Biólogo, mestre em Ecologia e agente de fiscalização ambiental federal
nalinhadefrente@faunanews.com.br
A ararinha azul (Cyanopsitta spixii) acabou de retornar aos céus do sertão nordestino. Não apenas ela, mas também o bicudo (Sporophila maximiliani) possui um projeto de repovoamento. Ambos os casos são elencados e festejados como o sucesso e a comprovação da importância da conservação ex situ. Mas existem importantes ponderações a serem feitas.
Conservação ex situ, que significa conservação fora do ambiente natural, é diferente de simplesmente se acumular ou colecionar animais em cativeiro. Muitas pessoas chamam o simples cativeiro de animais silvestres de conservação ex situ. Algumas o fazem por ignorância, mas vários alimentam essa confusão por malícia mesmo.
Ao chamar o simples cativeiro e as coleções particulares de animais silvestres de conservação ex situ, os envolvidos estão dando um verniz de preocupação ambiental para uma atividade que, muitas vezes, possui mero interesse pessoal. Mas assim como o verniz é uma camada fina que pouco esconde a real madeira abaixo, a conservação nesse caso também é apenas uma frágil desculpa para outros interesses. Esse verniz justifica e torna mais palatável, para a população, o cativeiro que, de outra forma, seria questionado. Confundem propositadamente criadouros contemplacionistas com criadouros conservacionistas. O primeiro é um nome que inventei porque entendo que o objetivo principal seja ter e ficar olhando os animais. O segundo é uma categoria prevista na Resolução Conama nº 489/2018 e, antes dela, em normativas do Ibama.
A conservação ex situ envolve a prisão de animais, mas com o objetivo futuro de restitui-los ou, aos seus descendentes, a liberdade. Assim, projetos sérios de conservação ex situ possuem como meta a conservação in situ (com o animal livre em seu ambiente natural). A primeira é um instrumento, um caminho, não um fim em si. Nesse sentido, não basta manter os animais presos ou mesmo reproduzi-los. É necessário que ocorra uma avaliação genética, principalmente para a escolha de parceiros reprodutivos (deve-se evitar, por exemplo, cruzamentos consanguíneos). No caso de filhotes a serem reintroduzidos, quando crescerem, é também necessário o mínimo contato com seres humanos.
O livro Conservation Biology, de Richard B. Primack, traz em detalhes o projeto de conservação ex situ e reintrodução do condor-da-califórnia. Sobraram pouquíssimos animais na natureza e se tomou a difícil decisão de capturá-los para se reproduzirem em cativeiro (conservação ex situ) e, depois, soltar os descendentes (conservação in situ). Vale a pena ler a história e se inteirar do profissionalismo que envolveu as análises, as decisões e os procedimentos com os animais.
Não possuir projetos científicos sérios e nem estar vinculado a programas oficiais de conservação, torna o cativeiro de animais em apenas uma coleção de animais. É o mesmo que guardar dinheiro em casa e dizer que está investindo. Para muitos pode parecer igual, mas são coisas completamente diferentes.
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