E tem peixes na Caatinga? Conheça a ictiofauna do bioma

Devido às imagens das estiagens mostradas nos meios de comunicação, principalmente na televisão, as pessoas criaram a imagem de que a Caatinga é uma região constantemente seca, sem rios, sem vida e, consequentemente, sem peixes. No entanto, essa concepção da Caatinga, o único bioma exclusivamente brasileiro, é equivocada. Ela possui uma rica variedade de ambientes aquáticos de água doce com uma diversidade de peixes bastante significativa.

Rios da Caatinga

A hidrografia da Caatinga é composta de muitos rios, sendo que parte deles é intermitente (secam no período de estiagem) e outros tantos são perenes (que não secam). O principal rio que drena o bioma é o São Francisco, um dos mais famosos do Brasil, que nasce no Sudeste (Minas Gerais), dentro do Cerrado, e atravessa grande parte da Caatinga. Outro grande rio é o rio Parnaíba, localizado entre os estados do Piauí e Maranhão.

Peixes da Caatinga

O primeiro grande levantamento das espécies de peixes da Caatinga foi liderado por pesquisadores da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), que registraram 240 espécies. Em 2017, uma parceria entre pesquisadores da UFPB, instituição da qual faço parte, e da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), resultou na publicação de uma atualização da diversidade de peixes da Caatinga, registrando um aumento considerável da riqueza de espécies: foram 386, das quais 371 são espécies nativas e 15 são exóticas, ou seja, que foram introduzidas nas bacias do bioma.

Das 371 espécies nativas de peixes da Caatinga, 203 são consideradas endêmicas (exclusivas) de bacias do bioma, ou seja, cerca de 54% das espécies são exclusivas dele. É importante informar que o Brasil tem registrado cerca 3.500 espécies de peixes dulcícolas nas bacias que drenam o país, portanto, cerca 10% dos peixes conhecidos do Brasil ocorrem na Caatinga.

Temos, constantemente, monitorado essa diversidade. Segundo nossos dados, atualmente são conhecidas cerca de 430 espécies de peixes de água doce da Caatinga, um aumento de 59 espécies a mais que o registrado em 2017. No entanto, o número de espécies de peixes ameaçados da Caatinga, na Lista Nacional Oficial de Espécies da Fauna Ameaçada de Extinção do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima também aumentou de 34, em 2014, para 51 na lista de 2022.

Cerca de 15 novas espécies de peixes foram descritas entre 2018 e 2024 em bacias que drenam a Caatinga. Eu participei da descrição de nove delas (Phenacorhamdia cabocla Rocha, Ramos & Ramos, 2018, Characidium tapuia Zanata, Ramos & Oliveira-Silva, 2018, Parotocinclus jacksoni Ramos, Lustosa-Costa, Barros-Neto & Barbosa, 2021, Eigenmannia robsoni Dutra, Ramos & Menezes, 2022, Hypostomus velhomonge Lustosa-Costa, Ramos, Zawadzki & Lima, 2022, Hypsolebias bonita Abrantes, Ramos, Bento & Lima, 2023, H. gongobira Abrantes, Ramos, Bento & Lima, 2023, H. lulai Ramos, Nielsen, Abrantes, Lira & Lustosa-Costa 2023 e Hypostomus cari Lustosa-Costa, Ramos, Zawadzki, Jacobina & Lima, 2024). Essas novas espécies demonstram que ainda temos muito o que conhecer da fauna de peixes da Caatinga.

No entanto, infelizmente, mesmo sendo o único bioma exclusivamente brasileiro, a Caatinga sofre com a falta de recursos para financiar os estudos de sua biodiversidade, dificultando nossa luta pela conservação dos peixes dessa região e seus ambientes. O Nordeste brasileiro, onde predomina a Caatinga, carece de pesquisadores e grupos de estudo que trabalhem com diversidade, sistemática e conservação de peixes dulcícolas da região.

Como a falta de conhecimento é um dos importantes fatores que dificultam a conservação, geralmente não se protege o que não se conhece, decidimos elaborar o projeto Peixes da Caatinga com intuito de divulgar a diversidade de peixes do bioma e os ambientes onde eles vivem. O Peixes da Caatinga atua com divulgação científica nas redes sociais (Instagram, Facebook, Tiktok e YouTube), além da apresentação de palestras em congressos, encontros, simpósios e atividades de educação ambiental em escolas e eventos ligados à Ciência e meio ambiente, apresentando a exposição “E tem Peixes na Caatinga?”. Nessa atividade, mostramos alguns exemplares das espécies de peixes que ocorrem na Caatinga, falamos sobre a diversidade desses animais e como ajudar na conservação do bioma.

Portanto, respondendo ao título do artigo: sim! A Caatinga tem uma importante diversidade de peixes  que precisa ser melhor conhecida e conservada.

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