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Por Suzana Padua
Mestra em educação ambiental e doutora em desenvolvimento sustentável. Co-fundadora e presidente do IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas e da Escola Superior de Conservação Ambiental e Sustentabilidade (Escas)
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As Nações Unidas estabeleceram datas comemorativas para marcar acontecimentos ou temas, por considerar serem merecedores de atenção. Dentre esses estão dia do Meio Ambiente, dia da Água e muitos outros.
Março é um mês de muita celebração, com as seguintes datas comemorativas:
É inacreditável que a humanidade precise de lembretes para qualquer desses temas. São todos de importância inegável e alguns remetem a situações que jamais deveriam ter ocorrido, como escravatura, discriminação de qualquer espécie e menos ainda a violação dos direitos humanos, que engloba todos os demais. Na área ambiental, março também celebra vida selvagem, florestas e água. Já na cultura, os temas parecem leves e atraentes, como felicidade e poesia.
Celebrar o dia da Mulher soa como aberração, mas, infelizmente, a realidade mostra a necessidade de defesa dos direitos que deveriam ser iguais. Os homens se esquecem que nasceram de uma mulher e sem elas não estariam vivos. Parecem amnésicos na hora de atribuir o valor dos rendimentos à mulher por um trabalho equiparado ao que ganham, ou a oportunidades de chefias em empresas ou ainda em direitos dentro de muitos lares. Lastimável!
As datas podem ser úteis, mas não repõem atitudes que deveriam ser constantes. Todo dia precisa ser dia de respeito aos temas propostos em datas especiais. Por exemplo, lembrar de água ou meio ambiente em um só dia desvaloriza tudo o que representam. Não seria possível haver vida sem eles ou todos os elementos que os compõem. Mas, precisar de datas especiais para lembrar do valor que qualquer aspecto natural tem pode ser o resultado do nosso distanciamento da natureza. Hoje, a grande maioria das pessoas vive em meios urbanos e sem contato direto com áreas naturais.
É aí que a educação ambiental deve entrar em operação. Tirar partido das datas ligadas a temáticas ambientais para promover visitas a áreas naturais e estimular o aprendiz a desenhar, tirar fotos, tocar elementos como folhas diferentes, troncos de árvores, solos úmidos e secos. Experiências assim têm o potencial de despertar interesse pela natureza, com a observação de detalhes como, por exemplo, formigas carregando pedaços de folhas, às vezes com mais do dobro de seu tamanho, ninhos de pássaros, teias de aranhas ou mesmo o movimento da água de um riacho. Essas são práticas que estimulam a curiosidade e mostram as belezas e o funcionamento do mundo natural.
Março celebra dois temas ambientais de grande relevância: florestas e água. Um está diretamente relacionado ao outro, mas a maioria das pessoas não faz essa conexão. Celebrações desses temas podem ser ótimas oportunidades de reflexão e aprendizado. Sem florestas, dificilmente haveria água disponível para a vida, que inclui o consumo humano e a agricultura, maior absorvedora da água doce disponível.
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No entanto, há de se tomar cuidado, pois alguns programas de educação ambiental se atêm a datas comemorativas, esquecendo-se que educação exige continuidade. Programas que só acontecem em datas específicas para festejar a natureza ou algum tema acabam repercutindo negativamente, desvalorizando o campo da educação ambiental. Isso porque eventos pontuais são insuficientes para provocar reflexões profundas que levem a escolhas conscientes. Esse cuidado precisa ser tomado para evitar o desgaste da própria educação ambiental.
O dia do mico-leão-preto
Espécies também ganham datas especiais. É o caso do mico-leão-preto (Leontopithecus chrysopygus), eleito primata símbolo do estado de São Paulo em 2014 (Decreto nº 60.519) por ser considerado patrimônio ambiental e por ocorrer apenas nessa unidade da federação. Seu dia especial é 28 de fevereiro.
Um programa continuado de educação ambiental no Pontal do Paranapanema (extremo oeste de São Paulo), que teve início há mais de 30 anos pelo IPÊ – Instituto de Pesquisas Ecológicas, levou a espécie a se tornar conhecida regionalmente e motivo de orgulho. Trabalhar a educação ambiental com foco em espécies locais facilita a comunicação e o interesse em sua proteção e na conservação da natureza como um todo. Prova disso é que quando o programa integrado de conservação do mico-leão-preto começou em final da década de 1980, a espécie estava entre as dez mais ameaçadas e classificada como “criticamente ameaçada”, de acordo com a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês).
Com todo o empenho em diversas frentes, o mico-leão-preto passou à categoria “ameaçada”, apesar das pressões antrópicas continuarem e até se intensificarem nesse período. Certamente, a educação ambiental teve um papel importante nesse processo, pois a espécie tornou-se conhecida e amada pela população local.
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Datas em meio a programas continuados podem ser bem interessantes porque trazem conhecimentos sobre os temas abordados e oportunidades de se exercitar a criatividade, dependendo de como são tratados. Despertar interesse e curiosidade é um caminho para que os aprendizes se aprofundem e descubram seus próprios talentos, como para pintura, poesia, música, ciência. Abrir o leque de saberes por meio de atividades que juntam aprendizado e diversão é papel do educador. E o educador ambiental pode ainda trazer o amor pela natureza, tão importante nesse momento planetário.
Todavia, deixar a responsabilidade das transformações socioambientais que se apresentam como necessárias apenas por conta do educador ambiental não é justo e muito menos viável. O sistema educacional como um todo precisa passar por um processo de mudança que inclua valores. O ideal seria o incentivo pela cooperação no lugar da competição, a generosidade e não a ganância e a sustentabilidade em todas as escolhas e caminhos trilhados. A educação ambiental é apenas uma vertente da educação que surgiu por carências percebidas quando crises ambientais se tornaram latentes.
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O que me parece fundamental nesse momento é que se introduza “amor à vida” nos conteúdos programáticos da educação. Assim, nenhuma das datas listadas anteriormente precisariam ser relembradas porque, com amor, se evitaria fatos injustos como escravatura (existente até hoje no Brasil, mesmo que proibida) e até guerras (como a da Ucrânia, que já dura mais de um ano). Com amor, se valoriza a vida e todas as datas que homenageiam a mulher, a criança, o idoso ou qualquer tema ambiental, que seriam celebrados todos os dias em grande estilo e com naturalidade.
Esse é nosso papel de ser um Ser Humano com letra maiúscula.
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