Bugios livres: a esperança de retorno à natureza

A espécie Alouatta guariba clamitan, o bugio-ruivo, está em risco de extinção classificada como “vulnerável” na Lista Nacional de Espécies Ameaçadas de Extinção. As principais ameaças a esse primata incluem a perda, fragmentação e redução da qualidade de seu hábitat, a retirada de indivíduos por caça ou captura, ataques por animais domésticos e doenças como a febre amarela, segundo o Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Primatas Brasileiros (CPB).

Muitas populações de bugios foram dizimadas pela febre amarela. Os indivíduos que não sucumbiram à doença foram eliminados pela triste falta de conhecimento sobre sua forma de transmissão. Causada por um vírus e transmitida por mosquitos, na natureza, os bugios são as principais vítimas, adoecendo como um alerta para os seres humanos, agindo como sentinelas e indicando a presença do vírus em determinada região.

O surto de febre amarela do estado de São Paulo entre os anos 2017 e 2018 fez com que muitos grupos previstos para soltura precisassem permanecer em cativeiro. Para proteção dos animais, pesquisadores aplicaram a vacina de uso humano contra a enfermidade, imunizando os animais. As dosagens ideais foram detalhadas em fevereiro de 2021 no artigo Safety and immunogenicity of 17DD attenuated yellow fever vaccine in howler monkeys (Alouatta spp.).

Em 2022, O CPB realizou uma oficina participativa para elaboração do Programa de Manejo Populacional de Alouatta guariba. O esforço dessa ação foi para realizar o manejo integral, compensando os efeitos das ameaças e restaurar as populações in situ (na natureza) através de reforços populacionais e reintroduções a partir de indivíduos oriundos de instituições de manejo ex situ (em cativeiro).

Oficialmente reconhecido em fevereiro deste ano, o programa possui um papel fundamental de integrar ações, coordenando as intervenções de manejo relacionadas a espécie-alvo, como captura, translocação, reprodução em cativeiro e reintrodução na natureza, fortalecendo os esforços de conservação para a espécie. Ele envolve diversas instituições e especialistas que se unem em prol do primata.

O papel das instituições que possuem grupos de bugios com chances de integração ao Programa de Manejo Populacional é muito importante, visto que a estratégia completa tem o objetivo de garantir a viabilidade da espécie na natureza. Por meio da soltura dos grupos cativos será possível realizar o reforço populacional e dar outra chance aos indivíduos que estão hoje em cativeiro.

Para o sucesso da soltura desses grupos há um caminho a ser percorrido. Incialmente, as organizações devem estar cadastradas no Programas de Manejo Populacional de Espécies Ameaçadas da Fauna Brasileira – a Instrução Normativa ICMBio nº 05/2021 estabelece os procedimentos necessários para esse registro. Além disso, os indivíduos com possibilidade de soltura precisam atender alguns critérios, como origem dos animais ser conhecida, animais que não sejam esterilizados, animais com ancestralidade conhecida, sem anomalias congênitas e vacinados contra febre amarela.

Essa ainda não é a etapa final para que esses animais tenham a sua segunda chance. Há também critérios para a seleção e priorização das áreas para a realização da soltura e nesta destaco o conhecimento das ameaças locais, a implementação de medidas de monitoramento e mitigação, a disponibilidade de recursos (dieta, estrutura do hábitat etc.) para manutenção da população da espécie ao longo do tempo e o conhecimento das áreas afetadas diretamente pelos surtos de febre amarela, onde houve maior declínio.

Para o melhor manejo da espécie em cativeiro, também foi publicado o Protocolo de Manejo Ex Situ de Primatas do Genêro Alouatta, que traz procedimentos fundamentais para um manejo adequado e a garantia de bem-estar dos indivíduos e grupos. Seja para aqueles que poderão integrar programas de soltura como para os que permanecerão em cativeiro. Aqui o trabalho inicia no recinto, com uma dieta mais próxima do que eles poderão encontrar na natureza, como frutos e folhas. O contato humano também é um fator significativo, bem como o estado clínico. Assim, aumentamos a chance de sucesso da futura soltura.

Hoje o Instituto Libio possui um grupo de bugios que poderá retornar a natureza e muitos parceiros atuam conosco para fazer disso uma realidade. Afinal, é isso que desejamos: os bugios livres e a esperança para eles e para nós de uma história promissora para a conservação dessa e de outras espécies.

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