Por Cristina Rappa
Jornalista com MBA Executivo de Administração e especialização em Comunicação Corporativa Internacional. Observadora de aves e escritora de livros infantojuvenis com temática voltada à conservação da fauna
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Em Arceburgo, no sul de Minas, um grupo de dez crianças e jovens de 7 a 12 anos chama a atenção ao acrescentar novos instrumentos em suas atividades, ainda pouco comuns a indivíduos dessa idade, especialmente em uma pequena cidade do interior do país. Vestidos com camisetas com estampa camuflada, manejam binóculos, câmeras, gravadores e guias de aves da Mata Atlântica.
Eles integram o grupo do Projeto Observação de Aves de Arceburgo, o OBAA, criado em outubro de 2019, visando promover a educação e a consciência ambiental na região, além de apontar oportunidades de atividades e carreira às crianças. “Abrir seus horizontes”, como destaca o paisagista Ademir Carosia, idealizador do programa.
Carosia, que é secretário de Meio Ambiente do município mineiro de pouco mais de 10 mil habitantes, implementou o OBAA em parceria com a Secretaria Municipal de Assistência, Inclusão e Serviço Social. Os integrantes são alunos da rede pública de ensino da cidade e foram selecionados, com a ajuda dos professores, com a ideia de compor um grupo diverso, em termos de gênero, raça, condição social e ano escolar. Justamente para enriquecer a troca de experiências e, consequentemente, o aprendizado. O apoio da prefeitura e algumas doações possibilitaram que os participantes tivessem câmeras fotográficas, binóculos, livros e guias de aves à disposição para as atividades e a pesquisa.
Selecionadas, as crianças receberam um convite para descobrir “mais sobre tudo” e, desde então, em um período por semana, se dedicam a atividades como assistir a palestras, observar e estudar a fauna e a flora da região – seja em livros como nos jardins da Secretaria de Meio Ambiente ou em visitas a matas locais -, fotografar aves, borboletas, árvores, rios e cachoeiras, entre outros elementos da natureza, e até visitar o asilo da cidade.
Cidadania
“O projeto não pretende criar apenas observadores de aves e formar pessoas que zelam pela natureza. O grupo, além de aprender sobre o paisagismo e a natureza local, aprende a fazer pipoca e algodão doce nas praças, a desenvolver dinâmicas de cidadania, a utilizar microfones e a melhor se comunicar, verbalmente e por escrito”, diz Carosia, um adepto da observação de aves e cujo empenho fez com que Arceburgo, inserida em uma das principais regiões cafeeiras do país, chegasse às quase 280 espécies de aves catalogadas no WikiAves, a plataforma de registro de espécies de aves que existem no Brasil.
Segundo ele, esse trabalho promoverá não apenas a educação e a consciência socioambiental das crianças, mas também pretende estimular a criatividade por intermédio de produção de conteúdo em blogs e páginas nas redes sociais específicas de aves, assim como nas redes sociais gerais, entre outros meios de comunicação. Para isso, além dos binóculos, câmeras e guias, os integrantes do grupo têm computadores da Secretaria de Meio Ambiente à sua disposição e criaram seus perfis no WikiAves, onde passaram a incluir os pássaros que fotografam ou cujo som gravam. Além de registrarem suas impressões sobre as atividades em um blog.
Já nas primeiras semanas de desenvolvimento do projeto, as reações das crianças foram percebidas pelo organizador. Ele se lembra quando um dos meninos, o Samuel, veio contar, entusiasmado, que descobriu que o lindo pássaro azul e amarelo que acabara de fotografar era o que tem o hábito de imitar o som de outras aves, o que ele tinha aprendido nas palestras e no guia de aves. Trata-se do gaturamo (Euphonia violacea), espécie que pode ser encontrada nas matas e jardins de Arceburgo. Mesmo quem não faz parte do grupo acabou sendo contagiado e o menino João Bússolo acabou se interessando por aves e registrou pela primeira vez a coruja jacurutu (Bubo virginianus) no município.
Criança é normalmente multiplicadora das mensagens que aprende em casa, mas outro aspecto do OBAA a ser destacado é a promoção da interação maior com a família. Isso porque alguns familiares, entre eles avós, passaram a acompanhar os jovens nas atividades.
Pandemia
O projeto foi idealizado para acontecer, por turma, durante um ano letivo, e fornecerá, ao seu término, um certificado de participação. Viu-se interrompido em março deste ano pela pandemia do novo coronavírus e retorna quando as aulas presenciais voltarem, no segundo semestre. Jean Carmo Lima Santos, de 8 anos recém-completados e o mais novo do grupo, lamenta a interrupção: “gostei muito do projeto dos passarinhos. Aprendi bastante e gostaria que tivesse mais, que não acabasse”. Não vai acabar não, Jean, fique tranquilo!
Por sinal, as escolas têm recebido solicitações de estudantes para participar das novas turmas do OBAA. De acordo com a professora Nelci Fonseca, que tinha parte de seus alunos do quinto ano no projeto, as crianças “evoluíram muito na observação de aves e da natureza” e “foi uma choradeira só” a despedida.
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