Por Ingridi Camboim Franceschi
Graduada em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), onde é mestranda, sendo integrante do Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias (NERF)
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Existem diversas estruturas de mitigação para reduzir o número de fatalidades nas estradas, porém tais elas têm custo elevado e avaliar a sua efetividade ainda é um desafio. Existem alternativas para estimar o custo de implementação dessas medidas em relação ao benefício de reduzir as colisões de veículos com a fauna. Uma delas é contabilizar as fatalidades que seriam evitadas caso medidas mitigadoras fossem implementadas em todos os trechos de hotspots (agregação de fatalidades) de uma rodovia. Nesse caso, estamos considerando que a mitigação irá reduzir 100% as fatalidades (sendo totalmente efetiva, algo improvável de acontecer), uma vez que não temos valores de efetividade para cada tipo de estrutura.
Essa abordagem foi testada em um artigo que publicamos recentemente (e já citado em outros textos da coluna), a partir da inspiração em trabalhos (2017 e 2018) de colegas brasileiros. Nós avaliamos um possível custo-benefício de mitigação considerando dois conjuntos de dados: um com todos os registros de fatalidades de todas as espécies de mamíferos e outro sem considerar os registros de gambá-de-orelha-branca (Didelphis albiventris). O objetivo dessa análise foi testar qual abordagem apresentaria menor custo e maior benefício em dois contextos: considerando a redução total de fatalidades de todas as espécies e a redução de fatalidades não considerando o gambá.
Também foram avaliadas as espécies que seriam beneficiadas com a mitigação nesses trechos, a fim de propor os locais onde reduziriam as fatalidades do maior número de espécies possível. De novo, ressalto que assumimos que as ações mitigadoras seriam totalmente efetivas.
A análise de custo-benefício considerou a porcentagem de fatalidades nos trechos de hotspots em relação a proporção da estrada a ser mitigada nesses trechos, em quilômetros. O conjunto de dados inteiro (com o gambá-de-orelha-branca) apresentou uma maior proporção de benefício-custo, sendo necessário mitigar uma pequena porção da extensão das estradas – entre 2% e 5% – para evitar entre 16% e 43% das fatalidades de mamíferos. Além disso, nessa mesma análise, nós consideramos quais as espécies seriam contempladas na mitigação, o que resultou em pequenas mudanças de composição. Ao considerar o conjunto de dados sem o gambá, seria possível contemplar uma espécie quase ameaçada, a lontra (Lontra longicaudis), e excluir uma espécie exótica (a lebre-europeia, Lepus europaeus).
Essa é uma abordagem simples, mas é possível aprimorar e considerar outros aspectos de custos relacionados à infraestrutura linear (como adaptações ou implementação de novas estruturas) e os benefícios relacionados às espécies ou ao grupo-alvo. A escolha de qual conjunto de dados usar para definição dos locais das medidas mitigadoras dependerá do objetivo da mitigação, seja ele focar em evitar fatalidades e/ou quais espécies-alvo, como espécies ameaçadas ou algum grupo específico de espécies. Portanto, é possível considerar esse método como uma estratégia inicial e adaptá-lo conforme o contexto de cada infraestrutura linear e os objetivos da mitigação. Esperamos que abordagens como essa sejam cada vez mais comuns para avaliarmos os potenciais custos e benefícios da priorização de trechos para mitigação de fatalidades em estradas.
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