Por Marcelo Calazans
Técnico em agropecuária, administrador de empresas e fotógrafo. Foi professor da disciplina Fotografia de Natureza pelo Senac (MS)
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Olá para você que acompanha minha coluna aqui no Fauna News! Meus agradecimentos mais sinceros pela companhia.
Prosseguindo com o assunto “armadilhas fotográficas” iniciado no artigo anterior, hoje trago mais informações sobre a importância desses equipamentos para a Ciência e a conservação de espécies.
Como eu disse no artigo inicial, esse equipamento é acionado por movimentos e conta com visão infravermelha. Essa armadilha não captura nem machuca macacos, onças, tamanduás e outros animais, mas registra, em fotos e vídeos, imagens que ajudam a estudar esses seres em seus habitat. E esses estudos foram muito beneficiados com o uso dessa tecnologia, pois os realizados antes, especialmente inventários mastofaunísticos, costumavam ser feito com base na identificação de pegadas, na coleta de fezes e em restos de alimentos desses animais. Mas isso nem sempre garantia a identificação individual e segura do espécime que deixou os vestígios, deixando algumas lacunas de informação.
Com o uso desse aparato, estudos que envolvem espécies de hábitos crepusculares e noturnos, geralmente de difícil observação na natureza, foram otimizados, já que a obtenção de um registro fotográfico de uma determinada espécie é equivalente a uma observação direta ou pode ser considerada também como uma captura, o que substitui métodos em que a coleta de resultados é difícil, demorada e estressante para os animais. Outra característica importante é o fato de que grandes áreas podem ser monitoradas e supervisionadas por poucos profissionais, que não precisam ficar de plantão constantemente.
Porém, como nem tudo são flores, existem algumas desvantagens no uso dessa metodologia, como o alto custo de equipamentos, cartões de memória, pilhas e baterias com grande autonomia de uso; o risco de roubo ou destruição do equipamento deixado em campo por frequentadores da área (caçadores, geralmente); a dificuldade de se reparar um equipamento em campo, caso apresente algum problema de mal funcionamento; e a impossibilidade de conseguir informações como massa corporal do animal registrado, estado reprodutivo ou amostras de material genético, método comum quando se captura fisicamente o animal. Também é possível que surjam algumas dúvidas na identificação de indivíduos que não apresentem marcas naturais ou padrões de pelagem diferenciada e ainda o problema de se conseguir o registro fotográfico ou filmagem de somente um dos lados do animal, pois um mesmo indivíduo pode apresentar marcas naturais ou padrões de pelagem diferentes entre seus lados direito e esquerdo. Esse último detalhe pode ser resolvido utilizando-se dois equipamentos na trilha a ser monitorada, um de cada lado para se obter registros dos dois lados do animal ao mesmo tempo, porém esbarramos novamente no primeiro “senão” dessa tecnologia: o alto custo de equipamentos.
Outro fator que vai influenciar, e muito, nos resultados esperados com o uso desse aparato todo é a falta de entendimento sobre o funcionamento do equipamento. Configurações avançadas que permitem o controle da quantidade de fotos ou tempo de gravação de vídeo, intervalo entre disparos, maior ou menor sensibilidade de sensores, captura com visão noturna sem uso de flash e gravação de data e hora dos registros são fundamentais para que o material coletado seja corretamente interpretado pelos pesquisadores. É fator primordial que o usuário se familiarize com os recursos e as potencialidades do set de equipamentos, que faça testes antes de ir a campo e saiba instalá-los para “dominar” a tecnologia e não se tornar escravo da falta de informações na hora de um imprevisto ou quando for necessário alterar alguma configuração.
Para complementar as informações anteriores (de configurações prévias das armadilhas), temos a questão de como e onde montá-las para garantir resultados satisfatórios. Fiz um resumo dos protocolos de instalação:
Escolha do local de montagem
A instalação das armadilhas fotográficas pode ser feita em um raio de até 100 metros do ponto exato onde se tem evidências da passagem dos animais a serem registrados. Essas trilhas são bem claras para quem sabe o que procurar. Para a instalação, deve ser escolhida uma árvore ou arbusto, ou então fincada uma estaca no chão. A árvore ou estaca não podem ser muito finas para evitar que oscilem com ventos fortes, atrapalhando o foco do equipamento, e devem ser o mais retas possível, para facilitar o posicionamento da armadilha.
Uma fita de marcação deve ser amarrada no ponto de instalação da camera trap para facilitar a localização. O ideal é que o ponto onde a armadilha for instalada seja georreferenciado. O campo de visão de 15 metros à frente da armadilha deve ser o mais livre possível para permitir registros claros, sem obstrução. O terreno em frente deve ser plano para facilitar o ajuste de angulação. As armadilhas fotográficas devem estar a pelo menos 100 metros de florestas densas ou estradas e devem ser instaladas voltadas para o campo de observação. Rastros, trilhas e outros indícios deixados pelos animais (árvores arranhadas, tocas, fuçados) e fontes de alimentos (frutos) devem ser escolha prioritária na hora de se definir o ponto de instalação. Nesse caso, as armadilhas devem ser posicionadas em um ângulo que aumente a chance de fotografar os animais, visando o resultado máximo na captação de registros. O local de amostragem dentro do raio de 100 metros ao redor do ponto exato selecionado previamente pode ser ajustado de um ano para outro, bem como o posicionamento das armadilhas no local de amostragem. No entanto, é desejável que se mantenha o ponto exato de instalação das armadilhas em anos diferentes, sempre que possível.
Fixação das armadilhas
As armadilhas devem ser instaladas na direção norte-sul (voltadas para o sentido sul ou norte) para evitar a exposição direta aos raios do sol (vindos do leste ou oeste), que podem gerar distorções nas capturas ou até mesmo gerar disparos falsos da câmera. As armadilhas devem estar voltadas contra o vento predominante sempre que possível para diminuir impactos de eventuais incêndios sobre o equipamento. Elas devem ser presas na vegetação ou estacas com o auxílio de correias, paralelas ao solo, a uma altura de 30 centímetros, de modo a permitir o registro de aves e mamíferos tanto de pequeno porte (como inhambus e tatus) quanto de maior porte (emas, tamanduás-bandeira). Ajustes de angulação podem ser feitos com o auxílio de gravetos posicionados atrás da armadilha para calçá-la ou inclinando-se a estaca de fixação. Se a instalação foi feita em árvore, também deve-se evitar o desbaste da casca para não “anelar” o tronco, o que acaba causando sua morte.
Uma área de dois metros ao redor da armadilha instalada deve ser roçada até deixar o solo nu e minimizar o efeito de eventuais incêndios. Galhos e cipós até cinco metros na direção onde a armadilha estiver apontada devem ser retirados ou aparados para evitar disparos “falsos” da camera trap causados pela movimentação de folhas e ramos finos. Qualquer outro material que possa atrapalhar o registro dos animais (troncos, pedras, etc.) também deve ser removido. Uma vez fixada, a armadilha fotográfica deve ser ligada e configurada. Um teste de acionamento deve ser feito com alguém passando na frente do sensor de movimento em distâncias diferentes.
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No próximo mês, trarei mais informações sobre o protocolo de instalação de armadilhas fotográficas e exemplos de uso desses equipamentos na ciência-cidadã e por instituições da área.
Até lá!
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