Médica veterinária, mestranda em Saúde, Medicina Laboratorial e Tecnologia Forense pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e agente da Polícia Federal com especialização em Polícia Ambiental
nalinhadefrente@faunanews.com.br
A natureza criou um animal com duas asas e a capacidade de explorar a imensidão do céu. Nesse ser vivo veio também o instinto natural de exploração de seu habitat, de procura de alimento, de formação de pares e reprodução. Em troca, o meio ambiente ganha propagação de suas florestas com a dispersão de sementes para locais que seriam inatingíveis sem as aves.
Por outro lado, existem a ambição e o egoísmo humano que enxergam esses seres como uma fonte de renda, não se importando com a infelicidade que causam a esses animais nem com os danos ambientais que ocorrerão com a retirada deles da natureza. Os objetivos são lucro e riqueza.
Mas e os consumidores? Por que compram? Por que consomem e financiam esse sofrimento? Por que se acham no direito de aprisionar e condenar uma ave a uma vida inteira num cubículo com o único intuito de satisfazer a vontade pessoal de ver a beleza rara e ouvir a vocalização fascinante dela?
Aves dentro de gaiolas não podem utilizar suas asas, deixando-as atrofiadas. Aves dentro de gaiolas passam a vida pulando de um poleiro ao outro. Mas aves não pulam; aves voam.
Nesses espaços restritos, elas não têm distração alguma, não precisam ir atrás de seu alimento. Além disso, não têm a oportunidade de encontrar seus equivalentes, seu grupo, e explorar livremente a natureza. Quando, ainda assim, podem ficar em viveiros com outras aves, mesmo que sejam da mesma espécie, é um convívio forçado. Tiramos delas a liberdade de escolha de sua própria turma.
A Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998), em seu artigo 32, proíbe os maus-tratos a animais, mas, incoerentemente, não proíbe as gaiolas. É como querer combater a venda de objetos roubados sem a obrigatoriedade de apresentação de nota fiscal; é como querer combater a lavagem de dinheiro e, ao mesmo tempo, não proibir a aquisição de bens sem a comprovação da origem lícita desse recurso; é como querer combater a pesca predatória sem proibir a venda de redes de malha fina. Como combater um crime se o instrumento que possibilita esse crime não é proibido? Quando o poder público cria uma lei, esse mesmo poder tem que possibilitar todos os meios para que ela seja aplicada.
A Índia proibiu o encarceramento de pássaros em gaiolas. A decisão foi histórica e reforçou o posicionamento do país em relação à defesa dos animais. O responsável pelo anúncio foi o juiz Manmohan Singh. “Todos os pássaros têm o direito fundamental de voar nos céus e os seres humanos não têm o direito de mantê-los presos em gaiolas para satisfazer os seus propósitos egoístas ou o que quer que seja”, disse em sua decisão. Para a corte indiana, os animais merecem compaixão e os pássaros possuem direitos fundamentais, que incluem o direito de viver com dignidade e não serem submetidos à crueldade.
Prender uma ave num espaço fechado também é um ato de maus-tratos. As aves são uma das maiores referências do mundo natural. Retirá-las desse meio não pode ser, de forma alguma, justificável. Todos os seres vivos devem ter preservado o seu direito à liberdade. Os seres alados também devem ter o direito de VOAR, de relacionar-se com os pares de sua escolha e, de preferência, de viver no seu habitat natural e explorá-lo livremente.
Tal habitat certamente não pode e não deve ser o de um cárcere, representado por uma gaiola, com os seus típicos poleiros. Afinal, aves não pulam, elas voam.
– Leia outros artigos da coluna NA LINHA DE FRENTE
Observação: as opiniões, informações e dados divulgados
no artigo são de responsabilidade exclusiva de seu(s) autor(es)