Juliana Maria de Barros Freire
Diretora de Sustentabilidade do Instituto Physis - Cultura & Ambiente e doutoranda em Mudança Social e Participação Política pela Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP).
A bioeconomia é um assunto relativamente recente que deveria ser preocupação de todos, pela velocidade com que essa nova abordagem está emergindo. Trata-se de um termo ainda em construção, aberto ao debate e, ao mesmo tempo, sujeito a diferentes interpretações e apropriações por diversos interesses de mercado. Como estamos, principalmente, no campo das ciências econômicas, sabemos que os interesses monetários exercem um peso significativo.
Por isso, seria muito pertinente a escolha por abordar a bioeconomia nos processos de educação formal, principalmente no ensino básico. Essa conexão é essencial para nós, brasileiros, que temos a biodiversidade como um trunfo diante do contexto atual, marcado pelas emergências climáticas e pelas discussões globais sobre sustentabilidade. Tratar a bioeconomia de forma transversal e Interdisciplinar se apresenta como uma possibilidade inovadora e necessária, pois coloca essa temática na pauta da educação desde a base.
Essa abordagem é fundamental para formar jovens com uma compreensão crítica sobre que tipo de economia estamos debatendo e qual educação queremos construir. Isso nos leva a refletir sobre a superexploração dos recursos naturais, que afetam os biomas fundamentais para a vida de nossa fauna, e sobre o modelo de desenvolvimento que estamos promovendo.
Em se tratando de bioeconomia e seus desafios, há alguns questionamentos essenciais, pois, afinal, de que tipo de bioeconomia estamos falando? Esse conceito está sendo amplamente debatido, mas também utilizado como ferramenta política e de disputa por poder, envolvendo grandes indústrias e o agronegócio. Quando falamos em bioeconomia, estamos nos referindo a um modelo de produção predatório ou a uma abordagem que respeita os limites planetários e que possibilita integridade dos ambientes naturais onde vivem as espécies animais endêmicas de nossos ecossistemas?
O ponto central da bioeconomia é que ela deveria ser uma economia que respeitasse os limites do planeta. Por mais que esteja associada à inovação e à tecnologia, não podemos ignorar sua relação com a conservação ambiental. Infelizmente, muitas vezes, grandes empresas se apropriam do discurso sustentável, utilizando o chamado “greenwashing” para pintar seus negócios de verde, enquanto continuam praticando atividades degradantes, como a superexploração da terra, a pecuária extensiva e a redução dos territórios fundamentais para a sobrevivência dos animais ameaçados de extinção.
Dessa forma, é essencial que estabeleçamos critérios rigorosos e conceituações claras para definir o que realmente pode ser considerado bioeconomia. Isso também se aplica à educação: que tipo de educação queremos? Devemos formar cidadãos críticos, capazes de compreender os desafios da sociedade e agir com ética, cooperação e solidariedade. Não se trata apenas de um ensino tecnicista voltado para a inserção no mercado de trabalho, mas de uma formação integral, que priorize a sustentabilidade e uma visão holística da sociedade.
Outro ponto relevante é a relação entre bioeconomia e disseminação de um conhecimento que seja contra-hegemônico. Esse conceito está sendo amplamente discutido na atualidade, mas não se trata apenas do conhecimento científico e tecnológico tradicional. Precisamos considerar um conhecimento múltiplo e multicultural, que integre os saberes tradicionais de povos e comunidades que praticam a bioeconomia há séculos, utilizando os recursos naturais de forma sustentável para sua sobrevivência e dos demais seres vivos.
Isso nos leva a uma reflexão mais ampla sobre o modelo econômico que queremos para o Brasil. Continuaremos a ser apenas um país exportador de commodities ou seremos capazes de redefinir nossa trajetória e aproveitar nossa imensa biodiversidade de forma sustentável? Esse é um debate profundo e necessário, que deve ser enfrentado com seriedade para evitar que a bioeconomia se torne apenas mais uma ferramenta de mercado.
Se deixarmos que apenas os interesses neoliberais determinem o rumo da bioeconomia, corremos o risco de transformar a Amazônia em uma nova fronteira de exploração de commodities, seja de açaí, castanha ou biocombustíveis. Precisamos questionar que tipo de crescimento queremos: um crescimento baseado na superexploração dos recursos ou um modelo de desenvolvimento que priorize qualidade de vida, sustentabilidade e manutenção dos serviços ambientais?
Na educação básica é essencial o papel dos/as professores/as na construção da compreensão do conceito sobre bioeconomia, afinal são eles/as os agentes de transformação social. Os/as educadores/as são vetores essenciais nesse processo, pois transmitem cultura e conhecimento, formando cidadãos críticos e preparados para os desafios do futuro.
A educação ambiental de que falamos deve estar sempre fundamentada no Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis, um documento essencial que apresenta os princípios de uma educação ambiental crítica.
Torçamos para que a educação formal no Brasil possa abrir caminhos para novos debates sobre a introdução da bioeconomia nos currículos escolares, pois assim será possível a formação de uma nova geração de cidadãos/ãs, capazes de sonhar, realizar a implementação de uma sociedade sustentável e colaborar com a conservação de nossa diversidade biológica.
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