A tragédia das onças

No início deste ano, duas situações distintas envolvendo duas espécies nativas de felídeos silvestres viralizaram nas redes sociais. A primeira, uma onça-parda (Puma concolor) morta por uma família no Piauí. A outra, envolveu um filhote de onça-pintada (Panthera onca) mantido em cativeiro por uma família em Santo Antônio do Içá (AM).

As duas ocorrências guardam uma carga de muita violência contra os animais. Uma onça-parda covardemente acuada, torturada e morta, e um filhote, retirado da mãe (provavelmente abatida) e mantido por uma família.

As violências contra os grandes felinos silvestres no Brasil não são novidade e sempre foram enormes e com gatilhos diversos. Fazendeiros contratam “onceiros” para matar onças que possam estar predando seu gado, a simples presença do felino já é suficiente para condenar o individuo à morte, tráfico internacional de partes dos animais e caça esportiva. Centenas de onças foram mortas e são mortas por essas razões.

Com o desmatamento e fragmentação florestal, as onças se arriscam se aproximando de áreas com presença humana, seja para sua própria locomoção na paisagem, pela dispersão dos juvenis para delimitar suas áreas de vida e em virtude da procura por alimento.

Consequências do desaparecimento das onças

A morte das onças e o desaparecimento dessas espécies em algumas localidades causam diversos desequilíbrios que se refletem na saúde humana. É o caso das infecções humanas por febre maculosa que ocorrem no interior de São Paulo, em que a Mata Atlântica foi dizimada para dar lugar a plantações de café, pasto e cana.

Sobre a onça-pintada filhote, li comentários de muitas pessoas lamentando que o pequeno animal foi retirada da família humana. Segundo a visão dessas pessoas, ali era o ambiente que a onça precisava. Sobre a saúde do felino, explano aqui algumas razões sobre porque a interação do filhote com a família é prejudicial para a espécie:

• onças-pintadas são suscetíveis a cinomose, doença viral prevalente na população de cães no interior do Amazonas, e que pode causar a morte do felino (não há vacina para onças);
• os filhotes de onça aprendem tudo com a mãe, como caçar, evitar os humanos e todo comportamento intrínseco da espécie. A convivência com pessoas, na ausência da mãe, é uma perda contínua para o filhote;
• a onça com a família não iria nunca ter alimento suficiente e dieta adequada para mantê-la saudável. O problema iria em breve parecer fisicamente, como ocorre com todos os animais em cativeiro ilegal: deformação de membros e saúde muito comprometida;
• por último, no primeiro comportamento da onça que parecesse agressivo, a vida dela poderia ser abreviada violentamente.

Com as mudanças climáticas e os últimos eventos de incêndios em florestas no país, a tendencia é aumentar a aproximação dos felídeos à população humana. É essencial educarmos as pessoas quanto aos riscos desse contato e direcionarmos a comoção popular para o que realmente importa: indignação com o desmatamento ilegal, caça predatória e com pessoas que explorem animais silvestres para engajamento e likes.