Por Larissa Oliveira Gonçalves
Bióloga e mestre em Ecologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). É doutoranda em Ecologia na mesma universidade, trabalhando junto ao Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias (NERF-UFRGS).
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Em tempos de festividades juninas, nada mais justo do que citar um dos dizeres que animam as quadrilhas neste mês de junho. Mas o que essa frase tem a ver o que eu vou escrever? Não são só nas cantigas juninas que temos as serpentes como animais perigosos. Você sabia que muitas pessoas acabam atropelando esses animais intencionalmente, simplesmente por considera-los indesejáveis?
Segundo um estudo publicado em 2007 no volume 12 da revista Human Dimensions of Wildlife, uma pequena parte dos motoristas (2,7%) atropela répteis intencionalmente numa rodovia do Canadá. Sim, mesmo sendo uma porcentagem pequena, existem pessoas que passam por cima desses animais de propósito. Tal comportamento reflete uma cultura de que esses animais devem morrer e que não são bem vistos pelos humanos. Algumas serpentes são, sim, peçonhentas, mas muitas não são e acabam levando os mesmos rótulos. Não digo que as peçonhentas deveriam morrer. Claro que não! Pensando em termos éticos, todos os animais possuem um valor intrínseco e não haveria motivos para atropelarmos nem cobras nem onças.
Pensando em termos conservacionistas, os atropelamentos por si só já podem comprometer a viabilidade das populações, agora imagina se alguns grupos de animais forem mais propensos em serem atropelados simplesmente pela aversão humana? Isso é o que mostra um experimento realizado no Rio Grande do Sul, publicado em 2015 no volume 28 da revista Biotemas: animais menos carismáticos, como aranhas e serpentes, acabam levando a pior e são mais atropelados.
Se você quiser saber um pouco mais sobre essa discussão, assista o vídeo abaixo, no qual um pesquisador amador mostra de maneira muito divertida os atropelamentos intencionais. Numa amostra de mil veículos e usando animais de borracha no acostamento, ele viu que a grande maioria dos motoristas não sai da estrada para atropelar os animais (ótimo!), mas 6% atropelam os animais intencionalmente!!!
Se o problema é em relação ao carisma dos animais, parece mais fácil de resolver do que todos os outros atropelamentos que acontecem de forma não intencional (e que precisaríamos pensar em formas de mudar ou o fluxo de veículos ou o comportamento dos animais, por exemplo). Precisamos, então, trabalhar com a percepção humana e conscientizar as pessoas de que serpentes não merecem ser atropeladas, simplesmente por serem serpentes (até porque nenhum animal merece ser atropelado)!
Como fazer isso? Começo aqui um primeiro passo, levando esse assunto à discussão e mostrando que precisamos refletir mais sobre ele.