interface mais intuitiva, com menos etapas e cadastros, é um dos itens importantes para não desestimular o preenchimento.

A consolidação de um sistema abrangente de coleta e processamento de dados de segurança operacional é uma tarefa complexa e que envolve diversos atores. Ainda há muitas inquietações, naturais de toda transição, mas o engajamento da comunidade aeronáutica é indelével para seu sucesso. Treinem, contribuam, reportem, dialoguem. Afinal, a segurança operacional é responsabilidade de todos!

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