Aracnídeos no cinema: sempre vilões?

Antes do advento da era dos efeitos especiais com CGI (Computer-generated Imagery), isto é, das imagens geradas por computador, as produções cinematográficas utilizavam o chamado efeito prático. Como o nome já sugere, esse efeito não usava nada de computação gráfica nas cenas, sendo tudo feito com maquiagem, modelos, noções de perspectivas, maquetes ou… animais de verdade. Muitos dos astros de Hollywood, por vezes, não são os atores ou atrizes da nossa espécie humana, mas sim pequenos seres rotineiramente desprezados pelo senso comum: os artrópodes. Para várias cenas em diversos filmes, as estrelas foram artrópodes que, inclusive, eram treinados pelo entomólogo Steven Kutcher, conhecido como Bug Man em Hollywood.

Os artrópodes estão presentes em muitos clássicos do cinema mundial. Infelizmente, na maioria dos casos, desempenham um papel não muito amigável, o que acaba perpetuando a visão errônea de que são animais essencialmente perigosos para o ser humano.

Dentre os artrópodes, os aracnídeos são frequentemente retratados em filmes de terror ou ficção científica. É sabido que muitas pessoas realmente possuem medo de aracnídeos e é justamente esse medo que é explorado em filmes e séries retratando esses animais  como mortais e perigosos. Convenhamos também que títulos como “A invasão das aranhas gigantes”, “A maldição da aranha” ou “Malditas aranhas” não são muito amigáveis.

De fato, existem aranhas que possuem um veneno que pode ser perigoso para as pessoas, porém são pouquíssimas as espécies com essa característica dentre as mais de 50 mil já descritas. As aranhas do gênero Latrodectus, conhecidas como viúvas-negras, são um exemplo das que podem apresentar risco para humanos, mas é importante ressaltar que acidentes com esses animais, apesar de perigosos, são relativamente raros de acontecerem no Brasil.

É impossível falar de aranhas no cinema sem citar o clássico “Aracnofobia”, de 1990, já reprisado algumas dezenas de vezes na tv aberta. Comentários do tipo “tenho medo de aranhas até hoje por causa desse filme” infelizmente são comuns de ouvirmos por aí.

O filme retrata a invasão de aranhas “mortais” em uma pequena cidade nos Estados Unidos. No entanto, a espécie de aranha utilizada na maioria das cenas não é peçonhenta para o ser humano. Trata-se da aranha-caçadora da espécie Delena cancerides, nativa da Austrália, introduzida na Nova Zelândia e que apresenta comportamentos sociais (algo não tão comum em se tratando de aranhas).

Apesar de inflar o medo desses seres, o início do filme retrata também o trabalho de pesquisadores taxonomistas explorando áreas desconhecidas do planeta, interessados em descrever a espécie, o que considero algo positivo. A descrição da biodiversidade do planeta é extremamente importante, visto que só podemos proteger o que conhecemos, e é uma tarefa que vem sendo ameaçada constantemente, principalmente com os cortes de investimento em pesquisa cada vez mais frequentes.

O medo de aracnídeos é ainda reforçado quando esses animais são retratados como gigantes nas telas. E isso acontece há bastante tempo, como nos filmes “Tarântula” e “O Escorpião Negro” (ambos da década de 1950). Como exemplos mais recentes, temos filmes muito populares como o “Senhor dos Anéis: o Retorno do Rei”, quando Frodo e Sam encontram com a temível Laracna nas fronteiras de Mordor; e na saga Harry Potter, a acromântula macho Aragogue, habitante da Floresta Proibida e amigo de Rúbeo Hagrid, cujos olhos provavelmente foram inspirados nas aranhas-lobo da família Lycosidae.

Aragogue e seus filhos não são os únicos aracnídeos a aparecerem no universo bruxo de Harry Potter. Um outro aracnídeo que pode não ser tão conhecido aparece em uma importante cena da saga: o amblipígio. No quarto filme, o professor Alastor “olho tonto” Moody utiliza um exemplar desse aracnídeo para ensinar as três maldições imperdoáveis. Apesar do que é dito na cena, os amblipígios não são nada mortais, pois sequer apresentam glândula de veneno. Você pode conhecer mais sobre esse animal fantástico em outro artigo já publicado aqui na coluna.

Os escorpiões
Depois das aranhas, os escorpiões são os aracnídeos que mais aparecem em filmes e séries de TV. Alguns com seu nome no próprio título como no filme “O Escorpião Rei”, outras vezes aparecendo gigantes ou como quimeras como no filme “O Retorno da Múmia”, em que o personagem de Dwayne “The Rock” Johnson aparece como metade humano e metade escorpião.

Homem-Aranha
Apesar de uma conotação negativa geralmente ser atribuída a esses animais, aposto que você já se perguntou se era possível adquirir superpoderes aracnídeos com a picada de uma aranha. O amigo da vizinhança, muito popular nas histórias em quadrinhos, já teve várias adaptações para o cinema. A trilogia com Tobey Maguire no papel do herói contou com a consultoria do Dr. Norman Platnick, ex-curador da coleção de aranhas do American Museum of Natural History (Nova Iorque, EUA). Infelizmente agora já falecido, o pesquisador era uma autoridade mundial em se tratando de aranhas, viajou o mundo descrevendo espécies novas e era conhecido como “o verdadeiro homem-aranha”.

Não teria como falar de todas as aparições de aracnídeos nas telonas no espaço da coluna e nem é o objetivo do texto. Aracnídeos, assim como outros animais que geralmente não são muito bem vistos, também são importantes. Você pode não gostar, mas talvez porque nunca tenha dado a chance de aprender mais sobre as incríveis habilidades que esses artrópodes desenvolveram ao longo da sua evolução. Afinal, vai dizer que ter um “sentido aranha” para saber quando o real perigo se aproxima ou quase voar por aí soltando teias não seria incrível?

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