Bióloga, mestre e doutora em Ecologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). É pesquisadora pós-doutoranda do Programa USP-Sustentabilidade vinculado ao Laboratório de Ecologia, Manejo e Conservação de Fauna Silvestre da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq/USP). Também é colaboradora do Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias (Nerf) da UFRGS.
A pergunta que intriga muitos pesquisadores e gestores é saber como as populações de animais silvestres são afetadas pelas rodovias. Há trabalhos importantes na área sobre esse efeito e o que sabemos é que depende muito de quais grupos e espécies estamos abordando e para quais rodovias.
As rodovias podem afetar as populações animais tanto negativa quanto positivamente ou até mesmo ter um efeito neutro. Ainda, há um estudo que sintetiza qual a distância que o efeito das rodovias pode alcançar para afetar a abundância das populações animais. As conclusões dessa síntese, baseadas em 49 trabalhos com 234 espécies de mamíferos e aves, são que a densidade populacional desses grupos diminui à medida que as populações se aproximam das rodovias e que o efeito se estende ao redor da infraestrutura em até um quilômetro para populações de aves e em até cinco quilômetros para mamíferos.
Tentando explorar como as rodovias no Brasil afetam as populações de animais silvestres, pesquisadores do Laboratório de Ecologia e Conservaçãoda Universidade de São Paulo (USP) e do Instituto de Conservação de Animais Silvestres (Icas) liderados por Vinicius Alberici, avaliaram as relações entre a proximidade de rodovias no Mato Grosso do Sul e a abundância de 12 espécies de mamíferos silvestres. (acesse o artigo).
Em duas áreas diferentes no Mato Grosso do Sul, os pesquisadores selecionaram 120 locais para amostrar as populações de mamíferos utilizando armadilhas fotográficas. Esses locais ficavam a distâncias diferentes das rodovias MS-040 e BR-267, mas dentro de uma área de 10 quilômetros para cada lado das rodovias, onde pretendia-se ter amostras dentro (até cinco quilômetros) e fora (de cinco a 10 quilômetros) da zona de efeito da rodovia. Em cada um dos 120 locais foram instaladas três armadilhas fotográficas em lugares estratégicos para amostragem de mamíferos.
Os pesquisadores selecionaram as espécies-alvo de análise baseados no banco de dados de animais atropelados dessas rodovias e distinguiram dois grupos de espécies: seis espécies com altas taxas de mortalidade – Euphractus sexcinctus (tatu-peba), Cerdocyon thous (cachorro-do-mato), Myrmecophaga tridactyla (tamanduá-bandeira), Tapirus terrestris (anta), Tamandua tetradactyla (tamanduá-mirim) e Hydrochoerus hydrochaeris (capivara) – e outras seis com baixas taxas – Chrysocyon brachyurus (lobo-guará), Leopardus pardalis (jaguatirica), Priodontes maximus (tatu-canastra), Tayassu pecari (queixada), Dicotyles tajacu (cateto) e Puma concolor (onça-parda).
Além da distância para rodovia, os pesquisadores também exploraram variáveis de qualidade do hábitat e de conectividade da paisagem para relacionar com a abundância das espécies, assim como variáveis que pudessem interferir na probabilidade de detecção dessas animais. Para qualidade do hábitat foi utilizada a porcentagem de vegetação nativa, tanto florestal quanto campestre, e para conectividade foi utilizada a distância entre manchas de vegetação nativa, como indicativo de agregação ou isolamento desses fragmentos. A partir do uso de modelos de ocupação, os pesquisadores puderam estimar a abundância relativa de cada uma das 12 espécies em cada um dos 120 locais e fazer inferências com as variáveis de interesse.
A proximidade de pelo menos uma das rodovias teve relação com a abundância de três espécies: tamanduá-bandeira, capivara e cachorro-do-mato. Todas essas espécies são do grupo das espécies com elevadas taxas de mortalidade nessas rodovias. Para tamanduá-bandeira e capivara, a abundância aumentou à medida que os locais se distanciavam da rodovia MS-040, via que foi considerada no estudo como de baixo tráfego. Para cachorro-do-mato foi o contrário: os locais mais próximos à rodovia BR-267, considerada de alto tráfego, apresentaram uma abundância relativa maior.
As variáveis de qualidade de hábitat e conectividade afetaram a abundância relativa de quase todas as espécies em pelo menos uma das rodovias analisadas. As espécies para as quais não foi encontrada relação com nenhuma variável explorada foram a anta e o tamanduá-mirim. Ambas pertencem ao grupo com altas taxas de mortalidade nessas rodovias.
Os resultados desse estudo demonstram também como é difícil encontrar um padrão único para diferentes espécies e que nem todas (pelo menos para esse conjunto de dados e essas rodovias) seguem o mesmo efeito. As relações foram variadas, dependendo da espécie e da rodovia analisada, sendo que muito disso se dá pelas diferentes preferências de hábitat, histórias de vida e comportamentos de cada espécie. Por isso, torna-se importante entendermos a dinâmica das populações no entorno de rodovias em diferentes regiões e contextos, tanto no espaço quanto no tempo, para compreendermos melhor os efeitos das estradas para cada espécie.
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Bióloga, mestre e doutora em Ecologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). É pesquisadora pós-doutoranda do Programa USP-Sustentabilidade vinculado ao Laboratório de Ecologia, Manejo e Conservação de Fauna Silvestre da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq/USP). Também é colaboradora do Núcleo de Ecologia de Rodovias […]
