Estado, incêndios e biodiversidade: uma reflexão sobre obrigações

O Estado é aquele ente de assistência social que, em tese, detém recursos necessários e estratégias protocolares para resolver problemas, mas que parece não saber usá-los, principalmente de maneira preventiva.

Nos últimos três meses, a mídia tradicional – aquela mesma que nomeia e julga possíveis culpados – e a sua irmã descentralizada divulgaram os numerosos focos de incêndios que assolam as regiões de maior diversidade biológica do país.

Os autocratas milenares, como de costume, demonstram surpresa. Aqueles mesmos que trabalham com ideias abstratas, bem distantes da prática, sem noção do tamanho das regiões e das características dos biomas. Ficam articulando narrativas e suas soluções são construídas em teorias.

Soluções inimagináveis para punir os supostos responsáveis, que ora são as mudanças climáticas, ora são os proprietários de terras. Ninguém se entende. Já não se trata de conseguir produzir algum serviço, trata-se de já não ter potencial para produzi-lo.

No lugar das desculpas tradicionais protocolares, que tal consultar os serviços de meteorologia nacionais e internacionais que disponibilizam previsões cada dia mais precisas sobre as secas sazonais? Que tal mapear pontos de acesso à hotspots e melhorá-los, equipando com unidades de combate às chamas, resgate e segurança?  É inadmissível que o famoso e turístico Paredão das Araras (MT) seja atingido por chamas, vitimando inúmeras aves, estando ele ladeado por dois rios caudalosos, sem que se tenha à disposição razoáveis recursos.

Cadê as ONGs?

Este ano foram repassados pelos cofres da União cerca de R$ 300 milhões para ONGs ambientais e, de longe, foram incluídos quaisquer critérios de apoio para tragédias dessa natureza. Tivemos, também, em 2023, repasses de cerca de US$ 31,3 milhões (cerca de R$ 150 milhões) da Open Society Foundations para ONGs nacionais. Será que nenhuma dessas organizações poderia ajudar, pelo menos materialmente, nessas horas?

Não poderíamos esquecer, mesmo que temporariamente, o ativismo ambiental e focar as verbas para ações de salvamento de animais?  Que tal investir na melhoria e ampliação das estradas vicinais acelerando a chegada de brigadistas? O que temos, até o momento, são prejuízos ambientais que chegam a R$ 2 bilhões (as vidas não são valoradas), computados pela Confederação Nacional dos Municípios. Lembrando que no ano anterior, o Fundo Eleitoral recebeu R$ 4,9 bilhões, enquanto o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima apenas R$ 3,5 bilhões. Investimos mais em políticos desconhecedores do assunto do que nas políticas ambientais necessárias.

Oscilando entre negligência e demagogia, temos três entes governamentais atuando oficialmente e obrigatoriamente em catástrofes: governos federal, estadual e municipal. Os acessos aos locais seriam, todos eles, inatingíveis? Que tal usar as mesmas estratégias de Raposo Tavares, Francisco Orellana e Gaspar de Carvajal? Os Bandeirantes não deixaram mapas?

Ninguém mais tem senso de urgência do que aquele que está sofrendo diretamente com o problema. A fauna que o diga.

Quem incendiou Roma dessa vez, Nero ou Paulo?

Observação: as opiniões, informações e dados divulgados
no artigo são de responsabilidade exclusiva de seu(s) autor(es).