Biólogo, mestre em Ecologia e agente de fiscalização ambiental do Ibama.
nalinhadefrente@faunanews.com.br
Ao ser picado pela naja, o estudante de medicina veterinária teve que escolher: revelava suas atividades criminosas ou morria? Preferiu viver e com isso não apenas a naja, mas vários outros animais, principalmente serpentes e outros répteis, estão sendo apreendidos e entregues. Os silvestres nativos são encaminhados para soltura e os demais ficarão sob cuidados de técnicos, em zoológicos, por exemplo.
Um segmento argumenta que a criação registrada diminuiria a pressão sobre a fauna traficada à medida que ofertariam os animais demandados pela população. Essa bela história comportamental não resiste à realidade. O estudante possuía uma jiboia-arco-íris de origem legal em meio a mais de 20 serpentes oriundas do tráfico. Ou seja, a possibilidade de se obter animais em criadouros registrados não foi efetiva para evitar o envolvimento com o tráfico de animais silvestres.
O desejo por ter animais não se restringe a ter um animal. Muitas vezes, o diferente é o importante. A manipulação por cruzamentos tem se tornado cada vez mais comum para gerar jiboias, pítons e outras cobras com padronagens diferentes da natural. Embora muitas vezes passe desapercebido, isso demonstra que a figurinha diferente, ou seja, o animal diferente é mais importante que o animal em si. Não basta, por exemplo, ter uma naja, mas é preciso ter uma naja hipomelânica (com pouca melanina). É preciso ter uma naja diferente.
Essa ânsia de coleção poderia ser suprida pela criação comercial autorizada? Entendo que não. Um estadunidense criador autorizado de jiboias não resistiu e traficou do Brasil para os Estados Unidos da América a única jiboia leucística do mundo – vejam o caso Princess Diamond.
Qual seria o caminho correto? Buscar fazer as mais variadas padronagens por meio de cruzamentos para atender aos desejos de cada diferente pessoa por cada diferente desenho de pele de serpente? Mas sempre não haverá espécies e padrões que alguém não tem? E o que fariam as pessoas para completar seu álbum quando surgisse ou soubesse de uma espécie diferente?
Eu argumento que o correto e eficiente não é tentar suprir cada desejo por um animal exótico. A postura adequada é conscientizar a população a respeitar os animais e apreciá-los no ambiente natural. Se ama, não compre.
Ter a figurinha diferente, a serpente diferente, tem movimentado uma absurda rede de tráfico de animais silvestres. Cada figurinha desse álbum é um vazio na floresta.
O texto reflete posição pessoal e não, necessariamente, institucional.
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