Por Bruna Almeida
Bióloga e coordenadora do Projeto Reabilitação de Fauna Silvestre e das atividades de educação ambiental no Centro de Triagem de Animais Silvestres de Catalão (GO)
universocetras@faunanews.com.br
Em 2020, o Centro de Triagem de Animais Silvestres (Cetas) de Catalão (GO) recebeu mais de 450 animais, número inferior se comparado aos anos anteriores. Acreditamos que em virtude da pandemia ocasionada pela Covid-19, houve uma redução nas ações fiscalizatórias relacionadas a denúncias e recolhimento de animais silvestres em Catalão e nos municípios vizinhos. Porém, recebemos algumas espécies que são atipicamente encaminhadas como gato-mourisco (Herpailurus yagouaroundi), onça-parda (Puma concolor), lobo-guará (Chrysocyon brachyurus), quati (Nasua nasua) e mão-pelada (Procyon cancrivorus).
No final do mês de dezembro, recebemos uma chamada do município de Goiandira, situado a 17 quilômetros de Catalão, onde um lobo-guará foi vítima de atropelamento na ferrovia que cruza o município e acabou com um de seus membros mutilado na colisão, além de múltiplas fraturas nos membros pélvicos. Em geral, o Cetas recebe animais vítimas de atropelamento nas rodovias de Goiás, entretanto, tivemos a primeira vítima de ferrovia.
O lobo-guará, batizado de Zé, é um jovem macho que foi encaminhado imediatamente ao Cetas logo que avistado nas margens da ferrovia. Em estado de choque, recebeu os primeiros cuidados teve seu quadro clínico estabilizado e passou por procedimento cirúrgico do membro anterior esquerdo e imobilização das fraturas dos membros pélvicos. Felizmente, a cirurgia foi bem sucedida e o nosso desafio não parou por aí.
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Nos primeiros dias, Zé foi acondicionado em um espaço pequeno a fim de evitar grandes movimentações que pudessem comprometer a cicatrização do membro amputado e agravamento das fraturas. A alimentação era oferecida de quatro a cinco vezes ao dia, juntamente com a administração dos medicamentos necessários para evitar possíveis infecções e dos analgésicos. O manejo frequente e diário nos permitiu realizar as trocas de curativos e das imobilizações sem a necessidade de sedativos ou focinheiras, apenas cobrindo parte da cabeça para evitar o estresse.
Apesar da perda de um membro, a mutilação foi parcial e avaliamos a possibilidade de confeccionar uma prótese impressa em 3D, proporcionando assim uma melhor qualidade de vida ao Zé no criadouro conservacionista ao qual será destinado e onde poderá fazer parte de projetos voltados à reprodução e conservação da espécie. Os designers responsáveis pela técnica abraçaram a causa e logo que o processo de cicatrização estava avançado conheceram Zé e estudaram como poderiam adequar a prótese no membro, respeitando os seus aspectos físicos e peculiaridades.
O ponto da amputação ainda não cicatrizou totalmente e a prótese está em fase de confecção.
A técnica de impressão em 3D é uma realidade não só para humanos, mas também para inúmeras espécies da fauna silvestre que são impossibilitadas de retornarem ao seu habitat natural. Cada caso deve ser analisado com cautela, visando sempre a adaptação do animal e seu bem-estar, pois em alguns casos os espécimes se adaptam às condições que foram acometidos e a utilização da prótese torna-se ineficaz.
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