Por Marcelo Calazans
Técnico em agropecuária, administrador de empresas e fotógrafo. Foi professor da disciplina Fotografia de Natureza pelo Senac (MS)
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Olá, tudo bem?
Em uma nova série de artigos, vou trazer informações sobre armadilhas fotográficas (cameras trap). Irei falar sobre os tipos, a sua utilização e muito mais.
Quem fotografa animais silvestres sabe que é preciso ter muita paciência para conseguir uma boa foto. Muitas vezes, dependendo do hábito do animal, é necessário esperar dias, ou até semanas, para conseguir registrá-los por apenas alguns minutos. E por conta dessa dificuldade em fotografar determinados animais em seu ambiente natural, surgiram alguns aparatos tecnológicos para o registro sem a necessidade de um fotógrafo presente. São as chamadas armadilhas fotográficas ou, no termo em inglês, as cameras trap. Mas o que são esses dispositivos?
Uma camera trap é um equipamento ativado à distância, geralmente por sensores de movimento ou calor, utilizado para fotografar animais na natureza com a menor interferência humana possível. Seu objetivo principal é produzir imagens daqueles animais de espécies de difícil visualização pelos pesquisadores, como as noturnas e raras ou aquelas em que a aproximação não seja tão segura em determinados momentos. É possível também utilizá-la para registro de comportamentos específicos das espécies. Dessa forma, a “captura” ocorre por meio de registro fotográfico – daí o nome -, o que caracteriza esse equipamento como não invasivo, ou seja, não causa incômodos nem promove qualquer tipo de lesão no animal monitorado.
Geralmente, as armadilhas fotográficas têm o mesmo formato (retangular), sendo que o equipamento fica acondicionado em uma caixa-estanque, à prova de elementos da natureza como chuva, poeira e vento, normalmente camuflada, sendo as mais comuns sem esse padrão de cores. Possui sensores infravermelhos capazes de detectar movimento e/ou calor, o que ativa o equipamento quando os animais passam na sua frente.
Mas engana-se quem acha que essa é uma tecnologia recente, da era “moderna” da fotografia. O uso desses equipamentos ocorre há mais de 100 anos! Os primeiros conjuntos de equipamentos foram desenvolvidos pelo fotógrafo George Shiras, nos anos de 1890. Ele utilizava fios escondidos na vegetação e lâmpadas de flash para capturar as imagens de animais em seus filmes: a câmera era ativada quando o animal esbarrava nos fios. Engenhoso! Essas fotos foram as primeiras do gênero a serem publicadas na revista National Geographic.
O primeiro uso puramente científico desses equipamentos foi feito na década de 1920, por Frank Chapman. Ele pesquisava as grandes espécies animais existentes na ilha de Barro Colorado, no Panamá. Porém, esse equipamento tinha suas limitações de uso, como baterias com pouca carga, grande volume para ser transportado e dificuldade na montagem. O uso desse aparato só se popularizou na década de 1990, com câmeras equipadas com sensores infravermelhos. Muito comuns principalmente entre biólogos (pela necessidade de estudar os comportamentos de diversas espécies), tornaram-se mais conhecidas com os trabalhos de Ullas Karanth e seus registros de tigres na Índia.
Hoje, com o advento das câmeras digitais, essa prática de estudo e catalogação da vida selvagem com o uso desses equipamentos se tornou mais simples e acessível, tanto para profissionais como para amadores da fotografia de natureza, sendo estudiosos ou não das espécies animais. O uso desses equipamentos não se restringe ao meio acadêmico. Qualquer pessoa, proprietária de uma área rural (sítio, chácara ou fazenda), pode instalar esse tipo de equipamento para conhecer sua “vizinhança”. E a um custo acessível, o que é melhor ainda. Mais uma ferramenta da ciência cidadã!
O set de equipamentos de uma camera trap pode ser montado de várias maneiras, de acordo com a disponibilidade desses itens e as necessidades de utilização. É possível inclusive criar uma com uma câmera DSLR comum, um sensor de movimento infravermelho de alarme de casas e um disparador. Na foto abaixo, temos um exemplo desse equipamento, que foi montado com uma DSLR Canon EOS 30D, posicionada em um suporte de madeira. Mas esse improviso tem um custo, já que expõe muito o equipamento às condições climáticas e aos danos que animais mais curiosos possam ocasionar. Porém, nem tudo está perdido! Em outro material, irei mostrar que já existem cases específicos para acomodar esse tipo de conjunto, o que evita maiores danos ao equipamento.
As imagens captadas por esse tipo de equipamento ganharam tanto destaque que, em 2010, a BBC Wildlife Magazine em parceria com a World Land Trust criaram um concurso fotográfico com fotos tiradas com armadilhas fotográficas. Profissionais de vários países participaram, sendo que o vencedor foi o malaio Mark Rayan Darmaraj, que captou a curiosidade com o equipamento na expressão de dois tigres no seu país de origem. Já em 2020, a imagem de uma tigresa abraçando calorosamente um pinheiro em uma floresta remota da Sibéria ganhou um dos maiores prêmios de fotografia do mundo! De acordo com o site The Guardian, o fotógrafo russo Sergey Gorshkov usou cameras trap para captar essa imagem e levou 11 meses para conseguir capturar esse momento. Sua paciência o levou a ser nomeado “fotógrafo do ano” pela Duquesa de Cambridge, em uma cerimônia no Museu de História Natural de Londres. “Naquele momento, minhas mãos começaram a tremer”, escreveu Sergey. Sua foto foi captada em novembro de 2019, no extremo oriente da Rússia, no Land of the Leopard National Park. A tigresa abraça um antigo pinheiro que pode ter sido usado por décadas por outros tigres, deixando marcas de cheiro, esfregando as glândulas das bochechas contra a casca para deixar mensagens para outros tigres que um dia poderão passar por ali.
A cena captada foi escolhida entre outras mais de 49 mil inscritas. Ron Kidman Cox, presidente do painel de jurados, declarou que a obra era “um vislumbre único de um momento íntimo nas profundezas de uma floresta mágica”. Claro que, dentre os fotógrafos de natureza tradicionais, esse assunto gerou uma série de debates e opiniões calorosas a respeito.
E no próximo artigo, continuarei a falar sobre armadilhas fotográficas, trazendo informações técnicas a respeito e todas as novidades desse segmento da fotografia para você. Nos vemos em breve.
Até lá!
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