Por Andréia Nasser Figueiredo¹, Daniel Campesan² e Larissa Ferreira³
¹Bióloga, mestra em Ecologia e Recursos Naturais e doutora em Ciências, ambos na área de Educação Ambiental. É cofundadora e educadora ambiental na Fubá Educação Ambiental e atua no grupo Escola da Floresta – Sítio São João e no Instituto de Conservação de Animais Silvestres (Icas)
²Gestor e analista ambiental pela Universidade Federal de São Carlos. Educador da Fubá Educação Ambiental
³Gestora e analista ambiental graduada pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar).Educadora da Fubá Educação Ambiental e colaboradora do Núcleo de Apoio à População Ribeirinha da Amazônia – NAPRA
educacaoambiental@faunanews.com.br
Apesar de estarmos no final de maio, é importante ressaltar que é neste mês que acontece uma das maiores campanhas de segurança no trânsito, o Maio Amarelo. A primeira edição ocorreu em 2014 e o período entre 2011 e 2020 foi definido pela Organização das Nações Unidas como a Década de Ações para a Segurança no Trânsito.
Mais recentemente, em uma nova Assembleia Geral, a ONU definiu o período de 2021 a 2030 como a Segunda Década de Ação para a Segurança no Trânsito. A meta agora é prevenir pelo menos 50% das mortes e ferimentos no trânsito. Claro que o foco maior é o ser humano, mas essa meta abre uma porta importante para trabalhar a problemática das colisões com a fauna.
É do nosso interesse reforçar que a segurança e o planejamento viário, no contexto brasileiro, também estão relacionados com a fauna. Afinal, sabemos que animais na pista podem ocasionar colisões diretas com os veículos e outros acidentes, podendo causar danos físicos, materiais, psicológicos e até mesmo óbitos humanos. Também sabemos que a fragmentação de habitat ocasionado pela construção desenfreada de estradas impacta diretamente o deslocamento e a sobrevivência da fauna nativa. No Brasil, segundo o Centro Brasileiro de Estudos de Ecologia de Estradas (CBEE), estima-se que por ano 475 milhões de animais silvestres morrem em colisões com veículos em estradas e rodovias. Os efeitos dessa problemática extrapolam a questão da segurança da pessoa que dirige.
Quando pensamos na fauna, as colisões veiculares causam perdas consideráveis nas populações, principalmente de espécies vulneráveis à extinção, como o tamanduá-bandeira (Myrmecophaga tridactyla). O projeto Bandeiras e Rodovias, do Instituto de Conservação de Animais Silvestres (Icas), em sua primeira fase (2017 a 2020), registrou 761 tamanduás-bandeira mortos nas rodovias do Mato Grosso do Sul, sendo esse número subestimado, pois a persistência da carcaça na rodovia é de 22% a 38%. Os dados mostraram que as colisões veiculares reduzem o crescimento populacional da espécie pela metade, sendo essa a principal ameaça a esse animal no Estado. Outra conclusão importante levantada é que a maioria dos acidentes com fauna (80%-90%) ocorre no período crepuscular ou noturno.
Segundo o trabalho recente de conclusão de curso de Dasoler (2021), a colisão veicular com fauna está praticamente ausente nas campanhas educativas dos departamentos estaduais e nacional de trânsito. Nas campanhas avaliadas pela autora, mesmo as campanhas com as temática “colisões”, os animais apareceram em apenas duas, ambas com animais domésticos. As razões apontadas pela autora para essa realidade foram duas. Primeira: em nenhuma das resoluções disponíveis do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), a questão da colisão com a fauna nativa (ou de temas ligadas ao meio ambiente) estava definida como necessária para estar presente nas campanhas. Segunda: isso pode representar a ausência de conhecimento ou de interesse de alguns departamentos de trânsito sobre incluir nas suas campanhas as temáticas com foco diferente dos tradicionais que envolvem só o elemento humano.
Os resultados das duas pesquisas, tanto a do Projeto Bandeiras e Rodovias quanto o trabalho de Oliveira, demonstram uma lacuna importante para a área da educação ambiental aplicada à conservação. Temos de um lado dados contextualizados e de outro a potencialidade de trabalhar esses dados em campanhas já organizadas pelos órgãos competentes. Cabe então a nós, educadoras e educadores ambientais, articular meios para que essa problemática possa ser mais bem conhecida e incorporada na busca da segurança viária. Atividades e ações estruturadas a partir dos princípios e objetivos da Educação Ambiental são uma oportunidade de aproximar a discussão da colisão com animais silvestres da rotina das pessoas. Ocupar espaço nas campanhas de trânsito municipais, estaduais e nacional pode ser estratégico para a conservação de animais ameaçados de extinção, como o tamanduá-bandeira.
Desde 2019, em uma parceria pioneira, a equipe educativa do Icas, com apoio da startup Fubá Educação Ambiental, desenvolve ações durante a campanha do Maio Amarelo na cidade de Aquidauana, no Mato Grosso do Sul. A parceria foi tão bem aceita pelos organizadores da campanha no município que acabou sendo renovada nos dois anos consecutivos e ampliada para outra campanha educativa importante, a semana nacional do trânsito. Aos poucos vamos aproximando a problemática envolvendo a fauna em busca de rodovias seguras para todos.
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Referências
– INSTITUTO CHICO MENDES DE CONSERVAÇÃO DA BIODIVERSIDADE. Disponível em: <https://www.icmbio.gov.br/portal/ultimas-noticias/4-destaques/4944-a-cada-segundo-15-animais-silvestres-morrem-atropelados-no-brasil >. Acesso em: 26 maio 2021.
– JORNAL DA USP. Disponível em: <https://jornal.usp.br/ciencias/ciencias-ambientais/solucoes-de-engenharia-poderiam-reduzir-mortes-de-animais-silvestres-em-rodovias/>. Acesso em: 26 maio 2021.
– DASOLER, B.T. Campanhas educativas de trânsito como estratégia de conscientização ambiental. 2021. 42 f. Trabalho de conclusão de curso (Licenciatura em Ciências Biológicas) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2021.
– INSTITUTO DE CONSERVAÇÃO DE ANIMAIS SILVESTRES. Projeto Bandeiras e Rodovias. Disponível em: <https://www.tamanduabandeira.org/sobre.html> Acesso em: 26 maio 2021.
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