Por Fernanda Zimmermann Teixeira
Bióloga, mestre e doutora em Ecologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). É pós-doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Ecologia e integrante do Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias (NERF)
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Na segunda semana de novembro, ocorreram as Jornadas Argentinas de Mastozoologia, em Puerto Iguazú, na Argentina. Esse congresso, que acontece desde 1985, reuniu mais de 500 estudantes e pesquisadores com interesse no estudo e na conservação de mamíferos. E num dos dias do evento, nós do Grupo de Trabalho de Transportes para a América Latina e o Caribe, ligado à União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês), organizamos um simpósio de Ecologia de Rodovias. Chamado “Infraestruturas viárias e conservação de mamíferos, experiências da América Latina”, esse simpósio reuniu dez apresentações de trabalhos de seis países diferentes: Argentina, Brasil, Colômbia, Costa Rica, Paraguai e Uruguai.
Foram apresentadas experiências de abordagens para decidir onde implementar medidas mitigadoras com base em dados diretos e indiretos, como a aplicação de modelos preditivos de atropelamento e conectividade em estudos ambientais no Brasil; o desenvolvimento de um plano de mitigação para primatas no Rio Grande do Sul considerando dados de mortalidade, presença e conectividade das áreas de floresta e ocorrência; e a elaboração de um plano de mitigação para algumas rodovias na Costa Rica com base em dados de armadilhas fotográficas, hotspots de mortalidade e conectividade estrutural.
Também foram expostos estudos de levantamento de dados de mortalidade por atropelamento de diferentes espécies de mamíferos, como felinos tratados em um centro de resgate na Costa Rica e um estudo pioneiro de mamíferos atropelados no Chaco paraguaio. Ainda com foco em levantamento de dados de atropelamento, foram apresentadas três diferentes iniciativas envolvendo aplicativos de ciência cidadã para coleta de dados de mortalidade em nível nacional: a consolidação da Rede Argentina de Monitoramento de Fauna Atropelada, a aplicação de dados da Rede Colombiana de Monitoramento da Fauna Atropelada (Recosfa) para criação de mapas de vulnerabilidade para a Colômbia e o mapeamento de atropelamentos no Uruguai combinando dados de aplicativos e dados coletados diretamente.
Ainda, foram apresentados resultados de dois estudos de monitoramento de uso de passagens de fauna e estruturas de drenagem em Misiones e Jujuy, na Argentina, com registros de espécies ameaçadas bastante importantes.
Após o congresso, os integrantes do Grupo de Trabalho que organizaram o simpósio ofereceram um curso em parceria com o Ministério do Meio Ambiente da Argentina. Chamado “Infraestrutura viária de mãos com a biodiversidade: desde o diagnóstico dos impactos à implementação e avaliação de medidas”, ele reuniu mais de 70 pessoas, incluindo técnicos ambientais e de transporte de diferentes províncias argentinas, além de profissionais de outros países da América Latina. Nesse curso, pudemos apresentar um pouco da teoria relacionada à Ecologia de Rodovias com foco na discussão de estudos de casos de diferentes países. Ao final, visitamos algumas rodovias na província de Misiones e pudemos conhecer de perto a história de algumas medidas de mitigação implantadas na região, como o primeiro ecoduto (viaduto) vegetado da América Latina, que foi construído em 2008 na Ruta 101.
Esses eventos, ao reunir pesquisadores e gestores de diferentes países, permitem a troca de experiências, o compartilhamento de soluções e a aprendizagem conjunta. O Brasil, talvez por suas dimensões continentais, diversidade interna e por ter um idioma oficial diferente dos outros países da América Latina, muitas vezes interage pouco com as nações vizinhas. Espero que esse cenário mude e que possamos superar essas barreiras para cada vez mais nos integrar, trocar conhecimento e aprender com nossos vizinhos.
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