Educação ambiental e a necessidade de novos paradigmas num mundo em transformação

Atualmente, é cada vez mais comum ver crianças, adolescentes e mesmo adultos viciados em telas, sejam elas de computadores, televisões ou celulares. Os passeios também são restritos a locais “seguros” como shopping centers ou clubes. Com isso, o hábito da leitura decaiu e a exposição ao mundo natural se tornou raridade. A frase que muitos ouviam de seus pais, “vai brincar lá fora” ou “vai brincar na rua”, praticamente desapareceu.

Alguns fatores acentuam essa realidade como a concentração humana em grandes centros urbanos onde a vida precisa ser protegida das constantes agressões e inseguranças; pais e mães trabalhando longas jornadas fora de casa; instabilidade política e opiniões cada vez mais radicais e acirradas; ou bullying entre indivíduos ou grupos. Nesse cenário, visitas a áreas naturais e brincadeiras ao ar livre vêm se tornando raras.

Conservacionistas ou professores de Ciências hoje se deparam com jovens que não sobem montanhas nem querem caminhar dentro de matas com medo de insetos e até de sujar seus calçados. Essa é uma realidade internacional e não só do Brasil.

Porém, a educação ambiental foi concebida antes dessas tendências que hoje preponderam. Nas décadas de 1970-80, quando se pensou uma educação que levasse em conta a conservação da natureza, era comum levar pessoas a áreas naturais para que pudessem vivenciá-las, aguçar todos os sentidos e não aprender apenas dentro das salas de aula.

Uma novidade marcante trazida pela educação ambiental à educação tradicional foi a ênfase na importância dos valores juntamente com os conhecimentos, também considerados fundamentais. O lado sensível do ser humano deveria ser exercitado junto ao racional para aumentar as chances de se internalizar a aprendizagem. Essa junção entre o racional e o sensível, ou mente e coração, traria maiores chances de levar à ação com base em escolhas conscientes.

Cada indivíduo teria como desenvolver seus talentos individuais e o professor deixaria de ser um mero transmissor de conhecimentos para se tornar um facilitador. Aspectos relacionados à natureza nesse aprendizado integral muitas vezes eram introduzidos com experiências vivenciadas em algum parque, praça, riacho ou qualquer ambiente natural. Colocar a mão na terra, respirar o ar puro dentro de uma floresta, observar pequenos seres se movimentando em um tronco de árvore ou solo, saber que animais selvagens habitam determinados ecossistemas e contribuem para o ambiente natural tornavam as vivências memoráveis a quem as experienciava.

A resolução de problemas tem sido também abordagem utilizada para se aprender a lidar com questões concretas que demandam atenção, como o assoreamento de um rio, a degradação de uma área, alguma espécie ou muitas que se encontram em perigo de extinção. Essas e outras temáticas fazem parte do cardápio de programas de educação ambiental. O questionamento do que se passa e como contribuir para sanar ou mitigar questões reais sempre serviu de base para a educação ambiental, que defende a construção de pensamentos críticos com escolhas feitas a partir de conhecimentos elaborados e processados.

Apesar da concentração humana em grandes centros urbanos, a busca por visitação a áreas naturais tem aumentado. No Brasil, aproximadamente 12 milhões de pessoas visitaram unidades de conservação em 2023, um acréscimo de 15% aos anos anteriores.  Esse número pode parecer interessante, mas se torna tímido quando comparado aos Estados Unidos, que recebem aproximadamente 320 milhões de visitantes por ano. O interesse existe e é um alento por demonstrar a vontade de se estar na natureza. Por isso, essa deve ser uma vertente da educação ambiental a ser melhor explorada.

Por que é importante vivenciar a natureza?

Como descreveu o budista Babr Dioum, texto vastamente parafraseado em programas de educação ambiental:

No final, só conservamos o que amamos.

Amamos apenas o que compreendemos.

Compreendemos somente aquilo que nos é ensinado.

Esse desencadear de ideias soa simples, mas sua adoção nem sempre é fácil por conta de variadas circunstâncias nacionais e mundiais. Um exemplo é a inadequação do sistema educacional que persiste em favorecer a transmissão de conhecimentos que não incluem a proteção da natureza. O resultado é que a responsabilidade de lidar com grande parte das questões ambientais ou socioambientais recai sobre a educação ambiental, quando deveria ser de todos os campos do saber. É preciso ampliar a noção de escolhas e consequências e do peso dos efeitos das ações praticadas. A ideia do texto é válida e deveria ser para todos – se não conhecemos, como seremos capazes de amar a vida a ponto de nos envolvermos para reverter situações que devastam e causam perdas a espécies ou a ambientes naturais como um todo?

Questionei algumas vezes grandes plateias quando proferia palestra: “quem aqui teve contato com a natureza quando criança?” Quase a totalidade das pessoas levanta as mãos, pois quem está interessado em ouvir um (ou uma) conservacionista relatando suas experiências em geral já foi “mordido(a)” pela paixão pelo mundo natural. Relatos pessoais compartilhados nos intervalos dos encontros incluem férias passadas em alguma fazenda de parente, períodos da infância morando em zonas rurais ou algum parente que levava a pessoa a locais onde era possível ter contato direto com a natureza.

Com quase 80% da população mundial vivendo em grandes centros onde há pouca exposição a áreas naturais, como será a formação dos futuros conservacionistas? Como competir com as telas diversas ou mesmo com ambientes “seguros” como shopping centers ou clubes? Atrair crianças, jovens e adultos para áreas naturais e os tornar interessados em seguir carreiras conservacionistas que contribuam com melhorias reais parece ser um desafio cada vez maior.

Para quem trabalha com espécies da fauna selvagem, como é o caso de muitos colegas do Fauna News, essa realidade pode trazer percalços ainda maiores do que os que já existem. Por exemplo, como obter apoio de comunidades locais para a proteção da natureza ou redução do que causa perigos a determinadas espécies? Como atrair o interesse em assuntos ligados à conservação de hábitats se as pessoas não conhecem os ambientes e as características das quais as espécies dependem para sobreviver?

Trazer as espécies e seus hábitats para as “telas” por meio de documentários, podcasts, pequenos vídeos, jogos e outas formas de comunicação virtual pode ser uma medida contemporizadora. Mas, claro, não substitui a experiência integral de vivenciar e apreciar a natureza in loco. Mesmo os programas educativos que expõem o visitante a áreas naturais talvez precisem ser reformatados para não afugentar quem pisa pela primeira vez em um solo barrento ou é picado por algum inseto.

Não há respostas a essas questões ainda embrionárias, mas há indicadores de que é preciso se antecipar às crescentes perdas. A educação ambiental, sem dúvida, contribui, mas talvez tenha que ser revisitada e se aliar à comunicação, para conquistar novos amantes da natureza, e à psicologia, com intuito de estudar meios viáveis e promissores de se incluir a conservação dentro das realidades atuais. Na verdade, todos os campos do conhecimento deveriam incorporar a valorização da natureza como parte indispensável à vida na Terra.

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