Por Vitor Calandrini
Primeiro-tenente da PM Ambiental de Paulo, onde atua como chefe do Setor de Monitoramento do Comando de Policiamento Ambiental. É mestrando no Programa de Pós-Graduação em Sustentabilidade na Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP
nalinhadefrente@faunanews.com.br
Sabemos que o tráfico de animais é a segunda maior causa de perda de biodiversidade, atrás somente da perda de habitat. Embora seja possível identificar que o tráfico em si está associado às ações relacionadas à cadeia de comércio de fauna, ou seja, à retirada de animais da natureza, seu transporte, sua manutenção em cativeiro e sua venda, um questionamento pouco comentado é: para qual objetivo se destina essa prática criminosa?
E é esse o tema que trago este mês. Quais são os possíveis destinos do animal traficado? E, analisando alguns trabalhos publicados pelo mundo, foi possível identificar diversas modalidades do uso dessa fauna, como veremos a seguir.
Dentre as possibilidades de uso da fauna traficada identificadas na literatura, seis são as que se destacam: o tráfico da caça para consumo, o para comércio de partes de animais, o para fins medicinais e afrodisíacos, a caça esportiva, a captura para manutenção em cativeiro a título de estimação, e a coleta para fins religiosos. Podemos exemplificar a forma que algumas dessas modalidades são encontradas.
A caça de subsistência, ou para consumo, embora seja muitas das vezes sub-notificada pelo seu caráter individual e sem fins comerciais, ainda é identificada em áreas rurais Brasil afora. Mesmo não havendo previsão legal, muitos julgamentos reconhecem o Estado de Necessidade ou o Crime de Bagatela e a condenação não é confirmada, isso quando a pessoa consegue comprovar a real necessidade do abate do animal para fins de alimentação.
Já quando falamos da caça com fins comerciais, ou a caça em si, podemos ter ao menos três diferentes formas. A de comércio de partes do animal para fins de decorativos, como visualizado em alguns países africanos em que há a busca pelo marfim dos elefantes ou pelos “cornos” dos rinocerontes, que possuem grande valor agregado no mercado asiático onde são esculpidos e utilizados como enfeites, cabos de faca, etc,. Para fins medicinais, ou ao menos a pela crença que podem ter efeitos curativos, como atualmente os ossos de patas de leão que são cobiçados também no mercado asiático para serem ralados e transformados em poções que prometem melhoria de rendimento sexual (sem comprovação cientifica alguma). E a caça esportiva, que ocorre em diversas regiões do mundo, visando ser de fato um turismo em que o objetivo é o prazer no abate do animal em vida livre.
Outro, que embora também seja sub-notificado e não gere muita convulsão social, é o tráfico de animais para fins religiosos. O animal muitas vezes é utilizado em cultos que envolvem o seu abate e, mesmo tendo previsão constitucional da liberdade de culto, a forma de utilização do espécime deve observar as circunstâncias que evitem o abuso e maus tratos dependendo do caso concreto.
No Brasil, assim como em outros países sul-americanos como a Colômbia, o tráfico tem a característica de ser movimentado para manutenção em cativeiro a título de estimação, ou seja, fomentado pela cultura do silvestre-pet, em que animais são extraídos da natureza para serem mantidos como animais domésticos, como cães e gatos. Embora seja por motivos diferentes, esse tipo e tráfico tem o mesmo resultado para a fauna, ou seja, sua retirada da natureza.
Na verdade, diversos podem ser os motivos que levam pessoas a retirarem animais da natureza. Seja por questões pessoais, sociais, econômicas, religiosas ou mais de uma delas, até mesmo por gostar tanto de silvestres que querem ter um em casa, a realidade é que sempre que fomentamos qualquer uma dessas formas, participamos da degradação gradual de nossa fauna em vida livre.
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